Cotidiano

Mais da metade das pessoas presas em flagrante ganharam a liberdade

Levantamento parcial dos resultados do projeto de audiência de custódia em Roraima foi apresentado pela Associação dos Magistrados

Desde a implantação das audiências de custódia em Roraima, no início do mês de setembro, já foram realizados, até o momento, 50 procedimentos. Desse total, 66% dos presos em flagrante conseguiram o direito de responder a processos em liberdade.  Durante esses 20 dias de implantação do projeto, 16 pessoas tiveram a prisão preventiva decretada e houve também um relaxamento de prisão. Os principais crimes praticados pelos detidos levados às audiências de custódia foram tráfico de drogas, violência doméstica e pessoas embriagadas ao volante.

A divulgação do levantamento parcial dos resultados das audiências desde o dia 4 de setembro foi feita pela Associação dos Magistrados do Estado (Amarr). O coordenador do projeto, juiz Renato Albuquerque, ao destacar os pontos positivos dessa medida, ressaltou que o principal benefício do instrumento é a forma de humanizar o tratamento dos presos em flagrante.

“Antes, o juiz recebia em seu gabinete apenas o papel para analisar. Hoje, com essa audiência, não vem apenas o papel, mas o flagranteado em si, e com a oportunidade da defesa, de falar e se ter um caminho mais seguro de decisão em relação a sua prisão ou a sua liberdade”, explicou.

Segundo o coordenador, durante a audiência, o juiz analisa o cenário da sua prisão. “Analisa se a prisão atendeu ao artigo 302 do Código Penal, ou seja, se ela é legal do ponto de vista do flagrante em si e, sendo legal, se há elementos para se converter na prisão preventiva ou se há elementos para que se defina uma liberdade provisória com fiança ou sem fiança, encaminhamento para um tratamento ou uso de tornozeleira eletrônica”, explicou.

O magistrado informou que o Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMFS) já solicitou de todas as varas criminais e das comarcas do interior a listagem dos presos provisórios. O objetivo, segundo o magistrado, é planejar a realização de um mutirão para ouvir todos os presos provisórios e reavaliar suas prisões. “O grupo ainda vai se reunir para deliberar a logística para lançar o mutirão”, disse.

Os juízes que atuam nas varas criminais e na Vara de Execução Penal explicaram à imprensa que os presos em flagrante aguardam a audiência na ala 9 da Cadeia Pública, no bairro São Vicente, e também na Cadeia Feminina, na região de Monte Cristo, zona rural de Boa Vista. “Os presos não ficam nas delegacias, a não ser que o flagrante tenha sido feito até meio-dia, que já vão direto para a audiência. Após esse horário, vão para a Cadeia Pública, e eles devem ficar separados dos demais presos, ou para Cadeia Feminina numa ala específica”, explicou a juíza Bruna Zagalo.

Ao serem questionados sobre a recomendação de a Cadeia Pública não poder receber mais presos, o juiz da Vara de Execução Penal, Eduardo Messagi, criticou a demora por parte do  Executivo em melhorar as unidades prisionais do Estado e afirmou que o Judiciário não pode aguardar a “estrutura ideal” para agilizar projetos como a audiência de custódia. Pelo contrário, na análise dos magistrados, o projeto vai evitar mais superlotação.

“O Estado ainda não deu as soluções para a Cadeia Pública, não ampliou a estrutura nem na Penitenciária [Agrícola de Monte Cristo], nem na Cadeia Pública. Não terminou a unidade de Rorainópolis e não reformou a de são Luís [do Anauá]. Ou seja, se formos esperar para que tenhamos uma estrutura de forma adequada no Estado de Roraima, vai ter que tomar a seguinte solução: ou solta todo mundo ou a gente utiliza a estrutura que tem”, frisou.

Conforme os magistrados, um dos objetivos, inclusive do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), é reduzir o índice de presos provisórios, uma vez que no Brasil 41% da população carcerária é formada por presos que ainda não tiveram a oportunidade de ter a prisão em flagrante analisada. “Uma pesquisa realizada pelo Ipea indicou que 29% desses presos provisórios sequer – ao analisar o crime em si -, ao final, seriam condenados a um regime fechado ou a regime semi-aberto, que fere também o princípio da proporcionalidade”, argumentou o juiz Renato.

CASO POLÊMICO – O juiz Messagi aproveitou oportunidade para esclarecer que o suposto acusado de ter cometido o crime de estupro contra duas crianças, e que na audiência de custódia obteve a liberdade provisória, está recolhido no sistema prisional.

Segundo ele, por ser albergado, ficou configurado que ele cometeu uma falta grave durante o período em que cumpria sua pena de pernoites. “Foi reconhecida a falta grave e foi determinado o recolhimento dele à Cadeia Pública, o que já aconteceu”, informou.