Política

Emenda à Constituição equipara carreira de delegado a de magistrados

Delegado pode ganhar até 90% do salário dos ministros do STF, ser tratado de forma igualitária a magistrados e o delegado-geral terá foro privilegiado

A Proposta de Emenda à Constituição Estadual (PEC) Nº 056/2017, de relatoria do deputado estadual Jorge Everton (PMDB), tem causado polêmica desde sua aprovação. É que ela inclui a carreira dos delegados como uma carreira jurídica equiparável a dos magistrados e conselheiros do Tribunal de Contas.

Pela Emenda à Constituição, também deve ser aplicado aos delegados da Polícia Civil do Estado o limite salarial de 90,25% do salário dos ministros do Supremo Federal, que hoje é aplicável aos ocupantes de cargos de natureza jurídica, essenciais e exclusivas do Estado, como membros do Ministério Público do Estado, membros da Procuradoria-Geral do Estado, Procuradoria-Geral da Assembleia Legislativa, membros da Defensoria Pública do Estado e membros do Tribunal de Contas do Estado (TCE).

A PEC determina ainda que o delegado-geral da Polícia Civil do Estado também passe a ter foro privilegiado, tendo a prerrogativa de ser processado e julgado por crime de responsabilidade apenas pela Assembleia Legislativa, da mesma forma como acontece com os procuradores-gerais de justiça, de contas, do Estado e da Assembleia Legislativa, além do defensor público-geral e do presidente do TCE.

Outra mudança está relacionada ao tratamento dado aos delegados. A partir da PEC, os bacharéis em Direito que ocupam cargo de delegado de polícia devem receber o mesmo tratamento protocolar que recebem os magistrados, os membros da Defensoria Pública e do Ministério Público e os advogados. A Emenda Constitucional entrou em vigor em 30 de agosto de 2017, aprovada por unanimidade pelos deputados estaduais. Alguns deles, questionados pela Folha, disseram com inusitada sinceridade que não se lembravam da inclusão dos delegados de polícia na aprovação da PEC.

“Lembro da PEC que era relacionada à questão da regulamentação da carreira de procurador do Estado e procurador da Assembleia, mas não me lembro de estar incluso delegado de polícia. Mas se está lá, eu aprovei, apesar de não recordar”, disse um dos parlamentares procurados pela Folha que pediu para não ser identificado.

GOVERNO – Procurada pela Folha, a Procuradoria-Geral do Estado esclareceu, em nota, que a PEC dos delegados é inconstitucional, pois possui vício de iniciativa. “É de competência do Poder Executivo tratar de questão remuneratória do servidor público. Tendo em vista essa inconstitucionalidade, a questão está sob análise jurídica para adoção das medidas legais cabíveis”, frisou.

Sindpol diz que PEC causa divisão dentro da Polícia Civil

O vice-presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Estado (Sindpol), Leandro de Almeida, disse que os delegados já tentaram fazer essa incorporação na Constituição em outras ocasiões, mas não tinham conseguido até agora.

“Eles se aproveitaram da divisão na Assembleia e do fato de ter um deputado que é delegado de polícia. Agora é questionável que um delegado enquanto parlamentar tenha competência para deflagrar uma PEC como essa que legisla em causa própria. A pergunta que a gente faz é: uma proposta dessas que equipara delegado a juízes e promotores, qual é a finalidade? O que a sociedade vai ganhar em equiparar o tratamento protocolar de um delegado a um desembargador, a um juiz? No que isso vai melhorar o trabalho desempenhado pela Polícia Civil?”.

Segundo o sindicalista, apesar da emenda não conceder reajuste aos delegados, ela abre portas para que esse reajuste venha a acontecer. “Com a equiparação dentro da Constituição, os delegados vão exigir que o Executivo remunere de maneira igual. Mas matérias dessa natureza deviam ser iniciadas pelo Governo do Estado, e não no poder Legislativo, que não pode criar obrigações ou possibilitar onerações aos cofres do Executivo”, destacou.
Conforme Almeida, em Roraima tem sido comum se fazer legislação para cargos determinados e, no caso da Polícia Civil, existem várias leis específicas visando dividir a categoria. Ele disse ainda que essa forma dos delegados se posicionarem como classe à parte cria divisões dentro da Polícia Civil.

Ele explicou que foi instituído o pagamento em forma de subsídio apenas para o cargo de delegado em 2009, enquanto os outros nove cargos recebiam remuneração mais subsídio. Isso foi corrigido apenas em 2014, mas, nesse mesmo ano, foram criadas novas regras especificas para o cargo de delegado.

“Os delegados acreditam que devem ser tratados como uma classe à parte: Os delegados e os policiais civis, como se eles não fizessem parte da Polícia Civil. E a gente não enxerga isso como benéfico para a sociedade”, disse o sindicalista, ressaltando que essa divisão não é benéfica para a Polícia Civil, pois o cidadão acaba sendo prejudicado.

“Essa PEC vai distanciar o presidente do inquérito policial mais ainda do cidadão, pois, com esse subsídio elevadíssimo, que pode chegar ao patamar de um desembargador de Estado e a mudança no tratamento, eles perdem a humildade enquanto um policial civil que fica nas ruas, investigando, nos cartórios, nos institutos de criminalísticas e ganham salários péssimos que não equivalem nem a 25% do subsídio de um delegado. Ou seja, ganhamos ¼ do salário de um delegado, que nos dias atuais chega a mais de R$ 21 mil. Imagina se essa regra vier a ser sacramentada”, complementou.