Os dados da operação da PF que revelam o poder do garimpo ilegal
Jessé Souza*
Aos poucos, a Polícia Federal vai possibilitando entender como age o esquema de quem realmente banca a garimpagem ilegal na Terra Indígena Yanomami ao Norte do Estado de Roraima. A mais recente operação, Uirihi Wapopë (como os garimpeiros são chamados pelos Yanomami), apresentou dados surpreendentes.
Um fato que merece análise diz respeito à apreensão de um tanque utilizado para armanzar combustível instalado dentro da Área de Proteção Permanente de uma propriedade cujos limites fazem divisa com a Floresta Nacional de Roraima. A propriedade fica em um ponto estratégico para dar apoio ao garimpo ilegal. Surpreendentemente, o tanque tinha autorização da Fundação Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Femarh). Agora faz sentido a “lei do garimpo” que foi aprovada pela Assembleia Legislativa de Roraima e sancionada pelo governador Antonio Denarium (PP), lei esta que acabou sendo derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por ser flagrantemente inconstitucional.
O que a “lei do garimpo” pretendia era justamente legalizar a mineração em terras não indígenas, o que liberaria a autorização por parte da Femarh para que se atuassem no entorno da Terra Yanomami, áreas estas que serviriam estrategicamente para servir de base de apoio para abastecer o garimpo com combustível, alimentação e equipamentos.
Agora é necessário não apenas investigar a emissão dessa autorização como também outras que por ventura facilitem a logística do garimpo ilegal no entorno das terras indígenas, cujos dados da operação da PF mostram uma movimentação milionária: R$425 milhões em dois anos!
A operação ainda bloqueou cerca de R$10 milhões de quatro suspeitos e o lacramento de duas empresas que davam apoio à atividade ilegal, as quais estavam no nome de “laranjas”. Os números referem-se somente a uma parte de apenas um dos esquemas. Tem muito mais gente graúda envolvida. Esses números servem para dar a dimensão não só da evasão de divisa, como também o tamanho do estrago que está sendo feito nos principais rios de Roraima, em especial o Rio Uraricoera, afluente do Rio Branco, que por sua vez também é afluente do Rio Negro, no Amazonas.
O mercúrio que contamina todos os mananciais de água potável de Roraima é apenas um dos estragos que ameaçam os povos indígenas e a população roraimense. Os rios estão sendo sentenciados de morte, a exemplo do Rio Mucajaí, severamente agredido há vários anos.
Os Yanomami são vítimas da violência, de doenças e outras desgraçadas levadas pelo garimpo, como o alcoolismo, a prostituição, fim da caça, que é o principal fonte de alimentação, e a dependência dos garimpeiros, que os aliciam para que facilitem a garimpagem ilegal.
Enquanto tudo isso ocorre, somente um pequeno grupo de pessoas fica milionário, incluindo donos de aeronaves, às custas de garimpeiros usados como mão de obra desesperada, que sonham com a riqueza fácil, mas encontram um trabalho análogo ao trabalho escravo.
É preciso passar o garimpo ilegal a limpo, pois é o futuro imediato do Estado de Roraima que está em jogo, com a destruição da Floresta Amazônica e o genocídio dos povos indígenas. As operações da PF representam um alento para que essa realidade possa ser revertida, uma vez que os governos estadual e federal apoiam o garimpo ilegal.
*Colunista