Jessé Souza

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Enquanto arma-se um circo midiático, mais um golpe é armado na Câmara Federal

Jessé Souza*

O projeto de desmantelo das legislações ambiental e indígena segue voraz no Congresso Nacional, comandada pelos ruralistas, enquanto a população assiste ao circo midiático da CPI da Covid-19 e dos passeios de moto do presidente. Está pautado para hoje, 26, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal, o Projeto de Lei 490/2007, que tenta transferir para o Legislativo a decisão sobre demarcação de terras indígenas.

A proposta já é uma aberração por si só, porque tenta mudar por meio de um projeto de lei o procedimento da demarcação de terras indígenas definida pela Constituição Federal. Só aí já é patente a inconstitucionalidade. Mas a ordem é “passar boi e passar boiada”. Esse PL junta tudo de ruim criado em outros governos desde 2005 em único “pacote de maldade” contra os povos indígenas.

O projeto ruralista altera o Estatuto do Índio e cria a lei antidemarcação, estabelecendo o marco temporal a partir de 05 de outubro de 1988 como critério para demarcações, retirando o direito de consulta às comunidades, que é consagrado internacionalmente, e proibindo revisões do tamanho de terras indígenas, que foram demarcadas com tamanho menor do que deveria.

Desde o início da discussão sobre o PL, o projeto é apontado como inconstitucional pelo Ministério Público Federal (MPF), pois afronta os artigos 231 e 232 da Constituição Federal e por utilizar precedentes já superados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) visando atender aos interesses de grupos econômicos.

O PL 490/2007 é apenas mais uma frente dos ataques do atual governo, apoiado pela bancada ruralista, que tem apresentado uma série de projetos para flexibilizar o licenciamento ambiental, ampliar o uso de venenos e permitir a venda de terras para estrangeiros e liberar obras em terras indígenas.

O texto desse projeto subvertem julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF), em especial o do caso Raposa Serra do Sol, quando a Corte votou a favor da demarcação contínua da Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol, descartando a proposta de uma demarcação em ilhas. Na decisão, o STF estabeleceu 19 condicionantes, mas determinou que elas não deveriam ser aplicadas a outros casos.

É justamente isso o que o PL 490 faz, agindo com subterfúgios para utilizar as condicionantes com a finalidade de impedir demarcações, sem que os povos indígenas fossem consultados a respeito das mudanças propostas, o que significa um “vício insanável” no projeto, conforme vêm falando especialistas sobre o assunto.

O golpe está armado na Câmara Federal (mais um) contra os povos indígenas, enquanto as madeireiras extraem madeira ilegal para serem enviadas para os Estados Unidos, com documento fraudado e com acobertamento do ministro do Meio Ambiente, e os garimpeiros avançam na Terra Indígena Yanomami, atacando a tiros índios e policiais federais, com a conivência de um governo que parece se orgulhar de ser o “vilão ambiental” aos olhos do mundo.

*Colunista