Cotidiano

Denúncia aponta abandono de crianças e adolescentes venezuelanos em abrigo

O Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH) protocolou, na sexta-feira, 24, duas representações no Ministério Público do Estado de Roraima (MPRR) e no Ministério Público Federal em Roraima (MPF-RR) contra o poder público nas esferas federal, estadual e municipal por abandono de crianças e de adolescentes venezuelanos no abrigo localizado no ginásio esportivo do Tancredo Neves, na zona oeste da Capital.

A denúncia solicita que os órgãos de controle encaminhem à Justiça ação civil por improbidade administrativa contra o presidente da República, Michel Temer (PMDB), a ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois (PSDB), a governadora Suely Campos (PP) e a prefeita de Boa Vista, Teresa Surita (PMDB), “por agirem com xenofobia e desrespeito às crianças e adolescentes da Venezuela que vivem em Boa Vista”.

O relato informa que o coordenador nacional do MNDH, Liorcino Mendes, esteve no abrigo após a denúncia de irregularidades e identificou que cerca de 100 crianças e adolescentes estariam tendo seus direitos, previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e na Convenção dos Direitos das Crianças, completamente violados.

“De acordo com a fala das mães e pais das crianças, eles foram tirados à força da Rodoviária de Boa Vista, com forte aparato policial do Estado e obrigados a dormirem no ginásio que fica afastado do Centro da cidade”, diz trecho da denúncia. “No local foram cedidas barracas da Defesa Civil onde abrigam famílias variadas e sob um calor interno de 50 graus. Outras famílias são obrigadas a dormir nas arquibancadas do ginásio ou sobre a areia de um campo do lado externo”.

Segundo o relatório, os adolescentes presentes ao abrigo teriam dito que “é servida apenas uma refeição ao dia, os banheiros não têm chuveiro, não há escola, nem curso para aprenderem português e se integrarem à nação brasileira”.

O MNDH também constatou que muitas crianças estão sem cuidados médicos, sem presença diária de pediatra, nem alimentação, vivendo em local insalubre e suas mães não podem deixá-las em uma creche para que possam trabalhar. “Muitas estão convivendo com adultos que fumam, bebem e muitas vezes tomam banho no mesmo banheiro, em baldes de água fria, sem nenhuma segurança”, acrescentou.

ESFERA MUNICIPAL – No que diz respeito ao município, o Movimento Nacional dos Direitos Humanos tratou sobre a ação da Guarda Civil Municipal de abordar os imigrantes que vendem produtos nos semáforos, sob a alegação de que a legislação vigente proíbe esse tipo de prática por pessoas não autorizadas em ruas e avenidas da cidade.

“A Prefeitura de Boa Vista, numa ação xenofóbica, está perseguindo os pais destas crianças, colocando fiscais para recolher todos os produtos (meias, água, salgados, desodorante) que eles tentam vender nas ruas para sobreviver. Ao mesmo tempo, tem apreendido vassouras e rodos para vidros de carro, para impedir os pais das crianças de limparem os para-brisas para ganhar algum trocado”, diz o texto.

ESFERA FEDERAL – Para Liorcino Mendes, há uma ausência do poder público federal em solucionar a questão. “A ministra dos Direitos Humanos se nega a visitar o local e os três entes federados não querem resolver o drama de famílias que passavam fome na Venezuela e pediram refúgio no Brasil. Não há aluguel social, ajuda para alimentação, Bolsa Família, escola, segurança, alimentação, lazer, absolutamente nada para as crianças e adolescentes da Venezuela”. O MNDH ressaltou que irá denunciar o problema na ONU e demais órgãos internacionais.

MNDH – O Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) é uma entidade organizada da sociedade civil, sem fins lucrativos, presente em todo o território brasileiro em forma de rede com mais de 400 entidades filiadas. Fundado em 1982, constitui-se hoje na principal articulação nacional de luta e promoção dos direitos humanos.

GOVERNO E PREFEITURA – A Folha entrou em contato com o governo estadual. A Procuradoria-Geral do Estado informou, por meio de nota, “que o Governo do Estado ainda não foi notificado sobre tais representações do Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH)” e que somente poderá se manifestar após notificação oficial. A Prefeitura de Boa Vista também informou que ainda não foi notificada sobre a situação.

MINISTÉRIO PÚBLICO – O Ministério Público do Estado de Roraima informou que a Procuradoria-Geral de Justiça do órgão recebeu a representação e, no momento, “analisa quais medidas legais poderão ser aplicadas ao caso”.

A Folha também entrou em contato com o Ministério Público Federal em Roraima (MPF-RR) para saber sobre a reivindicação e também, como está o andamento da ação civil pública ajuizada em parceria com a Defensoria Pública da União (DPU) com relação à retirada dos imigrantes dos arredores da Rodoviária Internacional de Boa Vista.

A Procuradoria informou que a representação do MNDH será avaliada e anexada a procedimentos similares do MPF sobre a situação dos venezuelanos. Sobre a ação em parceria com a DPU, informou que o MPF no momento aguarda avaliação da Justiça.

A Folha também tentou contato com o Ministério dos Direitos Humanos, porém, não obteve retorno até o fechamento da matéria. (P.C.)

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