Somente boa intenção não vai mudar a realidade de produtores orgânicos
Jessé Souza*
Feirantes esboçaram um sorriso de canto de boca com a aprovação do Projeto de Lei n° 36/2022, pela Assembleia Legislativa de Roraima, que tem a finalidade de incentivar e fomentar as feiras-livres de produtos orgânicos. Mas é bom não se iludir assim, de cara, pois o projeto cheira a letra morta, tal qual muitas leis que são criadas apenas para jogar para a plateia política.
Não se trata de pessimismo ou de torcer contra. Os fatos muitos evidentes levam a crer em mais um placebo, uma vez que o governo sequer tem cuidado das duas feiras-livres sob sua administração, a Feira do Produtor e a Feira do Passarão, onde a ausência do poder público é visível por qualquer visitante.
Na Feira do Produtor, na divisa dos bairros São Vicente, Mecejana e Pricumã, a estrutura precisa de reformas há muito tempo para dar conforto e segurança a vendedores e consumidores, mas não recebeu qualquer atenção nos últimos quatro anos. Exemplo: enquanto há um imenso terreno abandonado bem ao lado da feira, que poderia ser usado para estacionamento, carros, motos e gente se espremem lá dentro.
Na Feira do Passarão, na divisa dos bairros Caimbé e Asa Branca, o abandono é visto logo de cara, com os feirantes instalados em uma estrutura improvisada e precária, enquanto aguardam a reconstrução do prédio desde a administração passada, sem que haja ao menos um prazo para a conclusão das obras.
Então, se não há incentivo nem para o que já está aí, é de se imaginar o que esperam aqueles que trabalham produzindo culturas orgânicas, os quais produzem sem incentivos e dispõem hoje apenas de espaços privados para trabalhar, sem nenhuma atenção do poder público. Isso se o Executivo sancionar o projeto de lei, alegando que a matéria cria despesa para a administração pública.
Se produtores e feirantes estão sem apoio na cidade, quem produz no interior, muitas vezes com suas propriedades dependendo de vicinais e pontes de madeiras intrafegáveis, sente também a ausência do poder público. Nos últimos quatro anos, passaram pelo drama do abandono antes, durante e depois do inverno.
Somente agora, com ao menos três anos de atraso, o Governo de Roraima anunciou a assinatura de ordens de serviços para obras de construção de pontes, implantação de vicinais e asfaltamento em estradas. Estão incluídas ainda obras de reforma das escolas estaduais. E isso porque o governo passou a campanha eleitoral alegando que estava tudo bem, com tudo reformado e sem problemas.
Estão aí os fatos que levam a não criar falsas expectativas em relação a um projeto bem intencionado, mas que poderá não vingar de acordo com o que anseiam aqueles que vivem da produção orgânica na Capital e no interior. Nem o básico e tradicional estão recebendo a atenção devida.
Será necessário muito mais que um projeto de lei aprovado para valorizar os que produzem, e sim de vontade política de investir na agricultura familiar e nos pequenos produtores largados nas longínquas vicinais por todo o Estado.
*Colunista