Política

Justiça defere liminar para obrigar consulta a indígenas

Povos tradicionais deverão participar de discussões do Zoneamento Ecológico-Econômico

A Justiça Federal deferiu liminar requerida pelo Ministério Público Federal em Roraima (MPF/RR) para suspender os trabalhos de elaboração do Zoneamento Ecológico-Econômico estadual (ZEE). A decisão vale enquanto o Governo do Estado não adotar mecanismos eficazes de consulta às comunidades indígenas afetadas.

A discussão do ZEE, agora suspensa, ocorre no âmbito do governo para formalizar projeto de lei a ser submetido à Assembleia Legislativa. O Ministério Público Federal alega que o Estado não tem viabilizado a participação e a consulta prévia e qualificada dos povos indígenas, violando direitos humanos assegurados em tratados internacionais.

No pedido encaminhado à Justiça, o MPF/RR alertou também que a elaboração de um zoneamento sem a adequada participação dos povos tradicionais poderá impactar em sua subsistência. Segundo o órgão ministerial, mesmo sem alterar as áreas demarcadas, eventuais mudanças no uso de terras do estado poderão trazer desequilíbrios ao meio ambiente, afetando a sobrevivência dos índios.

Para que as discussões sejam retomadas, o Ministério Público Federal em Roraima indicou diretrizes para o processo, como o envio de atas das reuniões do grupo de discussão, a realização de reuniões com as associações indígenas e consultas públicas com os povos.

Na decisão, além determinar a paralisação de todas as atividades de elaboração do zoneamento, o Juízo da 4ª Vara Federal determinou multa diária de R$ 5 mil em caso de descumprimento. As discussões só poderão ser retomadas com o atendimento das diretrizes.

ZEE – O Zoneamento Ecológico-Econômico foi regulamentado pelo Decreto nº 4.297/2002 e faz parte da Política Nacional do Meio Ambiente. Esse instrumento tem como objetivo viabilizar o desenvolvimento sustentável a partir da compatibilização do desenvolvimento socioeconômico com a proteção ambiental.

Segundo o Ministério do Meio Ambiente, o ZEE compreende o diagnóstico dos meios físico, socioeconômico e jurídico-institucional. Seus resultados têm o condão de impactar diretamente na gestão da qualidade ambiental, dos recursos hídricos, do solo e a conservação da biodiversidade.

Consulta Pública já estava marcada, antes de decisão judicial, diz Governo

Responsável pela elaboração do Zoneamento Ecológico-Econômico, a Secretaria estadual de Planejamento e Desenvolvimento informou que vai realizar uma Consulta Pública com as Populações Indígenas de Roraima, com 16 entidades representativas, no dia 14 de setembro. O evento, que já vinha sendo formatado antes mesmo de decisão judicial, será realizado no auditório da Universidade Estadual de Roraima (Uerr).

Por meio da Secretaria Estadual do Índio (SEI), os representantes de organizações indígenas e comunidades já foram convidados a participarem da Consulta. A comissão elaborou uma Cartilha com o objetivo de ser instrumento de disseminação sobre o ZEE, para que haja compreensão e possibilite participação social no processo de elaboração e implementação do Zoneamento no estado.

No início deste ano, a Comissão da ZEE recebeu um ofício do Ministério Público Federal (MPF), com indicações que incluem o etnozoneamento, Consultas Públicas junto às Comunidades Indígenas, indicação que o Estado está respeitando os limites de áreas indígenas e indicativo de zonas de amortecimento das Terras Indígenas.

O secretário de Planejamento, Haroldo Amoras, explicou que o Estado tem cumprido todas as recomendações. “Estamos seguindo o que estabelece a Lei e, nesse sentido, agendamos a Consulta Pública. Já está acertado internamente que atenderemos a questão de se fazer o indicativo das faixas de amortecimento e também o que trata do respeito aos limites. Desse modo, o ZEE vai trazer todas essas especificações”, argumentou.

No entanto, Amoras citou a impossibilidade de o Estado fazer o etnozoneamento. “Existe uma impossibilidade legal na medida em que a Constituição define que tanto a política indígena, quanto os planos de intervenção em terras indígenas são de competência exclusiva da União. Existe também um Decreto Federal específico que regulamenta a matéria, atribuindo tal competência ao Ministério da Justiça, Funai [Fundação Nacional do Índio], Ministério do Desenvolvimento Agrário e Ministério da Agricultura”, destacou.

Ainda segundo Amoras, o Estado tem se colocado à disposição do Governo Federal, para contribuir com a melhor solução para Roraima. “Temos uma realidade representada pelo fato de que 46% do território de Roraima é representado por terras indígenas com uma população indígena que corresponde a quase 10% da população total do Estado. Então a sociedade indígena é fundamental nesse processo de transformação e no desenvolvimento sustentável”, complementou.

Além da Consulta Pública, a Comissão do ZEE realiza, desde o início de 2016, reuniões trimestrais da Comissão Institucional, que tem entre os membros representantes do MPF, Funai, Conselho Indígena de Roraima(CIR), Instituto Socioambiental (ISA), Sociedade de Defesa dos Índios Unidos de Roraima (Sodiurr), entre outras instituições.