Jessé Souza

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Para quem não acredita e tem ‘complexo de vira-lata’, um exemplo que vem dos EUA

Jessé Souza*

Já que muitos brasileiros com “complexo de vira-lata”, como diria Nelson Rodrigues, costumam ter como base somente o que vem dos Estados Unidos (EUA), então vamos buscar a história de um rio que secou em um pouco mais de meio século de agressões por parte das ações do governo norte-americano. Esqueçamos o Tietê, por enquanto.

Trata-se do rio Colorado, o sétimo mais longo dos EUA, que em 1922 era exaltado por naturalistas como possuidor de um pujante Delta na Baja Califórnia, mas simplesmente secou, deixando o México sem água potável. E não foram agressões garimpeiras, aos moldes criminosos do que está sendo feito em Roraima.

O rio Colorado tem 2.330Km de extensão e atravessa cinco estados norte-americanos. Antes era um rio 100% mexicano, mas atualmente deveria desaguar no noroeste do México, mas ele secou completamente a partir de 1960 devido à agressiva política governamental que autorizou projetos de irrigação no árido território da Califórnia, além de barragens e desvio do curso para servir a fazendas e abastecimento de várias cidades (Fonte: @germanopjneto\Twitter).

Se um extenso e pujante rio secou em 61 anos mediante uma política de governo, que significam ações e projetos monitorados, imagine quantos anos levarão os rios do Estado de Roraima para secarem completamente, caso o Governo Federal permita a continuidade das criminosas e recorrentes agressões que vêm sendo feitas por garimpos ilegais em terras indígenas.

Operações para desarticular garimpos vêm sendo realizadas pelo Exército, a exemplo da que ocorreu na semana passada, e que está em curso neste momento com apoio da Polícia Federal, no Rio Uraricuera, outro manancial severamente agredido. Mas essas ações são tão pontuais que sequer conseguem alcançar as principais frentes de explorações ilegais dentro e fora das terras indígenas.

É preciso muito mais, por meio de operações permanentes de guerra mesmo, pois o que está em jogo não é a sobrevivência apenas dos indígenas, mas o futuro de todo o Estado. E isso é estratégico não só para o Brasil, mas para o mundo. O Brasil possui a maior reserva de água doce do planeta (13%). E cerca de 81% de toda essa água fica na Região Norte do País.

O que foi exposto sobre o desvio do leito do Rio Mucajaí, gravado em vídeo pelos próprios garimpeiros, conforme foi comentado em artigo anterior, é apenas uma fração do que vem ocorrendo em todos os rios dentro da Terra Yanomami, os quais são afluentes do principal manancial de água potável de Roraima, o Rio Branco, que atravessa o Estado de norte a sul e deságua no Rio Negro, no Amazonas.

O Rio Branco já apresenta sinais de severas agressões, cuja água límpida outrora vista nos balneários públicos de Boa Vista, Mucajaí, Iracema e Caracaraí, pode ser notada com coloração escura e com acúmulo de lama nas areias das praias urbanas.

Se o avanço dessas frentes garimpeiras não forem contidas, não irá demorar muito para secar alguns rios e provocar danos irreversíveis no nosso principal manancial de água potável e no ecossistema. Será possível notar o grande risco do desabastescimento quando o Estado enfrentar a próxima seca rigorosa. Por destino da natureza, Roraima não tem registrado fortes secas nos últimos três anos.

O alerta vem sendo dado e o exemplo que vem dos Estados Unidos reforça o sinal vermelho para aqueles que só acreditam no que vem lá de cima. Ou o Brasil toma uma atitude agora, imediatamente, ou não tardará para ser o principal alvo das novas guerras ambientais por causa da água potável.

Anotem isso.

*Colunista