Cotidiano

Ligação não ocorrerá enquanto linhão passar por área indígena

União teria apresentado cinco possíveis trajetos para o Linhão de Tucuruí e o escolhido seria o mais viável economicamente, mas atravessa área povoada por índios

As empresas responsáveis pela obra que deve ligar Roraima ao Sistema Interligado Nacional (SIN) terão que definir um novo traçado para que o Linhão de Tucuruí passe fora de uma área indígena em Rorainópolis. Com isso, o Estado terá novamente adiado o fim da dependência da energia elétrica proveniente do instável complexo Guri/Macágua, na Venezuela.
Roraima é o único estado brasileiro que não está conectado ao SIN. Após leilão realizado em 2011, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) assinou o contrato de concessão do lote A ao consórcio formado pela Alupar e pela Eletrobras Eletronorte, mas, no início deste mês, a Justiça Federal de Primeiro Grau, mandou anular o processo licitatório para a construção no trecho que vai da Vila Equador, em Rorainópolis, a Boa Vista.
O pivô do impasse é uma comunidade indígena isolada, chamada Pirititi, que, segundo a Funai (Fundação Nacional do Índio), foi recém descoberta em Rorainópolis. A decisão proíbe que a obra passe pela área delimitada como sendo da etnia e proíbe a tomada de qualquer decisão sem consulta prévia às lideranças indígenas.
A obra partiu da hidrelétrica de Tucuruí, no rio Tocantins, no Pará, passou por Macapá, e chegou a Manaus e seguiria agora para a implantação dos 721 km de linhas de transmissão até Boa Vista, com conclusão prevista para 2016 e investimento avaliado em R$ 1,2 bilhão, etapa esta que também inclui a construção de três subestações.
Devido a problemas no licenciamento ambiental, a linha, que foi leiloada em 2011, ainda não tinha licença prévia até o fim do ano passado, quando a obra foi suspensa, em caráter liminar, a pedido do Ministério Público Federal do Amazonas (MPF-AM). A Ação Civil Pública deu origem à decisão que acusa a Aneel de não ter realizado estudos técnicos, nem consultado o povo indígena sobre a obra.
ROTEIROS – Na ação consta que o Ministério das Minas e Energia (MME) informou que o projeto teria contemplado cinco alternativas para o traçado. A primeira delas atravessaria a Terra Indígena Waimiri Atroari por 121 quilômetros, além das zonas de amortecimento de Unidades de Conservação; a segunda opção inclui duas travessias por 2,5 quilômetros do Rio Negro mais 200 quilômetros de travessia por Unidades de Conservação (UCs) e trechos de vegetação nativa sem via de acesso; a terceira hipótese seria igual à segunda, mas sem passar pelas UCs, no entanto, atravessaria 250 quilômetros de floresta nativa sem qualquer apoio rodoviário; a quarta alternativa previa a travessia de projetos de assentamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), três terras indígenas no município do Cantá, e travessia por áreas de grandes e médios produtores rurais; por fim, a quinta alternativa atravessaria projetos de assentamento do Incra, travessia pelo Rio Branco nas proximidades de Mucajaí e travessia por áreas alagáveis entre Mucajaí e Boa Vista.
Para a Justiça Federal, a escolha pela primeira alternativa se deu por aspectos “puramente econômicos e financeiros”, considerando que uma das alternativas chegaria a custar 2,5 vezes mais caro.
Para o MPF-AM, as irregularidades não estão centradas no empreendimento em si, mas na maneira autoritária como o mesmo foi conduzido, sem ouvir previamente as populações afetadas, sem considerar alternativas que não atingissem povos tradicionais e ignorando a existência de um povo indígena isolado no meio do traçado definido.
Roraima segue dependente de energia venezuelana
Devido à demora no andamento das obras do Linhão de Tucuruí, frente à constante instabilidade da energia importada da Venezuela, o Ministério de Minas e Energia autorizou a Eletrobras Distribuição Roraima a instalar usinas termoelétricas para fornecer 129,1 megawatts (MW), que deveriam suprir a demanda do Estado até que ocorresse a interligação ao restante do País.
O prazo inicial era para instalação das usinas no início deste ano, mas, por ação do Ministério Público, o processo parou. No entanto, após um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), a Eletrobrás afirmou que as usinas termelétricas de Monte Cristo e Distrito Industrial, em Boa Vista e Novo Paraíso, no município de Caracaraí, serão instaladas até dezembro deste ano. A contratação tem um caráter preventivo, ou seja, a ideia é que as usinas entrem em ação quando falhar a energia de Guri, importada da Venezuela.
Não é à toa a preocupação acerca de um possível colapso energético no Estado. Desde 2001, o Brasil compra eletricidade hidrelétrica da Venezuela para abastecer, sobretudo, a capital Boa Vista. Na época, foi firmado entre os dois países um Tratado Internacional, no entanto, nos últimos anos esse acordo tem sido descumprido.
Dos 200 MW contratados, a Eletrobrás afirma que só tem recebido 95 MW do complexo de Guri/Macágua, enquanto o consumo tem sido de 150 MW. Isso leva o governo nacional a ativar térmicas movidas a óleo diesel, que geram energia até seis vezes mais cara que a de usinas hidrelétricas.
A Eletrobrás já possui a geração própria de 60 MW para atender ao déficit energético ocasionado pela redução da energia fornecida pelo país vizinho. Do total, 40 MW foram instaladas dentro da usina termoelétrica localizada no bairro Jardim Floresta e outros 20 MW na subestação do Distrito Industrial.
Com a contratação de mais 129,1 MW, somados aos 60 MW já contratados, os municípios dependentes da energia de Guri vão passar a dispor de energia suficiente caso haja um corte total no fornecimento por parte do país vizinho.