Desprezo, desleixo e falta de interesse político com o Linhão de Tucuruí
Jessé Souza*
Depois de historicamente culparem os povos indígenas, as Organizações Não Governamentais (ONGs), os comunistas, os esquerdistas e os alienígenas, os políticos da base governistas e o próprio governo Bolsonaro fizeram pouco caso para que fosse dado início às obras do Linhão de Tucuruí e assim garantir, finalmente, energia confiável para o Estado de Roraima. Desta vez, a culpa está exatamente na falta de interesse e de vontade política de um governo que nunca colocou essa questão como prioridade.
Uma matéria publicada nesta quarta-feira, 14, no jornal O Estado de São Paulo, deixa bem claro o que está acontecendo: morosidade dos órgãos federais, o que pode ser entendido mesmo como desleixo político. Conforme a publicação, há duas semanas, o impasse para iniciar a obra foi tema de uma reunião com representantes da empresa Transnorte Energia, responsável pelo projeto, com representantes da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), quando tudo foi detalho a respeito do impasse que impede o início das obras.
“No encontro, a Transnorte, uma sociedade de companhia privada Alupar e da estatal Eletronorte, detalhou sua preocupação com o atraso e deixou claro que, hoje, o acordo com os indígenas está selado, mas órgãos federais, como o Ministério de Minas e Energia (MME), o Ibama e a Funai, ainda não se posicionaram oficialmente, o que tem impedido o início das obras”, detalha a matéria do jornal paulista, ao complementar: “O que foi negociado foi aceito pela empresa e indígenas, resta o aceite do Governo Federal”, declarou a concessionária na reunião, citando o MME, a Funai e Ibama.
Está bem claro que entre os principais interessados pelo início da construção do linhão entre Manaus (AM) e Boa Vista (a empresa e os Waimiri-Atroari) não há mais qualquer empecilho. A proposta de indenização da Associação do povo Kinja (ACWA), que representa o povo indígena, também foi aceita, inclusive com uma parte a ser assumida pelo Governo Federal, que até hoje empurra a responsabilidade com a barriga e não se pronunciou mais sobre o assunto. E da mesma forma estão caladinhos os parlamentares roraimenses, cuja maioria da bancada é da base de apoio de Bolsonaro.
O que tem de concreto mesmo sobre pedidos feitos por parlamentares roraimenses ao governo foi o episódio de dois senadores indo ao Ministério do Meio Ambiente interceder por uma grande empresa madeireira para que fosse liberada um grande carregamento de madeira (o maior de todos) apreendida durante uma operação da Polícia Federal, caso este que culminou inclusive com a exoneração do então ministro Ricardo Salles. Enquanto isso, não se viu nenhuma mobilização da bancada federal e do próprio Governo de Roraima para que as obras do Linhão sejam destravadas dentro dos órgãos federais e do próprio governo que não se posicionou sobre sua parte no pagamento da indenização aos indígenas.
Na matéria do jornal Oesp, foi lembrado que, em cima de um palanque em Boa Vista, o presidente Jair Bolsonaro anunciou, em setembro do ano passado, o início da construção do linhão de Tucuruí. “Esse pesadelo, em menos de três anos, deixará de existir neste Estado maravilhoso”, discursou o presidente – inclusive, neste dia, houve parlamentares vaiados em praça pública. “Um ano depois, nada aconteceu”, sentencia a reportagem ao desnudar os meandros dessa questão que atormenta os roraimenses há décadas.
Pelo que se desenha na política nacional, nada será resolvido até o fim das eleições e, pelo andar da questão política, em se tratando de um Estado inexpressivo eleitoralmente, tudo deverá ficar para o próximo ano; ou, pelo que indicam as mais recentes pesquisas, para o próximo governo. Diante disso, não se pode esperar mais nada da bancada federal em Brasília, cujos parlamentares estão obviamente mais preocupados com suas reeleições ou com a campanha eleitoral de seus grupos. O povo que espere e que fique com os apagões, principalmente no interior do Estado, onde blecaute é um problema tão corriqueiro quanto rompimento de fibra óptica da internet.
*Colunista