Cotidiano

MME não esclarece se tarifa de energia vai aumentar com privatização

Objetivo da audiência pública foi ouvir a população em relação à privatização da distribuidora de energia em Roraima

A fim de ouvir a sociedade e coletar contribuições para o processo de desestatização da Distribuidora Eletrobras, representada em Roraima pela Boa Vista Energia S/A, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) realizou na manhã de ontem, 16, uma audiência pública no auditório do Corpo de Bombeiros Militar de Roraima (CBMRR), na zona oeste da capital.

Na audiência, a população teve um tempo determinado pela organização para tirar dúvidas com representantes do Ministério de Minas e Energia (MME), BNDES, Boa Vista Energia S/A e do Consórcio Mais Energia B. Com pouco mais de 100 presentes, uma das principais questões levantadas foi o impacto da desestatização na qualidade do fornecimento de energia e no preço da tarifa.

Sobre o assunto, o representante do MME, Ricardo Brandão, informou que a regulação feita pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) é de universalização, de modo que não há distinção entre empresa estatal e privada. Neste caso, o tratamento tarifário da empresa privada é o mesmo dado pela estatal, que também é o mesmo fornecido para outras empresas, do ponto de vista tarifário.

A Aneel tem ainda uma regulação destinada aos índices de qualidade de fornecimento. Quando eles não são atingidos, há uma repercussão na tarifa. Os principais índices são o DEC, referente à duração de desligamento, e o FEC, relacionado à frequência do desligamento. “Existe um aferimento e, infelizmente, a realidade local é que esses índices, por ano, são piores do que a média do Brasil e de empresas privadas da Região Norte”, disse.

Em razão do diagnóstico, Brandão relatou que haverá uma exigência de investimentos mais altos para os cinco primeiros anos no contrato de concessão. Para tanto, a lógica será atrelar o investimento em uma taxa de retorno estabelecida pela própria Aneel. Com a primeira audiência encerrada, o próximo passo é publicar o edital com todas as regras e informações do leilão, que deve ocorrer até abril deste ano. A segunda das seis audiências que serão realizadas no país está prevista para ocorrer na terça-feira, 20, no Amazonas.

PRIVATIZAÇÃO – O processo de desestatização da Eletrobras faz parte do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), que tem o objetivo de reforçar a coordenação das políticas de investimentos em infraestrutura por meio de parcerias com o setor privado. Com a privatização, será permitido que um novo acionista especializado em distribuição de energia elétrica otimize os recursos das empresas e realize os investimentos necessários, a fim de que se tornem mais eficientes, atendendo às expectativas dos mais de 13 milhões de habitantes do Acre, Alagoas, Amazonas, Piauí, Rondônia e Roraima. Ao todo, os Estados totalizam uma área territorial de 2,46 milhões de km², correspondente a 29% do território nacional.

SEGURANÇA – O evento contou com a presença de um forte aparato de segurança que incluiu a Polícia Civil, Polícia Militar do Estado de Roraima (PMRR), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e seguranças terceirizados. (A.G.G)

Funcionários fazem manifestação contra a privatização

Paralelo à audiência pública, cerca de 200 representantes do Sindicato dos Urbanitários de Roraima (Stiurr) e trabalhadores da Eletrobras Distribuição Roraima realizaram uma manifestação contra a privatização da estatal em frente ao Corpo de Bombeiros Militar de Roraima (CBMRR). Entre as reivindicações, a categoria destacou a demissão de mais de sete mil trabalhadores da Eletrobras no país, aumento imediato da tarifa de energia de apagões e a instabilidade em relação ao fornecimento de energia.

Para Gisselio Cunha, eleito para assumir a presidência do sindicato a partir do mês que vem, a audiência não pode ser considerada pública. “Primeiro que o local escolhido foi uma área militar. Não podemos usar faixa, não podemos ter carro de som e sequer armar uma tenda. Além disso, nem todos estão aqui por conta do Carnaval”, disse. Outro trabalhador, que preferiu não ser identificado, foi impedido de entrar em razão da lotação do auditório. “Uma mentira! Temos representantes lá dentro que disseram que o local está vazio. E outra, qual a necessidade de tanto policial?”, frisou.

O representante do Ministério de Minas Energia (MME), Ricardo Brandão, explicou que a audiência seguiu regras típicas de qualquer outra audiência. “As portas estavam abertas a qualquer um que quisesse entrar. A segurança esteve presente para preservar o direito de que todos participassem”, declarou. (A.G.G)

Deputados pretendem mobilizar bancada federal para discutir privatização

“Se é um evento democrático para discutir uma problemática do Estado, eu achei vergonhoso. Dois dias após o Carnaval, numa sexta-feira e em uma área militar? Poderia ter ocorrido de uma forma mais ampla, para ser discutido e debatido com uma maioria”, avaliou o deputado federal Carlos Andrade (PHS). Presente durante toda a audiência, ele apontou que o Governo Federal está sendo um arbitrário unilateral por decidir no Palácio do Planalto, em Brasília, a situação energética de Roraima sem levar em consideração os habitantes.

O deputado federal Edio Lopes (PR-RR), que também participou da audiência, é contra a privatização em razão das peculiaridades do Estado e da região Amazônica, onde são necessários investimentos em nível socioeconômico para levar energia em comunidades indígenas, agrovilas e em comunidades ribeirinhas distantes. “Por serem comunidades pequenas, onde o consumo é irrisório e os investimentos são grandes por conta das distâncias, é lógico que uma empresa privada não terá interesse em investir em projetos desta natureza”, relatou.

Além disso, Lopes ressaltou que, com a privatização, os deputados não vão poder apresentar emendas individuais para interiorização da energia no Estado. “Isso tudo levará a um colapso da energia, sobretudo nas áreas mais distantes da capital. No meu entendimento, se hoje é ruim, com a privatização ficará muito pior”, completou.

Junto ao deputado Edio Lopes, Carlos Andrade pretende mobilizar a bancada para discutir a questão. “Pode privatizar sim, mas eu, Carlos Andrade, tenho interesse em saber o que é melhor para a população do Estado”, finalizou. (A.G.G)

Economista diz que tarifa de energia não vai diminuir com privatização

O economista e mestre em Desenvolvimento Regional da Amazônia, Dorcílio Erik, chegou à conclusão de que a tarifa de energia não vai diminuir com o modelo de privatização proposto pelo Governo Federal, em que o monopólio energético do setor público está sendo transferido ao setor privado sem que haja uma competição de empresas. “Com a competição por um menor preço, teríamos melhor prestação do serviço e menor preço. Mas a partir do momento que não existe outra empresa, ficamos sujeitos a continuar utilizando o serviço dessa empresa privada. A partir do momento que privatizar, o preço não vai diminuir”, falou.

Outro ponto destacado pelo economista foi a assistência junto às comunidades indígenas do Estado que utilizam motor e combustível para a produção de energia. Atualmente, o combustível e o técnico são enviados pela Eletrobras a custo zero. “Se privatizar, esse processo continua? Se der problema, a empresa privada vai mandar um técnico a custo zero? Como fica a situação dos agricultores que também não possuem rede e precisam de gerador?”, frisou.

Também presente na audiência, Erik comentou duas possibilidades para a privatização que foram expostas pela mesa: a extinção da empresa e dos postos de trabalho e a possibilidade da concessionária vencedora optar por quais funcionários vai manter no quadro e por qual preço. “Então, os salários que esses empregados já possuem vai sofrer um ajuste, certamente para baixo, quando passar para a iniciativa privada”, finalizou. (A.G.G)