O histórico desprezo do Parque Anauá e o novo anúncio de mais uma maravilha
Jessé Souza*
O anúncio feito pelo Governo do Estado de que irá promover uma ampla reforma e ampliação na estrutura do Parque Anauá, obras estas que custarão cerca de R$120 milhões, conforme divulgado, esconde o histórico de desleixo e abandono, além de jogar para debaixo do tapete os remendos, cacarecos e situações ainda não explicadas, a exemplo do que ocorreu às vésperas das eleições do ano passado.
O atual governo abandonou o Parque Anauá por longos quatro anos, um dos quais a estrutura ficou fechada para visitação pública, de 2020 a 2021, em virtude da pandemia. E demorou quase o mesmo tempo para realizar uma limpeza básica com a finalidade de deixar o parque com a mínima condição de ser usufruída pelo público, entre estruturas caindo aos pedaços e obras inacabadas.
Da maneira que a obra de reforma e ampliação foi anunciada, fica parecendo que a atual administração irá fazer tudo sozinha, com recursos próprios, como se nada tivesse ocorrido antes. Por isso é necessário que os órgãos de controle fiquem imediatamente atentos ao valor que foi anunciado, pois as obras remontam à administração anterior, a qual também fez um anúncio parecido de que iria transformar o Parque Anauá em algo extraordinário.
Porém, o tempo provou que foi tudo uma mentira. Com base no que foi anunciado à época pelo então governo Suely Campos, já era para estar em pleno funcionamento uma praça com um enorme relógio solar de granito, pista para cooper, quiosques e quadras esportivas, cujas obras foram orçadas em R$ 23,5 milhões (R$ 14,5 milhões para a primeira etapa e R$ 9 milhões para a segunda). Tal obra foi empenhada em 2015, mas apenas no final de 2016 começaram os trabalhos.
Já na administração do atual governo, novas placas de identificação dessas mesmas obras foram instaladas ao lado da antiga, informando a contratação de uma outra empresa, com sede em São Paulo, para concluir o contrato das obras que foram abandonadas pela empresa anteriormente licitada, cuja primeira etapa do complexo deveria ter sido entregue ainda em 2018, ou seja, três anos depois de as obras iniciadas.
Em 10.08.2021, esta Coluna pediu explicação ao governo sobre as obras abandonadas, cuja nota emitida informava que a primeira etapa já havia sido concluída (uma lanchonete, duas quadras poliesportivas cobertas, um campo de futebol society, uma pista pavimentada para cooper, um relógio solar em granito, além da urbanização do local); e que a segunda etapa estava 70,59% executado (uma pista de atletismo de oito raias, dentro dos padrões do Comitê Olímpico Internacional).
Então, é possível notar o desprezo e a irresponsabilidade com que foi tratado o Parque Anauá não apenas desde o governo Suely, mas de todos os governos anteriores, mesmo sendo o maior parque urbano da região Norte, com área de 106 hectares ao longo de uma área privilegiada de Boa Vista.
Embora tenha anunciado que irá transformar o parque na mais moderna estrutura já mais vista em Roraima, o atual governo só começou a realizar algo nos meses finais de 2022, isso às vésperas das eleições, quando foram revitalizadas a Praça Interativa José Renato Haddad (conhecida popularmente como Praça das Fontes) e a piscina olímpica, localizadas no complexo do Ginásio Totozão, que até hoje está abandonado.
As obras de revitalização custaram cerca de R$ 5 milhões, mas por debaixo dessa cifra está uma história ainda mal explicada. Relembremos: inaugurada em 2007, a Praça Interativa só teve o ato de desapropriação do terreno em 2010. No entanto, às vésperas das eleições passadas, o atual governo decidiu pagar pela desapropriação em um acordo extrajudicial e sem respeitar a ordem cronológica de pagamento, por se tratar de um precatório.
Mesmo com a ação judicial movida pelos donos do imóvel cobrando indenização do Governo de Roraima pela desapropriação, tramitando junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), o governo fez um acordo que resultou no “pagamento amigável” da primeira parcela de R$22,6 milhões do total de R$ 45,6 milhões da indenização, pagamento este que a Justiça mandou estornar, mas o banco informou que o dinheiro já não estava mais na conta.
Então, acima do anúncio efusivo sobra as obras do Parque Anauá, há ainda muito a ser explicado sobre obras abandonadas, recursos federais e estaduais aplicados (ou não), indenização suspeita do terreno e muito mais que ainda ficou oculto, a exemplo da situação do Museu Integrado de Roraima (MIRR), que foi fechado e o prédio abandonado até hoje dentro do Parque Anauá (mas esse é assunto para um próximo artigo).
*Colunista