Caso de enredo estarrecedor e a necessidade de se passar a religião e a política a limpo
Jessé Souza*
O Brasil acompanhou o desfecho do caso da ex-deputada Flordelis no fim de semana, condenada pelo júri popular por ser a mandante do assassinato do marido, o pastor Anderson do Carmo, crime executado por filhos e a neta. É um enredo intrigante porque vai além da tentativa de envenenamento e a execução do crime com arma de fogo.
O caso ainda envolve incesto, pedofilia, abuso de menores e prostituição forçada, conforme os depoimentos de testemunhas e familiares acusados, cujo fio do enredo começa pelo próprio pastor que, antes de ser marido, foi filho adotivo de Flordelis e, ao passar a conviver com a família, teve um relacionamento amoroso com a filha biológica da ex-deputada ainda na adolescência.
Ou seja, passou de filho adotivo para genro ao se relacionar com a irmã e, depois, se tornou marido da mãe adotiva, o que por sua vez significa que se tornou padrasto da irmã e ex-namorada. Os depoimentos e as próprias investigações apontam relacionamentos entre a ex-deputada e filhos adotivos, bem como assédios do pastor às filhas adotivas.
Enfim, um caso estarrecedor quando se leva em conta que se tratava de uma família considerada nos dias atuais como tradicional e evangélica que defende a Pátria, mas que não passava de fachada e acobertada pela hipocrisia dos que se arvoraram, no país, os donos da fé, da verdade e da política brasileira.
Aqui o ponto crucial: muitas igrejas, especialmente as pentecostais, abandonaram todos os seus princípios para se tornarem explicitamente partidárias, escolhendo não apenas um lado, mais um ídolo, o colocando como predestinado por Deus e, pondo o adversário como alguém não apenas a ser derrotado, mas destruído sob o auspício de ser o próprio demônio.
Desta forma, não apenas a política ficou dividida entre esquerda e direita, mas entre Deus e o Diabo, em que havia um evidente projeto de se instalar algo parecido com uma teocracia, um poder político fundamentado no poder religioso, pela encarnação da divindade no governante.
Foi assim que pastores e outras lideranças evangélicas (inclusive um padre candidato fez dobradinha no primeiro turno) se arvoraram não apenas como os enviados de Deus, mas também o monopolizadores da fé e de um projeto político em curso, atraindo ainda falsos pastores e falsos crentes, hipócritas, espertalhões e vendilhões do templo.
É dessa política fraticida, a qual promiscuiu e desvirtuou a fé, que o país precisa livrar, arrebanhando cristãos incautos, sujeitos a crerem em seus líderes com discursos para justificar seus interesses políticos partidários, os quais visam tão somente acumular mais poder, inclusive materiais, enquanto ao rebanho resta pagar o dízimo sob qualquer sacrifício.
Da forma que tudo vinha sendo arquitetado, até pastores vendilhões não hesitaram em pedir propina com dinheiro da Educação em troca de barra de ouro ou negociar vacina com valor superfaturado. E saíram do esgoto personagens como estes do caso Flordelis, os quais vestiam a capa de Deus acima de tudo. Definitivamente, o país precisa passar os falsos cristãos a limpo também.
*Colunista