Política

Governo desiste de reintegração de posse

Representantes da Famer e do Governo entraram em acordo para desocupação por livre vontade de invasores

O Governo do Estado, por meio da Companhia de Desenvolvimento de Roraima (Codesaima), requereu a suspensão da execução da reintegração de posse dos ocupantes da área do Matadouro Frigorífico e Industrial de Roraima por 30 dias. Mais de 12 mil pessoas estão no local há quase três meses, onde já construíram barracos e montaram estruturas de madeira.

No documento encaminhado ao Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, a Codesaima informou que, em reunião realizada no Palácio Senador Hélio Campos, foi acordado que a reintegração seria feita de forma amigável, a fim de se evitar a deflagração de possíveis conflitos. “Razão pela qual a requerente aproveita o ensejo para pleitear a suspensão da execução da ordem de reintegração pelo prazo de 30 dias”, argumenta.

O pedido foi acatado pela juíza Noêmia Cardoso Leite de Sousa, da 6ª Vara Cível. “Como este juízo deferiu a medida liminar determinando a reintegração de posse da área em litígio, contudo, até o presente momento, a referida decisão não foi cumprida, defiro o pedido de suspensão do processo pelo prazo de 30 dias”, diz a decisão judicial.

DO MAFIRR – A área ocupada fica ao lado do Matadouro Frigorífico e Industrial de Roraima (Mafirr), na região da Água Boa, zona rural de Boa Vista. As pessoas que invadiram o local são as mesmas que ocuparam uma área particular próxima ao Haras Cunhã Pucá, no município do Cantá, em abril deste ano. Os donos da propriedade ingressaram com pedido de reintegração de posse, que foi deferido pela Justiça estadual.

Reunião no Palácio do Governo decidiu por acordo com invasores

Segundo o Governo do Estado, a suspensão atende deliberação da Comissão criada pela Portaria 287/2017, da Casa Civil do Governo de Roraima, e formada por membros de diversas instituições, incluindo a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Roraima (ALE).

A decisão ocorreu em 16 de junho, em uma reunião no Palácio Senador Hélio Campos, entre representantes da comissão formada para tratar da questão dos invasores e o representante da Federação das Associações de Moradores de Roraima (Famer), Faradilson Mesquita. O teor da reunião veio a público somente agora.

Participaram da reunião o secretário adjunto da Casa Civil Shiská Pereira; o procurador do Estado Andre Elysio Campos Barbosa; o presidente do Instituto de Terras e Colonização (Iteraima), Alysson Macedo; o presidente da Codesaima, Marcio Granjeiro; o deputado Soldado Sampaio, da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa; o representante da Famer, Faradilson Mesquita; e o presidente do Conselho das Cidades, Sandro de Souza Cruz.

O presidente da Famer disse na reunião que sua entidade tem 12 mil famílias cadastradas com pessoas carentes de moradia própria. “Não temos interesse em causar prejuízo para ninguém, mas solicitamos a cessão de uma área institucional ou desapropriada em Boa Vista, área limítrofe ou município vizinho para criação do loteamento”, afirmou.

Na reunião ficou acertado que o Governo do Estado iria buscar resolver o impasse disponibilizando ou desapropriando uma área para alocar as pessoas da ocupação e que os ocupantes vão sair de livre e espontânea vontade do terreno da Codesaima.

Comissão da Assembleia sugeriu acordo

A Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Legislação Participativa, da Assembleia Legislativa de Roraima, encaminhou há aproximadamente 70 dias ao Governo do Estado uma recomendação formal com sugestões, entre outros pontos, indicando que seja cedida ou desapropriada uma área institucional para realocar as pessoas assentadas no local. No último caso, sugeriu a indenização da área para a criação de loteamento de interesse social urbano, visando garantir a moradia aos invasores.

“Fui designado como relator da ocupação do Haras Cunhã Pucá na época. A comissão se reuniu e aprovou meu relatório, que recomenda ao Governo que tome as providências cabíveis para encontrar uma área para essa famílias que são carentes e precisam de apoio governamental. Recomendamos que tudo fosse feito de forma negociada e evitando conflitos”, disse o deputado Soldado Sampaio.

Oficiais de Justiça denunciam descaso para cumprimento de reintegração de posse

O vice-presidente do Sindicato dos Oficiais de Justiça do Estado de Roraima, Ailton Araújo, afirmou à Folha que os oficiais do Judiciário até agora não entendem os motivos pelos quais a Codesaima reclamava do não cumprimento do mandado de reintegração de posse da área ocupada, “uma vez que era a única responsável pela manutenção das pessoas no local”.

“Primeiramente, a Codesaima se negou em recolher o valor correto referente à diligência do oficial de Justiça, querendo que o oficial de Justiça trabalhasse de graça. Em segundo lugar, se negou a fornecer os meios necessários para o cumprimento do mandado”, disse Araújo.

Segundo o representante da categoria, o oficial de Justiça Ronaldo Marques foi obrigado a cancelar a diligência, porque a empresa pública não forneceu o aparato necessário, como máquinas, pessoal e a infraestrutura necessária, como alimentação e água aos policiais militares que lá permaneceriam por todo o dia. “Desta forma, afirmo que se a reintegração não ocorreu, é por culpa exclusiva da empresa”, assegurou.

No ofício encaminhado pelo oficial ao magistrado do caso, Marques confirmou que precisou desmarcar a reintegração, pois não obteve os meios necessários para o cumprimento da ordem (caminhões, carregadores, alimentação para os policiais). “Já havia sido marcada uma data para a reintegração e que foi desmarcada por “culpa” da parte autora, causando inclusive inconvenientes junto ao comando da PM que já estava mobilizando o efetivo de mais de 100 policiais para a reintegração”, explicou. “Ficaram postergando o cumprimento da ordem de reintegração de posse, sendo que todas as vezes que eu efetuava ligação telefônica não atendiam ou quando comparecia à sede da Codesaima para tratar da reintegração, novamente se postergava. Devolvi o mandado sem cumprimento em virtude do comportamento do representante da parte autora, que demonstrou desinteresse momentâneo ou até mesmo a desistência da reintegração”, concluiu.