Bom dia,

Clever João era um indígena de 37 anos que morava numa comunidade indígena situada a cerca de 70km de Lethen, na República Cooperativista da Guiana. Pai de seis filhos – deixou o sétimo na barriga da mulher – ele morreu semana passada na cidade brasileira de Bonfim, para onde foi levado em busca de socorro médico. Chegou muito debilitado e não foi possível fazer muita coisa para salvá-lo. As prováveis causas da morte de Clever João – a verdadeira só poderia ser identificada através de exames mais aprofundados e que não são feitos quando o morto é pobre – podem ser uma infestação grave de verminose ou intoxicação decorrente de utilização de agrotóxicos sem os devidos cuidados.

Como centenas de outros indígenas guianenses, Clever João veio diversas vezes da Guiana para trabalhar no Brasil, quase sempre em propriedades rurais em função da falta de qualificação. É bem possível que em algumas dessas vindas ele possa ter trabalhado em lavouras e tenha aplicado agrotóxico sem as recomendações de proteção mínimas, como exige a legislação e a própria orientação dos fabricantes. De qualquer forma, não se pode afastar que as condições insalubres em que vivem as comunidades indígenas, daqui e da Guiana, possam ter provocado infestação de verminoses, que dependendo do tipo podem levar, em hipótese extrema, à morte.

FEITIÇARIA

De qualquer forma, familiares e parentes de Clever João, ouvidos por uma fonte da Parabólica, atribuem como causa de sua morte os efeitos decorrentes de um “serviço” feito por uma macumbeira que vive na mesma comunidade indígena em que vivia o índio falecido. E que ele teria morrido porque a “rezadeira” que o atendeu, e fez várias sessões de “consultas”, com direito à “batição” de folhas, não foi suficientemente forte para retirar o “mal” que lhe fez a “macumbeira”. Por mais que o nosso informante tenha tentado influenciar na percepção dos parentes sobre as causas da morte de Clever João, eles continuaram com suas crendices, chegando mesmo a citar outros exemplos de “serviços” feitos pela mesma “macumbeira” contra os membros de comunidades, inclusive contra crianças.

INDÚSTRIA

E não se pense que este caso agora narrado é fato isolado. Quem conhece um pouco da vida dos milhares de indígenas guianenses que moram na periferia de Boa Vista sabem da existência das “rezadeiras” que também moram na Capital roraimense e que atendem aos que são vítimas da maldade das “macumbeiras” de lá. Essas rezadeiras chegam a cobrar cinquentas reais por sessão de reza. É uma indústria baseada na exploração da crendice, que inclui até alguns mais espertos que têm transporte, quase sempre veículos muito velhos e que encaminham os portadores a maldade das “macumbeiras” para as “rezadeiras”.

MUNDOS

Como o leitora/leitora está percebendo, esta é uma narrativa real feita em pleno Século XXI – já quase no final da segunda década – sobre fatos também reais e atuais, mas que parecem ser ainda remanescente dos anos de escuridão da Idade Média (Séculos XV e XVI). Servem para refletir em que mundo ainda vivemos, que combina a economia 4.0; um mundo cada dia mais digital; influencers digitais, que apesar das exceções é um território livre para picaretagem – onde cabe as mudanças radicais de valores, com direito a todo tipo de mimimi –; mas onde cabe igualmente gente que ainda acredita em feitiçaria.

FOGO 1

Ontem, domingo (12.01), enormes labaredas de fogo consumiam rapidamente boa parte da vegetação do Parque Anauá, bem no Centro da capital boa-vistense e que abriga várias repartições públicas, inclusive da Polícia Militar do estado. Uma equipe de reportagem da Folha passou pelo local e pôde observar o esforço de um pequeno contingente do Corpo de Bombeiros Militar que, com a ajuda de uma viatura, tentava controlar as labaredas. Não estava sendo fácil devido às fortes lufadas de vento que multiplicavam os pontos do fogo. E isso aconteceu bem no Centro. A altura do capim era denunciadora de que ali não foi feita qualquer roçagem preventiva.

FOGO 2

Na noite de sábado, último, (11.01) um leitor da Coluna resolveu apreciar o belo luar (de Lua Nova) trafegando pela BR-174, no trecho entre Boa Vista e Mucajaí. “Tive a preocupação de olhar o horizonte em todas as direções e pude constatar a presença indicativa de inúmeros pontos de fogo, especialmente no lavrado. Eu tenho, infelizmente, a impressão que mais uma vez os órgãos encarregados de minimizar os efeitos dessa tragédia anunciada todos os anos não conseguirão evitá-la, sequer minimizá-la”. Nós, daqui da Parabólica, já alertamos sobre isso, mas recebemos como resposta da Secretaria de Comunicação do governo estadual que todo o planejamento está concluído.