BRUTAS HISTÓRIAS DE UMA PERIFERIA ESQUECIDA (Cena 7)
Hudson Romério*
É difícil escutar o silêncio aqui!
Há tanto barulho, tantas cenas fragmentadas – sobras do que não foi dito… de tudo que tentou se falar… dos gritos do outro lado do muro… do medo de atravessar a rua… do vizinho que não se fala… o silêncio enlouque! Há gritos por todos os cantos… nem todos os cantos são gritos!
(Gritos e breves silêncios é o que se tem nas madrugadas quente da periferia).
As ruas estão quase sempre iluminadas, sempre cheias de gente, dessa bizarrice de não saber para onde vai, de onde vem… tudo é movimento, fluxo… mas o silêncio é escandaloso, é gritado! Dessa gente explorada, vítimas do descaso das promessas de dias melhores…
E lá vão elas! Lindas e sedutoras! As pobres meninas (quase moças) do subúrbio. O prenúncio do menstruo é a senha do rito de passagem: agora podem ser consumidas! Como disse a grande Elza: “A carne mais barata do mercado é a carne negra”! Se for menor ou maior… loiras, morenas, caboclas, negras, estrangeiras (tudo é carne negra!) – isso não faz a mínima diferença! Meninas, garotas… não importa, é a nova safra que os senhores sérios da zona sul irão consumir – não há pecado nisso, são filhas daquela gente da periferia.
Silêncio… as ruas já estão quase vazias… silêncio! Três da manhã, nem parece que aquele mundo de gente que transita aqui ocupa todos esses espaços ao mesmo tempo. Silêncio, já não ouço mais nada… daqui a pouco tudo começa de novo! Uma explosão dessas criaturas! As ruas são inundadas por esse povo todo, todas essas pessoas com seus sonhos, suas verdades, com suas frustrações – todos buscam seu melhor, mas sabem que no fim não terão nada mais que um melancólico fim… silêncio! Tudo agora é silêncio…
A periferia é o revés do silêncio – tem de tudo, não há ausência de nada, mas segue seu paradoxo existencial: falta tudo para todos. E mais uma madrugada chega, as ruas vazias, as praças silenciosas, as feiras e bares numa calmaria que nem parece o inferno diário.
(Elas passam tão ingenuamente… cada lugar tem suas garotas de Ipanema).
O silêncio é o mesmo que a palavra falada, só que sem seu sentido concreto… ele é o sonho de toda manhã: ser entendida sem ser perturbada. A palavra já não é ouvida e nem pronunciada há muito tempo – é a espera da desesperança, dessa gente toda que enche as ruas todos os dias, correm atrás de um tempo que não volta, andam com pressa, não olham para o lado, vão para lugar nenhum, só seguem em frente… mas esse em frente vai da aonde?
Todo esse barulho é reverberado para todos os lugares da periferia, todos os pontos equidistantes desse lugar tão distante, dessas ilhas que compõem as imensas cidades… que entopem de gente toda a urbe. Todo o silêncio é interrompido por sons, gemidos, grunhidos, vozes que nem sei mais de quem são, das bocas caladas, proibidas de expressar suas dores… como foram para ali?
Fala-se de tudo, chama-se todos os nomes, grita-se todos os palavrões! Nada é sutil, tudo é na hora, sem improvisos! As meninas andam por aí sem nenhum pudor de suas saias, de suas pernas… das bocas saem os palavrões! Os xingamentos de toda ordem! Também sai o doce prazer que encanta e perturba o mundo. Não há moralidade ou imoralidade, só o desejo louco e explicito de se libertar desse mundo louco e débil chamado subúrbio.
*Escritor e Cronista Tel: +55 (95) 99138.1484 [email protected]
ME FASCINA O BOM DIA DO VENEZUELANO E ME ENTRISTECE A INDIFERENÇA DE MADONNA
Wender de Souza Ciricio*
Em 2012, Madonna, no Brasil, fez homens e mulheres ficarem até 15 dias numa fila para comprar ingresso e assim poderem contemplar um pouco mais de perto essa ícone e rainha do pop. A cantora reservou um hotel no Rio de Janeiro, em frente à praia de Copacabana, para toda sua equipe, filhos e pessoas ligadas ao evento. O intrigante em todo esse movimento e que despertou em mim um olhar mais clínico foi a sacada do quarto onde a cantora estava hospedava. Aquela sacada que dava uma visão mais glamorosa para aquele espaço do hotel esteve vazia e sem receber o suspiro e os passos de qualquer ser humano, mais precisamente da Madonna. Mas por que a Madonna tinha que caminhar ou dar importância para aquele pequeno espaço? Porque embaixo daquela sacada tinha fãs, muito mais do que centenas, milhares de fãs. Estavam ali desde adultos, avós com seus netos, pais querendo mostrar a cantora que curtiam quando eram adolescentes, jovens, meninas e meninos, todos alucinados, ansiosos e com uma gigante esperança em ver a rainha aparecer naquela sacada e acenar, dar um sorriso, marcar presença e demonstrar gratidão por quem coleciona seus discos, ouve suas músicas e compra caros ingressos para ver e ouvir suas músicas e coreografias bem de perto. Impressionante, Madonna deu de ombros, se esquivou, não fez questão, não olhou, não acenou, não pisou na sacada, nada de calor, de afagos e de reconhecimento. Mesmo vários dormindo embaixo daquela sacada, Madonna não fez o mínimo esforço para um aceno, nem de leve, nem de raspão, nem um dedinho esticado para aqueles que incansavelmente declaravam com gritos e suplícios pelo nome da cantora. A sacada ficou vazia e os fãs sacaram que com ela não havia elo de ligação.
Por outro lado, dia desses, caminhando por uma avenida movimentada na pequena Boa Vista, onde geralmente estaciono meu carro, me surpreendi com um grito estridente e forte de um venezuelano. Seu grito parecia vir lá do fundo do coração, da alma e de suas veias arteriais. Em seu grito ele disse: “Bom dia professor”. Falou tão alto que acredito que quem estava há pelo menos ciquenta metros de distância tenha escutado. Uma coisa posso afirmar: a cena foi linda. Fiquei pensando em como pode um homem de outro país, tido por muitos como usurpador de espaços físicos em nossa cidade, visto como um invasor, um rapaz que vigia carros ganhando míseras moedas sem levar, às vezes, nem dez reais para sua habitação que pode muito ser um abrigo, um prédio público abandonado ou uma guia próxima de um asfalto movimentado me dar um “bom dia” tão sincero, tão desprovido de segundas intenções, tão robusto, de coração cheio e de peito estufado?
A legítima verdade é que muitos esperam o reconhecimento daqueles que convivem no caldeirão da soberba e da empáfia. Estão no topo do sucesso às custas de uma multidão que vestem suas camisas, gritam seus nomes, reproduzem suas músicas, tentam imitar seus dribles, dançar seus rebolados e nada de aconchego e agradecimento. A reciproca é tão rara que quando algum desses abraça um fã, de preferência criança, ficamos extasiados e bestializados, aumentando assim nossa idolatria por ele, que raramente enxerga seus fãs.
Por isso prefiro a “reles”, o anônimo, o pecador, o imperfeito, os discriminados, os esteticamente feios, os pobres, porque diante desses não preciso mendigar um bom dia, um sorriso sincero e um abraço honesto, sem hipocrisia e artificial. Para muitos esse ”tipo” de gente não terá memória, passarão pela vida e logo serão esquecidos e dissolvidos de nossas mentes. Nunca vamos perguntar onde está aquela senhora que varria nossos asfaltos, e aquele jovem que pula e sobe no caminhão pegando
nossos lixos e aquele pedreiro que fez nossas calçadas. Eles vão de nossas mentes porque nelas nunca entraram e não entraram porque não possuem carrões, não usam grife, não consomem uísque Old Parr, compram suas roupas no brechó e dependem de cestas básicas da igreja.
Ainda continuo fascinado com o bom dia do venezuelano. Por ele passo e me sinto alguém amado, valorizado e prestigiado. Não sinto angústia e ansiedade pelo aceno do Neymar, da Madonna e nem do Jorge e Matheus. Assim como o simples, o humilde e o pobre lá da favela não tem memória para maioria de nós, muito menos nós para essas estrelas. Quem tem mais valor para você?
*Psicopedagogo, historiador e teólogo [email protected]
A mente livre
Afonso Rodrigues de Oliveira*
“A mente livre é como a águia soberana e altaneira que paira no ar brincando com o vento.” (Antônio C. Rocha)
Uma das maiores dificuldades do ser humano é manter sua mente livre. A esmagadora maioria prefere seguir a vida seguindo os pensamentos dos outros. Perdem totalmente a liberdade de pensar por si mesmos. Ainda não perceberam que a liberdade de pensamentos nos obriga a nos aprimorarmos no andamento da racionalização. Corta essa, cara. Por que perder seu tempo com aborrecimentos causados pelos que não sabem viver? Comece respeitando o direito que todos temos de errar. E o maior erro é não dar atenção ao erro considerando-o como um indicativo para o acerto. Ou aprendemos com os erros ou continuaremos errando. Lembra-se do que disse o Thomas Edson? Foi uma das lições mais simples e mais edificantes: “Eu não estou errando. Estou aprendendo como não fazer na próxima vez.” Simples pra dedéu.
Os prejuízos com os erros dependem da nossa capacidade de encarar o erro. E é aí que aprendemos que nunca conseguiremos encontrar a solução, ficando presos ao problema. Então não faça do seu erro um problema. Encare-o como a águia encara o vento que perturba os pássaros que não sabem vencer. E cada um de nós é um pássaro voando nos nossos pensamentos. E nem percebemos que eles, os pensamentos, nos levam aonde queremos chegar. E só quando sabemos para onde estamos indo, sabemos onde estamos na chegada. E para os vencedores a, caminhada não termina. Porque estamos voando para o horizonte que é inatingível.
Siga seu caminho sem a preocupação de se cansar. O cansaço só atinge os fracos. Respire fundo sempre que estiver se sentindo asfixiado. Mantenha seus pensamentos sempre no rumo de onde você quer chegar. Lembre-se na caminhada, que o futuro é lá na frente. Que durante a caminhada, amanhã o hoje já será ontem. Hoje é o momento que você deve viver como ele deve ser vivido. E tudo depende da semente que você plantou ontem. Então continue a caminhada independentemente do cansaço que você estiver sentindo. Ele faz parte do aprimoramento. Nunca se sinta vencido. Para o bom atleta não há disputa, o que há é competição. Seja um atleta da vida, competindo com os acontecimentos, mesmo que eles pareçam superiores a você. E você só será inferior se sentir-se inferior.
Seja a águia de sua vida. Voe, paire e divirta-se com o vento da contrariedade. Porque é assim que conseguimos chegar ao topo da montanha, sem o cansaço. A vida é uma luta renhida. E só vence os realmente competentes para a competição. E você pode. Mas tem que saber que pode. Tudo depende dos seus pensamentos. Pense nisso.
*Articulista [email protected] 02-11-19