Jessé Souza

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A morte de uma bebê em Caicubi e a grave situação da saúde pública no Baixo Rio Branco

Jessé Souza*

A morte de uma bebê neste fim de semana, na isolada comunidade Caicubi, na região do Baixo Rio Branco, no Sul do Estado, próxima da divisa de Roraima com o Amazonas, soma-se ao quadro de preocupação da infância roraimense que está morrendo por falta de assistência e das condições ruins da saúde pública de Roraima para todos, que vem de longas datas.

Mas a situação das cercas de 200 famílias que moram em Caicubi é de extrema gravidade, pois a criança morreu devido à total desassistência a que aqueles moradores estão submetidos, assim como as demais comunidades da região, aonde só se chega de barco ou de avião. Lá existe apenas um posto de saúde, onde falta o básico, como remédios, e não dispõe sequer de um enfermeiro temporário ou um técnico de enfermagem permanente.

A desassistência parte de todos os níveis de governo, em que a Prefeitura de Caracaraí tem dado prioridade à realização de festas com pagamento de gordos cachês a artistas nacionais, enquanto não disponibiliza qualquer tipo de assistência, muito menos uma lancha para fazer deslocamento específico de pacientes graves para atendimento na unidade de saúde mais próxima.

Como o Governo do Estado e a Prefeitura de Caracaraí largaram essas comunidades ao completo descaso, a emergência mais rápida fica do lado amazonense, na comunidade de Barcelos,  já que a região fica próxima da divisa com o Amazonas. É uma situação deprimente para os moradores e vergonhosa (se é que eles se envergonham de algo) para as autoridades que só costumam a aparecer por lá em tempo de campanha eleitoral para pedir votos.

Aliás, os políticos de Caracaraí costumam repetir que os votos do Baixo Rio Branco fazem a diferença para eleger vereadores e prefeito – ou prefeita, conforme tem ocorrido nos últimos anos. No entanto, encerrada a apuração dos votos, os moradores voltam a encarar a realidade de abandono e desassistência, especialmente na saúde pública, onde ter um médico para atender as pessoas é um evento especial.

Áudios de moradores de Caicubi indignados com esta realidade começaram a ser compartilhados nos grupos de WhatsApp, no domingo, um dia após a morte da criança, relatando exatamente esta situação de abandono, desespero e aproveitamento eleitoreiro da realidade a que estas comunidades estão submetidas. Houve até quem incitasse a população a tomar medidas drásticas em protesto a este descaso governamental.

Não é para menos, pois, conforme os relatos, o posto de saúde é uma fachada só de nome, uma vez que não existem remédios nem sequer um nebulizador, o que foi decisivo para a morte da criança, a qual vai se somar ao grande número de óbitos registrados desde o ano passado, quando 221 bebês morreram no Estado, sem que ninguém se escandalizasse até agora com o que parece ser um genocídio em curso.

Nenhuma autoridade está livre das responsabilidades diante dos fatos que se apresentam, especialmente as dos órgãos de controle e fiscalizadores, pois a região do Baixo Rio Branco é um clássico caso de que, em Roraima, tudo regride de acordo com as conveniências dos políticos que adotam a estratégia do “quanto pior, melhor” a fim de manter seus votos de cabrestos a cada eleição.

Na década de 1990, no primeiro governo de Neudo Campos, foi implantada a Unidade Hospitalar Fluvial Garça do Rio Branco, que realizava atendimentos nas comunidades ribeirinhas, com consultas ambulatoriais, serviço de odontologia e até disponibilidade de centro cirúrgico. Mas os anos foram se passando e o governo simplesmente desativou o serviço, com as autoridades permitindo desavergonhadamente que o barco fosse sucateado.

Em 2006, o Governo do Estado implantou o serviço de ambulanchas, que eram ambulâncias que faziam o papel de ambulâncias fluviais, as quais transportavam pacientes até Caracaraí. Havia também um avião disponibilizado pelo então governo Ottomar Pinto (já falecido), cuja aeronave ficava à disposição da Saúde para remover pacientes graves de locais remotos, como áreas indígenas e o Baixo Rio Branco. Mas tudo isso foi destruído, diante da imobilidade de todas as autoridades.

O atual governo se finge de morto, somando-se ao descaso da Prefeitura de Caracaraí, distante de proporcionar qualidade de serviço inclusive na Capital, onde as crianças estão morrendo em uma maternidade debaixo de tendas. Se é assim onde estão os hospitais de referências, aos olhos de todos, dos fiscalizadores e da imprensa, é de se imaginar a situação da Saúde e Educação nas mais longínquas localidades no interior do Estado.

A morte da criança Evilyn Vitória, neste fim de semana, em Caicubi, precisa chegar ao nível não apenas de indignar as autoridades, mas de que sejam apuradas e apontadas as responsabilidades. Uma situação de extrema gravidade que não pode ficar por isso mesmo, como uma indignação de rede social e um artigo de jornal.  

P.S.: Em tempo: a Educação sofre com o descaso também em Caicubi, onde só existe uma escola municipal que sequer enviou os materiais básicos para que os professores dessem início ao ano letivo. O Estado não tem escola naquela localidade, onde os pais precisam enviar seus filhos para outras localidades se quiserem continuar com o Ensino Médio. Quem não tem condições ficam sem estudar. Simples assim.

*Colunista