É preciso repensar o apagão de dados que sempre prejudicou o nosso desenvolvimento
Jessé Souza*
Em tempos não muitos distantes, já houve tentativas do governo local de proibir a divulgação de boletins de ocorrência policial, pela Secretaria Estadual de Segurança Pública, para a imprensa. Era uma forma enviesada e burra de cessar a publicação sobre a criminalidade em Roraima, tentando fazer com que a opinião pública pensasse que nada grave estava acontecendo, já que a mídia não estaria mais divulgando, apesar dos recorrentes crimes.
Recentemente, ocorreu um caso clássico no governo Bolsonaro, em 2020, quando o presidente tomou medidas para dificultar a divulgação de dados sobre a propagação da Covid-19 no país, apesar do crescente casos e mortes pelo novo coronavírus no Brasil, com estratégias que se valiam de atrasos na atualização dos números e omissão de dados para dificultar a contagem de ocorrências.
Os governantes sabem que informações são estratégicas politicamente, para o bem e para o mau. Pensando positivamente, quanto mais dados os administradores tiverem, melhor para tomar decisões, traçar metas, definir estratégias e programar ações de governo. Significa que as pesquisas são fundamentais para tomar decisões a fim de melhorar a vida da sociedade.
Pelo lado negativo, quanto menos informações e dados, menos transparência e menos informações sobre o que não está dando certo. Não dá para saber sobre as insatisfações populares e falhas nas decisões de governo apenas por meio das publicações nas redes sociais e divulgações isoladas na imprensa. Então, neste caso, para se obter dados precisos é possível apenas por meio de pesquisas.
Sem pesquisa, é como se nada estivesse ocorrendo ou apenas uma parcela estivesse “com mimimi” em redes sociais, como habituou-se a rotular aqueles que reclamam dos problemas em tempos de pós-verdade e de disseminação de fake news como política de desinformação para que mentiras se tornem verdades.
E por que a Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) tomou a decisao de encerrar o contrato com a empresa responsável pelas estatísticas de casos e mortes por Covid-19, além da vacinação no Estado? Embora os números de contaminações e mortes estejam reduzindo, isso não significa que o governo tenha que relaxar. Pelo contrário, é o momento de estar de olho nos dados para monitorar a doença e tomar decisões.
Ou alguém agora não quer que sejam divulgados os números da queda da doença diante da manutenção do estado de calamidade aprovado pela Assembleia Legislativa e sancionado pelo Governo do Estado? Se for isso, é mais uma daquelas decisões esdrúxulas que costumavam ser tomadas no passado como forma de tentar manipular a opinião pública.
O Estado de Roraima historicamente adota a “política do apagão de dados ” como estratégia. E isso tem impedido não apenas a tomada de decisões, mas também influenciando a opinião pública para que ela não saiba o que está ocorrendo e, desta forma, cobrar as autoridades ou pressionar os políticos para que eles cumpram com suas obrigações.
Hoje não sabemos dados estatísticos sobre a violência no trânsito, criminalidade (mais um corpo amarrado e decaptado foi encontrado ontem), pobreza, situação de estradas estaduais e vicinais, população carcerária etc. Quando as estatísticas surgem é porque elas são divulgadas por entidades nacionais através da grande imprensa. Porque localmente há uma política de esconder números.
E assim vamos mantendo um Estado refém de políticas públicas construídas por interesses eleitoreiros, os quais são responsáveis por manter Roraima na mesmice e no marasmo, ao longo dos anos. Então, essa é a importância de se manter a população informada com fatos e números, para que as pessoas também sejam protagonistas nas tomadas de decisões.
Não poderíamos pensar no Brasil atual sem as informações produzidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pois não teríamos como medir as injustiças sociais a fim de que a sociedade organizada cobrasse políticas públicas para combater as iniquidades. E assim tem sido há quase um século de informações estatísticas que nortearam um Brasil melhor ou menos injusto.
É hora de se cobrar uma política séria para Roraima que tenha base em dados e estatísticas na tomada de decisões, e não em discursos ou em ocultação de dados por meio da “política do apagão” que tem coloborado com a manutenção de injustiças e de políticos demagogos.
*Colunista