Jessé Souza

Somos bomba relogio 07 02 2015 598

Somos bomba-relógio – Jessé Souza* Nunca vamos estar preparados para a morte. Mentimos muitas vezes que iremos aceitar o destino, que já aproveitamos bem a vida, que o destino deve ser cumprido. Mas o fato é que não queremos partir porque, apesar das dívidas, das dores, dos desalentos, da cadeira de roda ou de qualquer doença, queremos aproveitar mais um pouco deste mundo. Viver é o grande desafio. Passamos uma boa parte dela crescendo, desenvolvendo, aprendendo. Mas, quando achamos que estamos perto da maturidade, de acreditar que, agora sim, já podemos caminhar mais firme rumo ao futuro, começa uma contagem regressiva para o fim, para a despedida, para a partida fatal da qual não escaparemos. Então, nos tornamos uma bomba relógio em contagem regressiva. Quem tem uma religião espera que exista mesmo esta outra vida da qual acreditamos, muito melhor que essa, sem sofrimento, sem dor, sem aflições. Queremos o paraíso prometido e por ele tentamos seguir todas as regras celestiais, apesar de nossas ignorâncias, limitações e erros típicos de humanos imperfeitos. E quando a morte chega de supetão? E nos leva quando estamos no momento mais produtivo de nossas vidas? Quando ainda não colocamos nossos principais planos em execução? Ou ainda estamos em busca de consertar aquilo que passamos nossa vida errando, fraquejando, pelejando? Cada morte de um conhecido nos leva a uma reflexão profunda, pois sabemos que deste destino não escaparemos. Mesmo que nossa fé esteja firme, surge no peito a dor de um sofrimento por antecipação. Sabemos que esse dia fatalmente irá chegar. E que pode ser a qualquer momento, num átimo, naquele cruzamento no trânsito, na hora do lazer, na cama sombria do hospital… Ninguém conhece o relógio de Deus. A morte do professor Rafael Oliveira, da Universidade Federal de Roraima (UFRR), é daquelas que nos leva a estas reflexões, pois ele era um profissional comprometido com o coletivo, com a cultura local. Um cara que veio do Rio de Janeiro nos ensinar que é possível, sim, fazer as coisas darem certo quando se respeita a cultura e os conhecimentos locais. A partida de Rafael tem a mesma dor da despedida de outro professor da UFRR comprometido com Roraima, Erwin Frank. Perdemos duas pessoas que verdadeiramente se entregaram de corpo e alma a Roraima e sua gente. Um veio do Rio. O outro veio da Alemanha. Mas os dois tinham alma Roraimeira, tinham mais compromisso com esta terra do que muitos que aqui estão e têm os instrumentos necessários, mas não fazem questão de sequer dar a mínima contribuição para o desenvolvimento desse Estado. Ao professor Rafael Oliveira, as honras Macuxi. Fica a lacuna, mas sabemos que a luta tem de se prosseguir. Que saibamos aproveitar o legado que ele, assim como Erwin Frank, nos deixou. A morte não é o fim. *Jornalista [email protected]