Bom dia,
Hoje é sexta-feira (29.10). Na Câmara dos Deputados, e de sorte no Congresso Nacional, a dificuldade para produzir consensos nos dias atuais é visível. Veja-se o caso do presidente da Câmara Federal, o deputado federal alagoano Arthur Lira (Progressistas). Eleito no começo do ano, com larga margem de voto, ele impôs humilhante derrota ao então poderoso presidente da Casa, o deputado federal carioca Rodrigo Maia (Democratas), que iniciou inclusive o desmanche deste partido. Lira aparecia então como um dos mais influentes e poderosos – ainda o é, de alguma forma, por conta do regimento da Câmara, que concede poder discriminatório para quem a preside. Chegou mesmo a falar grosso contra o presidente da República, quando lembrou que se ele não entrasse na linha poderia colocar para em pauta um dos vários pedidos de impeachment que dormitam em suas mãos.
Nas últimas votações ocorridas na Câmara Federal, a propalada liderança de Arthur Lira entre seus pares vem sendo colocada sob questionamento. No primeiro caso, quando sua Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que alterava a composição do Conselho Nacional do Ministério (CNPM), foi derrotada em votação no plenário restou evidente que a força das corporações no Brasil vai muita além da vontade de quem dirige as casas congressuais. Nem mesmo a vontade de muitos parlamentares, processados a pedido de membros do Ministério Público, foi suficiente para enfrentar o poderio das corporações, uma característica de nossa vida social e política.
Agora vem a vez da aprovação da PEC dos Precatórios. O Supremo Tribunal Federal (STF) jogou no colo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) a obrigatoriedade de pagar de uma só tacada, no próximo ano uma montanha de dinheiro de R$ 89 bilhões. Esses precatórios foram decorrentes de sentenças de processos que transitavam há vários anos na Justiça brasileira. Essa obrigatoriedade imposta pelo STF de pagamento desses bilhões de reais coincide com a exigência moral, política e social do Estado brasileiro socorrer inadiavelmente milhões de brasileiros e de brasileiras sequelados pela miséria e fome, que foram também vítimas da crise econômica derivada do combate à pandemia da Covid19.
Num orçamento decididamente comprometido por despesas obrigatórias – pagamento de juros e amortizações da dívida pública; despesas previdenciárias; e despesas com pessoal-, ainda mais agravado por conta de emendas dos parlamentares/do relator ao orçamento, que agora são impositivas; e da imposição constitucional de limitação do teto dos gastos do governo federal, não sobra espaço para pagar todos os precatórios, e ao mesmo tempo instituir o novo Bolsa Família, de em média 400 reais por família, que o governo quer chamar de Auxílio Brasil. Não custa lembrar que no próximo ano ainda tem mais um sobre-esforço ao orçamento da União, que é o também bilionário Fundo Eleitoral, que os políticos não abrem mão de tê-lo.
Por conta desse cenário, o governo para instituir o Auxílio Brasil tem duas alternativas, ou quebra, com autorização do Congresso Nacional a limitação constitucional do teto dos gastos; ou reduz pela metade a obrigatoriedade impôs pelo STF, também com autorização congressual, o pagamento dos precatórios bilionários. Se a saída for encontrada através da quebra do teto dos gastos do governo federal é preciso dizer aos brasileiros que teremos mais alta do dólar, e por via de consequência, da taxa de juros; o que significa mais inflação e menor possibilidade de crescimento da economia. É tudo uma questão de escolha; ou sacrificamos um pouco o recebimento dos precatórios -alguns de duvidosa origem-, ou vamos impor mais sacrifício para a população como um todo, especialmente para a população mais pobre.
Com a ajuda do Arthur Lira, o Ministério da Economia tenta aprovar uma PEC, que possibilitaria ao governo parcelar os precatórios, pagando no próximo ano 39 bilhões de reais, parcelando o restante para pagamento nos orçamentos seguintes. Lira tem tentado colocar a PEC dos Precatórios em votação desde o começo desta semana, mas não tem conseguido quórum suficiente – para aprovar uma PEC são necessários 308 votos-, e já adiou a votação para a próxima semana. O que precisa ser esclarecido é se os deputados federais não querem trabalhar mesmo, ou se fogem do plenário para não decidir contra os interesses de quem quer receber precatórios. Se assim for, resta evidenciada, mais uma vez, a força das corporações entre nossos políticos.
Ah! Resta ainda a articulação da oposição ao governo de Jair Bolsonaro, que pode até encontrar razões para desgastá-lo ainda mais, na base do quando pior melhor, mesmo que seja à custa da fome e miséria que se abate sobre a população mais pobre. Que triste este Brasil.