Jessé Souza

Nao se pode transigir com o garimpo ilegal sob nenhuma hipotese 12948

Não se pode transigir com o garimpo ilegal sob nenhuma hipótese Jessé Souza*

Extremamente preocupante a fala do presidente do Sindicato dos Policiais Federais de Roraima (Sinpofer), Everaldo Ramos, ao afirmar que “Boa Vista vai penar se o garimpo acabar”, em um clara defesa de uma atividade ilegal e criminosa, conforme a legislação brasileira. Trata-se de um representante de policiais defendendo uma atividade que é para ser combatida a qualquer custo.

Embora não tenha entrado em detalhes, o que ele quis dizer é que Roraima iria sentir um impacto econômico “muito forte” se o país acabar com o garimpo ilegal, opinião esta que considera a ilegalidade como uma atividade econômica da qual o Estado não poderia deixar de prescindir, fortalecendo ainda mais os argumentos dos defensores de uma atividade ilegal e altamente degradante, com custos irreversíveis para a sociedade. 

Ter essa posição em defesa do garimpo, que é um crime, é como defender que o fim do tráfico de droga também deixaria “um estrago financeiro” em Roraima à medida que impediria a circulação de dinheiro na cidade, sem levar em conta os graves reflexos que essa atividade criminosa provoca, como a criminalidade, a destruição de famílias, mais gastos de dinheiro público na segurança e na saúde pública etc etc.

Mais preocupante ainda é que se trata de um policial saindo em defesa de uma atividade que a polícia tem o dever de ofício de combater. Sem levar em conta os graves reflexos que essa atividade provoca para toda sociedade, como a destruição dos principais mananciais de água potável que abastecem todo o Estado e que servem de atividade econômica para vários municípios banhados pelo Rio Branco, que deságua no Amazonas!

Quem quiser ter uma pequena noção desse risco é só observar no que as praias públicas se transformaram em Boa Vista e nas demais cidades banhadas pelo Rio Branco, a exemplo de Mucajaí e Caracaraí, onde a lama é visível nos balneários que há alguns anos se tratavam de águas límpidas, um orgulho do roraimense e que era um fator tratado como uma riqueza natural.

Se algo não for feito para acabar com essa atividade ilegal, não serão apenas os balneários que irão desaparecer em atoleiros de lama, mas haverá o surgimento de doenças graves que acometerão a  população  (o mercúrio é apenas um desses riscos) e o surgimento de graves crises hídricas que irão cobrar um preço muito alto de toda a população, em um futuro muito próximo. 

É preciso destacar que o garimpo ilegal só é uma atividade rentável porque seus financiadores não  pagam impostos, utilizam mão de obra análoga a escravidão, não têm a obrigação de recuperar as áreas degradadas e sequer precisam gastar em regularização fundiária. E ainda fomentam diretamente o surgimento de outras atividades ilegais, a exemplo do tráfico de drogas e de armas, que faturam alto justamente por não terem custos.

Dentro desse aspecto, vale ressaltar que o garimpo no Brasil não é proibido. A proibição é para a atividade dentro de terras indígenas e ambientais. Quem quiser explorar minério precisa de autorização legal, o que implica em rígidas normas ambientais para evitar impactos ao meio ambiente, o que por si só desencoraja investidores a apostarem nessa atividade pelo alto custo. O garimpo ilegal, então, passa ser rentável porque não há contrapartidas.

Ainda que haja uma rígida legislação para que mineradoras possam explorar minérios legalmente, as normas não são garantias para se evitar graves incidentes ambientais e tragédias humanas. Os exemplos disso são as recentes tragédias ocorridas em Minas Gerais, como foram os casos de Mariana e Brumadinho, cidades varridas do mapa ao serem soterradas pela lama de rejeitos da exploração mineral.

Em Roraima e no Amazonas, quem está pagando o preço imediato são as comunidades indígenas Yanomami, sob o risco de extinção, o que não causa comoção porque há uma grande parcela de pessoas antiindígenas que não se importam com isso e que defendem o garimpo ilegal. A própria Assembleia Legislativa de Roraima realizou uma audiência com garimpeiros no mesmo dia em que o mundo realizava a conferência mundial COP 26.

O que não é dito nessas audiências é que jamais irá existir a exploração mineral aos moldes arcaicos realizados hoje, defendidos por políticos demagogos. A legalização significa a entrada de grandes mineradoras, algumas com capital estrangeiro, que irão contratar “garimpeiros” como qualquer outro trabalhador, inclusive exigindo escolaridade. O garimpo ilegal é apenas mais uma atividade à margem da lei explorada por quem tem dinheiro e que quer fazer seu patrimônio aumentar sem ter contrapartidas.

É por isso que a declaração de quem defende o garimpo é preocupante. Porque não há um esclarecimento sobre realmente o que significa essa regularização e os reflexos de uma atividade altamente degradante. Nem a consciência de que essa forma arcaica de garimpar – desafiando os poderes constituídos, fomentando o surgimento de máfias e milícias, explorando mão de obra e alimentando a evasão de divisas – jamais será defendida em qualquer país onde haja uma sociedade organizada.

*Colunista