Jessé Souza

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Querem ressuscitar antigas táticas tendo uma CPI como palco

Jessé Souza*

Um novo movimento em favor do garimpo surgiu, em Roraima, não por coincidência em ano eleitoral, apostando tudo na criação de uma CPI das Ongs na Assembleia Legislativa. Se aprovada, servirá novamente como palco de antigas teorias conspiratórias criadas na década de 1990 e que serviram para fixar, no inconsciente coletivo roraimense, a paranoia da internacionalização da Amazônia.

Essa paranoia foi base fundamental para a defesa do garimpo ilegal nas terras indígenas, estabelecer o ódio aos povos indígenas, os colocando como entraves ao desenvolvimento do Estado e agentes entreguistas, bem como responsável por criar a popularidade de políticos que usavam teorias conspiratórias para se fixarem, com discurso para incutir o pânico na população e, ao mesmo tempo, se colocando como os únicos capazes de combater esse “monstro” que eles mesmos inventaram.

Naquela época, defensores e empresários de garimpos se tornaram políticos utilizando a paranoia da internacionalização, cujas Organizações Não Governamentais (ONGs) eram esse monstro a ser combatido, sendo a Diocese de Roraima a personificação do grande mal. Pregando o medo, com uso principalmente do rádio para disseminar a paranoia e as mentiras (hoje chamada de fake news), foi instalada toda a base para dominar a política e deixar o povo sob o cabresto deles.

Com todo o cenário montado, a criação de uma Comissão Parlamentar Inquérito (CPI) para investigar a ação de ONGs, que supostamente usavam os indígenas para internacionalizar a Amazônia e surrupiar os minérios, foi o grande palco desse movimento responsável por transformar apoiadores e investidores do garimpo ilegal em políticos e em respeitáveis autoridades com apoio de grandes mineradoras e madeireiras.

Embora boa parte dos políticos na ativa tenham surgido naquela época, um dos mais influentes foi Elton Rohnelt, que foi madeireiro, empresário de garimpo e um dos líderes da invasão garimpeira nas Terra Indígena Yanomami nos anos 1980. Como ex-paraquedista e fazendo voos para o garimpo, ficou conhecido por ter um revólver feito de ouro puro. E foi assim que acabou eleito deputado federal por Roraima, de 1995 a 2003.

Rohnelt foi vice-líder do governo Fernando Henrique Cardoso e assessor direto do então presidente Michel Temer. No governo Bolsonaro, foi indicado presidente emérito da Câmara de Gestão e Estudos Superiores do Instituto do Desenvolvimento da Mineração (IDM Brasil), que é a organização responsável por toda a assessoria técnica a e interlocução com o setor mineral feita para a Frente Parlamentar da Mineração em Brasília.

Tempos se passaram e a mesma tática da paranoia da internacionalização foi usada por grandes produtores de arroz quando disputavam áreas dentro da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, no início da década de 2000, período de grandes e turbulentos conflitos que só cessaram quando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu a questão no ano de 2012 e os produtores de arroz foram retirados.

Da mesma forma, com apoio da grande maioria dos políticos e da mídia local, esse período foi responsável por fazer surgir politicamente o líder dos arrozeiros, Paulo César Quartiero, que foi eleito prefeito do Município de Pacaraima (2005/2008), local dos grandes conflitos, deputado federal (2011/2014) e vice-governador de Roraima, de 2015 até 2018, quando ele renunciou ao cargo. Hoje sequer mora no Estado.

Novamente, ressurge um novo movimento com as mesmas características e táticas de alimentar antigas paranoias, as quais não passaram disso mesmo – paranoias – e tentando emplacar uma nova-velha CPI das ONGs, que em outros tempos não deu em nada, a não ser palco político em ano eleitoral e alimento de uma falsa ação visando legalizar o garimpo dentro de terras indígenas, da mesma forma que ocorreu no passado.

O enredo é bem mais amplo e envolve vários personagens. Porém, este pequeno retalho serve para demonstrar como a questão indígena é usada e beneficia politicamente quem explora esse discurso. Se as pessoas não abrirem os olhos, novamente elas serão submetidas a antigas teorias da conspiração para beneficiar novos personagens que querem alçar voos altos na velha política da qual todos conhecem muito bem.

O golpe está aí…

*Colunista