De olho na fronteira Norte, um caso surreal da velha política
Jessé Souza*
Se a imigração desordenada foi um duro golpe para inviabilizar o Município de Pacaraima, que se somou ao completo declínio da economia da Venezuela, a ação deletéria dos políticos daquele município pode ser considerada a gota d’água do cenário de terra arrasada que se tornou aquela cidade fronteiriça, ao Norte do Estado. Trata-se de uma situação que precisa servir de exemplo pela grave crise instalada por lá.
Não significa perseguição aos políticos ou falta de assunto desta coluna ao retomar Pacaraima como tema. E sim a necessidade de chamar a sociedade a refletir sobre o que está ocorrendo por lá diante da imobilidade daqueles munícipes, cuja maior parte é formada por comunidades indígenas. A situação instalada naquela cidade fronteiriça mostra uma população refém da malversação dos recursos públicos.
Não bastasse o prefeito e vice cassados por conta de voto, o prefeito e secretários foram alvos de operação da Polícia Federal que investiga suspeita de desvio de recursos da saúde. E, agora, o Ministério Público de Contas (MPC) investiga todos (sim, TODOS) os nove vereadores por supostas irregularidades no recebimento de verbas indenizatórias, as quais teriam sido pagas por meio de notas frias ou por serviços inexistentes.
Sendo assim, estamos diante de um fato surpreendente, em que todos os políticos com mandato de uma cidade estão sob investigação acusados de corrupção e ainda com os mandatários cassados, embora recorrendo no cargo. Ou seja, enquanto a população come o pão que o diabo amassou por causa da invasão em massa de venezuelanos fugindo do seu país, as investigações apontam que os políticos aproveitaram o cenário para praticar atos escusos, em vez de se mobilizarem para uma ação de enfrentamento ao caos instalado na fronteira.
Os problemas não param por aí. Pacaraima foi criada no meio da Terra Indígena São Marcos, espremida contra a fronteira, sem área de expansão e com sérios problemas ambientais. Da forma que os políticos vêm conduzindo irresponsavelmente aquele município, a expectativa é que fique cada vez mais insustentável viver naquele lugar. Muitos já venderam tudo e foram embora. Outros ainda resistem, mas pensando em desistir diante da desesperança e da desgovernança política.
A situação política é tão séria que a Prefeitura não consegue mais executar emendas parlamentares. E, em vez de atacar os sérios problemas, os mandatários optaram por realizar um carnaval fora de época, mesmo a cidade estando sob calamidade pública, inclusive com a única estrada de acesso, a BR-174, em condições precárias. Uma situação surreal que chama não só as autoridades a uma providência, mas aquela população a assumir suas responsabilidades.
Sabe-se que o prefeito e o vice foram cassados por compra de voto. Significa que os eleitores venderam seus votos, que por sua vez coloca esses vendilhões na condição de corresponsáveis pelo que está ocorrendo em Pacaraima. Isso precisa servir de exemplo para todos aqueles cidadãos que vão às urnas em outubro, pois esta situação é um aviso do que pode ocorrer quando a corrupção se instala com a conivência ou esperteza do eleitor.
A população da fronteira precisa tomar uma atitude, especialmente as organizações indígenas que lá existem, a fim de tomarem posições políticas que possam tirar a cidade do caos profundo, refutando definitivamente a política degradante que domina o cenário há muito tempo, chegando ao seu mais alto grau. Os mandatários já mostraram que não estão interessados, inclusive existe ocorrência policial do prefeito em briga de bar em Boa Vista, com mulheres agredidas, a 200km de onde deveria estar trabalhando dia e noite.
Não podemos esquecer que este caso em questão precisa servir de alerta a outros municípios, para onde recursos milionários foram enviados recentemente a fim socorrer a população, especialmente pequenos agricultores, porém as estradas e vicinais continuam intrafegáveis, com pontes de madeira desabando, enquanto a população segue ludibriada com cesta básica. Já sabemos o que pode ocorrer quando todos são coniventes ou quando os eleitores acham que estão lucrando ao venderem seus votos. Então, olhem para a realidade da fronteira Norte como consequência da velhacaria na política.
*Colunista