Cotidiano

Novas regras da CLT vão entrar em vigor já a partir do próximo sábado

Principais mudanças estão na remuneração, contribuição sindical e mediação maior entre trabalhador e empregado

A Reforma Trabalhista, instituída pela Lei nº 13.467/17, que promoveu mudanças na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), publicada no Diário Oficial da União em julho deste ano, entra em vigência neste sábado, 11. Alguns pontos que chamam atenção são os que tratam da jornada de trabalho, parcelamento de férias, remuneração e atuação sindical.

A advogada trabalhista especialista em Direito do Trabalho e Direito Civil e professora do Centro Universitário Estácio da Amazônia, Rozinara Barreto Alves, elencou alguns pontos principais de mudança da reforma que vão causar impacto na vida do trabalhador.

REMUNERAÇÃO – Uma das modificações é com relação ao conceito de remuneração do trabalhador. Antes da reforma, diárias acima de 50% eram consideradas de natureza salarial, então tinham reflexo de décimo e férias. “Essa possibilidade foi retirada, então o trabalhador deixa de ganhar nas suas férias e deixa de ganhar no seu décimo esse valor das diárias acrescido”, explicou a advogada.

A professora informou que também foram retirados os abonos e os prêmios de natureza salarial. “Se o trabalhador recebia algum abono durante o ano por sua atividade laboral, esse valor não pode ser mais considerado salário e nem remuneração. A gente vê, visivelmente, uma afronta à Constituição, pois retira uma condição social mais benéfica. Antes esse valor também era considerado natureza salarial, que era refletido nas suas férias e décimo”, frisou.

Também foi retirado o direito à incorporação de gratificações de gerência e chefia. “O gerente que recebia uma gratificação por mais de dez anos, esse valor era incorporado em seu salário, caso o empregado ficasse no cargo por esse período, mesmo ele saindo depois do serviço. A reforma remove essa exigência temporal, não incorpora mais essa gratificação, podendo o trabalhador ficar 10 ou 15 anos no mesmo cargo e, mesmo assim, não será incorporado, não será parte do seu salário. Se ele perder o cargo de chefia, ele perderá a gratificação, ferindo o princípio da estabilidade financeira”, explicou.

Rozinara esclareceu que antes, no intervalo de descanso entre a jornada, a pausa para almoço era paga como hora extra, com natureza salarial. Então, se o empregador não concedia o almoço, o empregado teria que pagar em hora extra, com acréscimo de 50%, e refletia nas férias e no décimo. “Hoje, houve uma mudança significativa. O empregado só vai pagar o suprimido, ou seja, se ele concedeu 30 minutos e deveria ter concedido uma hora, vai pagar apenas os 30 minutos. Além disso, pagará com natureza indenizatória, não mais gerando o direito àquelas horas como salário”, acrescentou.

JORNADA DE TRABALHO – A advogada e pós-graduanda em Direito do Trabalho, Nathamy Santos, apontou a jornada de trabalho como uma das principais mudanças. A jornada costumava ser limitada a oito horas diárias, 44 horas semanais e 220 horas mensais, podendo haver até duas horas extras por dia. Agora poderá ser de 12 horas com 36 horas de descanso, respeitando as demais regulamentações.

“Outro ponto que podemos destacar na legislação é a jornada de 12×36, ou seja, quando o serviço pode ser executado em 12 horas, mas que terá que ser seguida por 36 horas de descanso ininterruptas”, disse Nathamy.

Ela afirmou que a mudança já existia na norma, porém, somente com acordo ou convenção coletiva, mas hoje a 12×36 pode ser efetivada com apenas um acordo individual escrito. Ela pondera que a jornada já era uma realidade em muitos locais de trabalho, principalmente nas áreas da saúde e de vigilância, por exemplo, mas ela se preocupa com a retirada do descanso semanal remunerado, que antes era pago em dobro.

“Toda vez que eu trabalhasse durante o meu período de descanso, ou seja, em feriado ou domingo, aquelas horas eram pagas em dobro e tinham natureza salarial. Hoje não. Se trabalhar nesses dias, a norma entende que o valor recebido já está embutido, portanto, não há nenhum acréscimo”, disse a advogada.

Outro ponto acrescido por Nathamy é a criação da jornada intermitente, que até então não era regularizada pela CLT. Dessa forma, os trabalhadores poderão ser contratados para trabalhar somente quando necessário e os empregadores vão pagar pelo período em que os serviços foram prestados.

“Esse tipo de contrato permitirá a realização de serviços com as interrupções de dias alternados ou apenas algumas horas do dia ou horas da semana, em que o trabalhador vai ser convocado pelo menos com cinco dias de antecedência. O empregado vai fazer o trabalho após assinatura do contrato e prestará esse serviço de acordo com a necessidade do empregador”, apontou Nathamy.

Além disso, o período em que o empregado estiver à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, não serão mais consideradas dentro da jornada de trabalho as atividades no âmbito da empresa como descanso, estudo, alimentação, interação entre colegas, higiene pessoal e troca de uniforme.

Sobre descanso, por exemplo, o trabalhador que exercia a jornada padrão de oito horas diárias tinha direito a no mínimo uma hora e a no máximo duas horas de intervalo para repouso ou alimentação. Agora o intervalo poderá ser negociado, desde que seja de no mínimo 30 minutos.

Atuação dos sindicatos foi reduzida

O fim da contribuição obrigatória do imposto sindical também é outro ponto em destaque. “A lei anterior permitia a obrigatoriedade do desconto uma vez ao ano de um dia de trabalho, mas agora essa contribuição passa a ser voluntária, ou seja, uma opção do trabalhador e do empregado em aceitar esse desconto”, salientou a advogada Nathamy Santos.

Também é destaque o acordo entre sindicato e empregadores. “O acordo entre sindicatos e empresas terão força de lei. Uma vez que houver divergência entre a lei e o acordo entre sindicatos e empresas, o que vai prevalecer é o acordo realizado entre eles”, informou.

Outro ponto trata sobre os acordos que poderão ser feitos entre o empregado e o empregador, retirando a necessidade de intervenção dos sindicatos em vários momentos. Para a advogada Rozinara Alves, no entanto, a mudança pode ser prejudicial para os trabalhadores.

“Entendo que quando se faz a mediação entre o trabalhador e o empregador, o peso não é igual. É óbvio que o trabalhador é mais vulnerável, óbvio que a força maior está no empregador. É muito difícil que o empregado diga não, que não vai assinar, que não concorda em uma situação imposta pelo empregador”, afirmou.

Férias podem ser parceladas

Outro impacto na vida do trabalho é o parcelamento de férias, que agora pode ser feita em três períodos, com a concordância do empregado. “Ou seja, quem vai decidir essa autorização do parcelamento é o empregado, sendo que um dos períodos não pode ser inferior a 10 dias”, esclareceu a advogada Nathamy Santos.

Segundo Rozinara Alves, o parcelamento pode ser considerado um dos benefícios da reforma trabalhista. “Não vejo nenhum prejuízo ao trabalhador o parcelamento das férias, até porque a norma traz com bastante clareza que essa medida é facultada ao empregado. Continua sendo férias em um único período de 30 dias. O parcelamento é uma exceção que a norma traz ao empregado decidir pelo parcelamento. Se ele entender que sim, é ele quem decide em regra geral. Hoje, já podia parcelar em duas e agora vai poder parcelar em três”, frisou.

A advogada também relembrou que a reforma mudou a forma de parcelamento de férias para os trabalhadores com mais de 50 anos. “A norma entendia que quem tem mais de 50 anos não poderia parcelar de forma alguma e tinha que tirar 30 dias. O parcelamento condicionado ao trabalhador, ele decidindo se quer ou não, vejo como muito bom ao empregado”, complementou.

Outros pontos relevantes na reforma

A plataforma Exame da Ordem dos Advogados Brasileiros (OAB) também divulgou uma lista das principais mudanças com a aprovação da proposta de reforma trabalhista, como transporte de servidores e trabalho de mulheres grávidas em condições insalubres.

Quando a empresa fornecia transporte para deslocamento do trabalhador, em razão de localidade de difícil acesso ou que não tivesse o acesso a serviço de transporte público, as horas que o trabalhador passava dentro do veículo até chegar ao local de trabalho costumavam ser contabilizadas como jornada de trabalho, mas agora não será mais.

Para mulheres, uma das principais mudanças é que as grávidas ou lactantes agora poderão trabalhar em ambientes considerados insalubres, desde que seja apresentado um atestado médico que garanta que não haverá risco para mãe nem para a criança.

TRABALHO EM CASA – O trabalho feito em casa, também conhecido como “home office”, não era contemplado na antiga CLT. Mas, agora, tudo o que o trabalhador usar quando estiver trabalhando em casa poderá ser formalizado por meio de contrato com o empregador.

A antiga CLT também assegurava que quem pedisse demissão ou fosse demitido por justa causa não teria direito à multa de 40% ou retirada do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Agora, a demissão poderá ser considerada de comum acordo, com pagamento de metade do aviso prévio e metade da multa. O empregado também poderá ter acesso até 80% do valor depositado pela empresa na conta do FGTS, mas não terá direito ao seguro desemprego.

Especialista diz que reforma beneficia mais o empregador

Segundo a advogada Rozinara Barreto Alves, apesar de muitas mudanças polêmicas, é preciso ficar claro que os servidores brasileiros precisavam da reforma, porém, em sua opinião, a proposta não foi pensada para beneficiar os trabalhadores.

“Nós temos uma Consolidação da Lei Trabalhista de 1943, com pequenas alterações ao longo dos anos, inclusive com alterações que vieram da própria Constituição. É óbvio que precisávamos de reforma. Nem tudo foi ruim nos direitos sociais do trabalhador, mas, em sua maioria, teve uma conotação direcionada em benefício do empregador”, apontou a advogada. “Realmente, quando a gente lê a legislação, as mudanças mais relevantes beneficiam o empregador, e não ao trabalhador”.

Segundo ela, ao aprovar a reforma com a justificativa de propiciar o desenvolvimento econômico, novas aberturas de vagas de emprego e flexibilização das empresas, é visível que a norma foi reformada para trazer benefícios ao empregador (P.C.)