Cotidiano

Financeiras se recusam a abrir novas linhas de créditos a servidores

Empresas estão negativando os nomes dos funcionários públicos; Sindicato promete entrar com ação contra o Estado

As parcelas de empréstimos consignados realizados por servidores públicos estaduais são descontadas mensalmente nos contracheques. O problema é que os valores deixaram de ser repassados pela Secretaria Estadual de Fazenda (Sefaz) às instituições financeiras que ofertam a modalidade de crédito.

Sem receber o dinheiro que deveria ser debitado com os juros dos empréstimos consignados, os bancos estão negativando o nome dos funcionários públicos junto ao Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e à Centralização de Serviços dos Bancos (Serasa), causando transtornos aos servidores.

A ausência no repasse das parcelas referentes a empréstimos consignados descontados em folha de pagamento dos servidores públicos estaduais motivou, inclusive, a abertura de ação civil pública por parte do Ministério Público de Roraima (MPRR), que identificou, no início de 2016, ato de improbidade cometido pela Sefaz.

O MP apurou, à época, que o Governo do Estado havia firmado contrato com as instituições financeiras obrigando-se a descontar os valores das parcelas dos empréstimos contraídos pelos clientes na modalidade consignada e repassá-los aos bancos, porém, o não cumprimento do repasse era recorrente.

Com a inadimplência, dezenas de servidores públicos estaduais estão impedidos de abrirem crediários no comércio ou qualquer tipo de novos financiamento e empréstimos. “Surgiu uma oportunidade de eu ter uma casa própria, fui consultar se eu tinha margem para o empréstimo e descobri que apesar de ter uma boa margem, eu não apenas não posso fazer, como também estou com o nome sujo”, disse a servidora pública efetiva do quadro geral, Ana Paula Menezes.

Ela afirmou que pretende entrar com ação na Justiça contra o Governo do Estado. “O rapaz da empresa falou pra mim que o governo deve mais de R$ 3 milhões e que todos os novos empréstimos foram cancelados. Isso é apropriação indébita e vou buscar meus direitos na Justiça”, frisou.

A reportagem conversou com um representante de uma financeira que oferta empréstimos consignados. Ele afirmou que, desde a semana passada, o único banco que operava na oferta de crédito aos servidores estaduais suspendeu o convênio por conta da falta de repasse do governo.

“Foi a décima vez em menos de um ano. Não tem previsão de retorno, porque a dívida só com esse banco é superior a R$ 3 milhões. Quando o governo resolver atualizar parte do débito com os bancos eles voltam a oferecer o empréstimo, mas os clientes reclamam porque estão com nome sujo. Estamos perdendo muitos clientes”, disse o funcionário, que preferiu não ser identificado. (L.G.C)

Sindicato acionará Justiça contra bancos e governo

Apesar de nenhum servidor público do Estado ter formalizado denúncia sobre a falta repasse dos empréstimos consignados ao Sindicato dos Trabalhadores Civis Efetivos do Poder Executivo do Estado de Roraima (Sintraima), o presidente da entidade, Francisco Figueira, informou que um levantamento sobre a situação está sendo feito.

Conforme ele, a partir do momento que as denúncias forem protocoladas, o Sindicato acionará o setor jurídico para que providências sejam tomadas no sentido de retirar o nome dos servidores da lista de negativados. “No caso como foi consignado o governo fica responsável pelo repasse, iremos entrar na Justiça contra os bancos para que não negativem os servidores, cabendo inclusive pedido de indenização por danos morais”, afirmou.

Quanto ao governo, Figueira reiterou que a situação caracteriza-se como apropriação indébita dos recursos. “O Estado está se apropriando de um dinheiro que não é dele. Temos que tomar medidas contra o Estado para que não tenha mais essa atitude de descontar e não repassar”, pontuou. (L.G.C)

Ex-secretário da Fazenda afirma que governo está penalizando servidores

A falta de repasse dos descontos de empréstimos consignados dos servidores estaduais também foi discutida em audiência pública realizada na semana passada pela Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR), que debateu a crise financeira pela qual passa o Estado de Roraima.

O ex-secretário estadual da Fazenda, Kardec Jackson, que preside o Sindicato dos Fiscais de Tributo do Estado de Roraima (Sinfiter), esteve na audiência e falou, em entrevista à Folha, que o problema ocorre por conta da falta de planejamento financeiro do governo.

Ele exemplificou que o executivo apresenta boa arrecadação do Fundo de Participação dos Estados (FPE). Em termos comparativos, conforme Jackson, o Estado teria recebido R$ 112 milhões do Fundo somente neste mês de janeiro, R$ 1 milhão a mais que em relação ao mesmo período do ano passado. “Há um incremento por volta de 4%, mas há uma série de dívidas que devem ser sanadas”, disse.

Segundo o ex-secretário, o governo está tendo problemas em honrar com os compromissos porque não possui reserva. “É preciso planejamento financeiro para evitar problemas, mas como isso não ocorre, as dívidas se acumulam. Com isso, cria-se uma crise econômica e quem está sendo penalizado são os servidores públicos, que além de ficarem sem salários estão tendo os nomes negativados por conta da falta de repasse do governo”, destacou. (L.G.C)

“Quem está devendo é o governo e não o servidor”, disse secretário em audiência

Ainda durante a audiência pública realizada na semana passa para tratar sobre a crise financeira do Estado, o atual secretário da Secretaria Estadual da Fazenda, Kléber Coutinho, que assumiu o posto no início do mês, reconheceu que quem está devendo as instituições financeiras é o Governo do Estado e não o servidor.

“Então, os bancos não podem negativar nenhum servidor. Se assim vocês [servidores] quiserem, vocês podem entrar na Justiça que vocês não são devedores dos bancos. Quem tem que repassar é o Estado, não o servidor”, frisou.

A reportagem entrou em contato com o Governo do Estado para saber o motivo de o governo não estar repassando as parcelas dos empréstimos consignados dos servidores aos bancos e o que estaria sendo feito com esse dinheiro. Mas, até o fechamento desta matéria, às 18h40 de ontem, não houve retorno. (L.G.C)