BEIRAL
Mesmo na beira do abismo d´água, resiste às mudanças propostas pela Prefeitura.
Às margens do rio Branco, o Caetano Filho, ou Beiral, e antes disto, o “Bairro da Olaria”, é uma das áreas mais antigas de Boa Vista, e já existia muito antes das décadas de 1930 e 40, quando as primeiras moradias começaram a ser erguidas. A região é uma área criada pela Lei Municipal de nº 1.117, que abrange parte dos Bairros São Vicente, Calungá e Centro. A área do Beiral é de 1.356.159,31 metros quadrados e 5.528,60 metros de perímetro.
Os primeiros moradores praticavam a agricultura de subsistência, além da pescaria no rio Branco. Aos poucos, as atividades foram evoluindo e as olarias surgiram. Inclusive, o nome “Olaria” foi a primeira denominação da área onde hoje está o “Beiral”. Depois veio a época da exploração de minérios pelos garimpeiros, o que impulsionou o processo de ocupação daquela área de terra às margens do rio.
Em 1962, o então prefeito de Boa Vista, Olavo Brasil, atendendo a um pedido dos moradores do local, modificou o nome de “Olaria” para “Caetano Filho”. O Francisco Caetano Filho era um comerciante que trabalhava com vendas de carne de porco, e tinha seu açougue numa casa na entrada do Beiral. O Caetano Filho foi morto em 1958, numa época em que as campanhas políticas iam além dos comícios nos palanques; e em que as disputas entre partidários e eleitores, muitas vezes terminavam em agressões mortais.
A Prefeitura não considera aquela área como sendo um “bairro”, e sim, como um núcleo do “Centro Histórico de Boa Vista”, onde a cidade começou. Mas, não é um “Bairro”. E, o apelido “Beiral” foi uma denominação dada pelos moradores, devido à localização às margens (ou beira) do rio Branco. E, o tradicional ponto de venda de peixe que há na localidade, também reforçou o nome “Beiral”.
Ao longo dos anos, as mudanças estruturais não foram significativas e a área ainda conta com construções antigas de madeira, que estão deterioradas. A infraestrutura é precária e os moradores convivem com as enchentes durante o inverno.
A violência e o tráfico de drogas fazem parte do dia-a-dia dos moradores de uma das regiões mais antigas de Boa Vista. No entanto, a comunidade local faz questão de lembrar que a maioria dos moradores é formada por trabalhadores honestos. Muitos ainda vivem da pesca ou tem um pequeno comércio de gêneros alimentícios.
O que poderia ser feito para melhorar o “Beiral”? Primeiro: a revitalização de toda a área, a começar pela iluminação de 1.963 metros em pontos diversos daquele local, além do recapeamento asfáltico das ruas; construção de calçadas e redes de drenagem de águas das chuvas. Outra medida seria a construção de 54 unidades habitacionais básicas, que poderiam atender as famílias que moram em áreas de inundação na parte do Beiral no Bairro Calungá.
A Prefeitura e o Governo do Estado já tentaram diversas vezes retirar os moradores do Beiral e dar-lhes moradias dignas em outro local. Mas, eles se recusam em sair, ainda que seja para um palacete. O motivo é que enquanto eles estiverem ali serão motivos de atenção, além de poderem comercializar seus “produtos” no Centro da cidade com mais facilidade, já que não precisam se deslocar para outros bairros, onde certamente há concorrência nas vendas.
Outro agravante é a enchente do rio Branco que periodicamente inunda as ruas e deixa submersas as casas. Desde 1956 há registro de enchentes no Beiral. Em 2011 a área ficou submersa pelas águas do rio Branco, e agora neste mês de julho de 2017, mais uma vez, nova enchente. Mas, os moradores teimam em ficar.
Na segunda-feira, dia 10/07/2017, a Prefeita de Boa Vista, Teresa Surita, em entrevista na TV Roraima, anunciou um projeto de revitalização da área a partir da demolição das casas alagadas. Noutra vertente, este projeto atenderá também à saúde pública, haja vista que pode ocorrer surto de doenças provocadas pelas águas poluídas.
O que a Prefeitura pretende num primeiro momento, é demolir 144 das mais de 340 residências. De acordo com a Prefeita Teresa Surita, 14 casas já estão prontas para serem demolidas à partir desta sexta-feira (dia 14). Ela disse ainda que as pessoas que vivem no “Beiral” serão realocadas para outro local, onde receberão novas residências do Programa federal “Minha Casa, Minha Vida”. Haverá casos de indenizações pelo imóvel e, noutros casos, enquanto aguarda a construção das novas casas, as famílias serão atendidas pelo Programa Municipal “Aluguel Social”, um projeto do executivo, aprovado na semana passada pela Câmara Municipal de Boa Vista.
A meta da Prefeitura é construir 1.500 casas e o custo operacional da obra já foi aprovado pelo Ministério da Integração. O processo de licitação deve ser iniciado na próxima semana e a estimativa é que todo o projeto custe em torno de R$ 100 milhões de reais.
A prefeita Teresa Surita, na entrevista, disse que o dinheiro já está negociado com a Caixa Econômica Federal, e que após a retirada das famílias que vivem no “Beiral”, o local passará por uma reestruturação e, nele será construído um espaço de lazer: o “Igarapé Caxangá”, com praças e parques. O que significa dizer que onde hoje está o afamado Beiral, será em breve um espaço turístico e de lazer. É ver para crer.
Alguns moradores não gostaram da ideia e teimam em permanecer, mesmo estando com as casas e ruas submersas pelas águas. “É baixar, e voltar”, disseram alguns.
É bom lembrar que a Lei Municipal nº 188, do dia 14/11/1988, que instituiu a “Divisão Intraurbana da cidade de Boa Vista”, não contemplou a área do Beiral, como um “Bairro”. E, portanto, o “Caetano Filho” continua sendo um grupo habitacional dentro do “Núcleo Histórico de Boa Vista” e, como tal, faz parte do Patrimônio Público. E, agora?