Cultura do estupro X respeito de gênero – Andréa Freitas de Vasconcelos*Nas últimas semanas o tema da violência contra as mulheres, especialmente o estupro entrou na ordem do dia, o assunto ganhou as ruas, as mídias (nacional e internacional), devido à divulgação de um vídeo nas redes sociais de uma jovem ainda desmaiada após o estupro coletivo no Rio de Janeiro. Mas é bom lembrar que esse não é um caso isolado e, que a prática do estupro faz parte da realidade brasileira.
Algumas pessoas tentaram apresentar argumentos para amenizar e/ou mesmo justificar que esses fatos não teriam nada a ver com a cultura, situando-o no rol de crimes hediondos. Isso já sabemos! Então resolvi escrever e trazer alguns elementos para a nossa reflexão.
Cultura do estupro não é uma frase nova, foi bastante usada pelas feministas norte americanas na década de 1970, e desde então o termo serve para mostrar como a sociedade constrói argumentos e justificativas para culpar as próprias mulheres pelos estupros. Ou seja, de vítima a mulher violentada passa a ser ré no imaginário social. É como se as roupas, os horários, alguns lugares, as drogas, as bebidas, algumas companhias fossem o sinal verde para o estupro.
Esse pensamento-força é credenciado por inúmeros discursos: “Se estivesse em casa isso não teria acontecido”; “se ela tivesse mais cuidado e soubesse escolher suas companhias isso não aconteceria”, “mais ela procurou”. Essas justificativas não passam de mitos para preservar o machismo, a misoginia e podem ser confirmados por várias pesquisas. A Nota Técnica nº 11 do IPEA (2014) diz: os registros do Sinan mostram que 89% das vítimas são do sexo feminino e que 70% dos estupros são cometidos por parentes, namorados ou amigos/conhecidos. 24% dos agressores das crianças são os próprios pais ou padrastos e 32% são amigos ou conhecidos da vítima.
Em nossa sociedade os homens são estimulados a serem agressivos, rudes, sistemáticos como afirmação de sua virilidade, enquanto as mulheres devem ser dóceis, sedutoras, submissas, disponíveis etc. Ainda paira no imaginário social que homem que é homem de verdade, deve ser bruto e ignorante. Essas crenças encorajam os homens a cometerem agressões, violências e o estupro.
Ao olhar as propagandas na TV, as mulheres estão postas como objetos sexuais, são erotizadas e vistas como coisas, produtos de consumo. “Eu prefiro uma proibida”; “Vou de devassa”. Essa representação do corpo feminino segue nos comerciais, filmes, seriados, novelas.
Portanto, há expressões de uma cultura do estupro em toda parte, nas músicas, nas piadinhas de mal gosto, na linguagem sexista. Se um homem é vagabundo, é porque não trabalha; se uma mulher é vagabunda, é porque é “piranha”, “puta”, as palavras têm conotações diferentes dependendo do sexo.
Além de serem consideradas propriedades de alguns homens “Se ela não é minha, não será de mais ninguém”.
Esse sistema simbólico acima atua na psique de todos nós, fazem conexões, transmitem comportamentos que são assimilados subjetivamente.
Na cultura do estupro, as leis e quem as implementam tendem a encontrar vários entendimentos e brechas para proteger os agressores e culpabilizar a vítima que tem sua palavra posta em dúvida, além do julgamento moral que antecede qualquer inquérito e processo investigativo. A ideia de que matou por amor (forte emoção) e em defesa da hora continua presente nas cabeças de inúmeros juízes e advogados que buscam proteger sua fraternidade. A impunidade é um forte exemplo dessa cultura ………
O corpo da mulher torna-se um objeto, uma mercadoria, que pode, no imaginário colonizado e dominador de muitos homens e mulheres, ser agredido, violentado, estuprado etc. Essa visão de mundo (ethos) faz parte da cultura brasileira, que vende a mulata do samba tipo exportação, a sexualidade a flor da pele; além de promover e estimular a indústria sexual. A representação das mulheres é feita numa condição de pseudo-felicidade, subalternidade e dominação em relação ao sexo masculino.
Outra questão diz respeito ao preconceito e a discriminação que acompanha a vida das mulheres, que possibilita igualdade no mundo do trabalho, nas esferas de participação e tomadas de decisão do campo da política. Portanto, ainda não conquistamos autonomia financeira e política. E a tão sonhada autonomia física segue sufocada pela cultura da violência como um todo.Contudo, quando uma mulher diz NÃO! É NÃO! Mas esse NÃO geralmente é interpretado pelos homens e pelas próprias mulheres como um SIM! E como uma maneira de fazer “charme”, de fazer-se de difícil. Esta ideia errônea está internalizada no imaginário da sociedade, portanto precisamos desfazer/desconstruir o predomínio dessa ideia com políticas de educação voltadas para adolescentes, jovens e adultos rumo a mudanças de mentalidade.
Enquanto não pudermos viajar sozinhas, sair a qualquer hora sem preocupações e medo, vestir as roupas que desejamos e gostamos, enquanto não pudermos ir a festas, bailes, danceterias tranquilas, enquanto não pudermos decidir sobre nosso próprio corpo, enquanto os homens não forem “ensinados” e/ou educados para não estuprar, ao contrário, viver e praticar o respeito de gênero, podemos dizer que vivemos numa cultura do estupro.
*Mestre em sociologia pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), professora substituta no INAN/UFRR e integrante do Núcleo de Mulheres de RoraimaContato: [email protected].—————————————Fique de olho em você – Afonso Rodrigues de Oliveira*“Reconhece-se um país subdesenvolvido pelo fato de nele ser a política a maior fonte de riqueza”. (Gaston Bouthoul)Alguém já nos disse que não existiria vigaristas se não existissem os otários. E o que estamos vendo de vigaristas na nossa política, não está no gibi. Mas, na verdade, não é com eles que devemos nos preocupar, mas conosco. Ainda nos comportamos como meros pedintes diante dos nossos políticos. E não somos pedintes nem inferiores a eles, independentemente do cargo que ocupam. Eles não ocupam o cargo porque passaram no concurso, mas porque nós os elegemos para o cargo. E eles foram eleitos para cargos temporários com prazo determinado para serem substituídos. E é com os erros deles que devemos aprender a escolher seus substitutos. Que é o que é mais difícil de aprender. E só quando entendermos isso seremos capazes de eleger pessoas capazes, para o cargo que vão ocupar temporariamente. Pense nisso e pare de ficar baixando a cabeça, como um títere, para os que estão com o dever de fazer o melhor por você e por todos os que fazem parte da sociedade em que você vive.
Perigo maior do que o que estamos vivendo, pelo erro em eleger candidatos que nunca foram, nem nunca serão, políticos, é o que estamos correndo com a aproximação das eleições. Já estamos vendo aventureiros se preparando para a aventura. Porque pelo que vêem, nada mais fácil do que viver no céu da riqueza financeira. Sorrisos nos rostos; sobrancelhas erguidas; pensamentos que sabe-se lá por onde. Cuidado, seja esperto. Nem todos os que estão na política são políticos; e nem todos os políticos estão na política. E é aí que você deve ser político, envolvendo-se na política com a seriedade no seu voto. E é aí também que está o poder que você tem para mudar toda essa pantomima que vimos vivendo há séculos. E a responsabilidade na mudança é exclusivamente sua. Por isso seja esperto e cidadão.
A política é muito mais séria e merecedora de respeito do que se imagina, por melhor que imaginemos. Mas devemos nos preparar para sermos um povo respeitado pela nossa civilidade. E só obteremos isso quando formos cidadãos de fato e de direito. Quando como cidadãos, pudermos viver uma democracia, de fato e de direito. E não se esqueça de que não há democracia com obrigatoriedade no voto. Simples pra dedéu. Mas não pode haver liberdade no voto enquanto não formos educados para o voto facultativo. E é por isso que os políticos atuais não estão nem aí para nos educar. Cuidado com os que vêm por aí. Você será o responsável e patrocinador do administrador que você eleger. Pense nisso.
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