O caos no trânsito boa-vistense e o enterro definitivo da faixa de pedestre
Jessé Souza*
As faixas de pedestres podem ser incluídas naquela expressão conhecida de todos de que Roraima é o Estado do “já teve”. Houve um tempo em que a Capital roraimense era reconhecido no país por sua urbanidade no trânsito a partir da faixa de pedestre. Quando a pessoa se aproximava da faixa, os condutores já reduziam a velocidade para esperar o chamado “sinal de vida”, que era o aceno com mão, feito pelo pedestre, pedindo passagem.
Uma cena que ficou no passado do “já teve”, inclusive a Prefeitura de Boa Vista nunca mais cuidou das faixas de pedestres, apagadas pela falta de manutenção e pelo desprezo por parte das autoridades de trânsito. Nem o prefeito Arthur Henrique, que gosta de fazer vídeos para suas redes sociais, se atreveria a gravar uma cena pedindo passagem mediante uma faixa de pedestre em qualquer avenida movimentada. Primeiro, que ele não conseguiria encontrar uma em perfeitas condições de ser mostrada positivamente em um institucional.
A campanha da humanização da faixa de pedestre em Boa Vista, há quase duas décadas, foi o marco da luta contra a guerrilha que se formou no trânsito boa-vistense, idealizada pelo especialista em trânsito e ex-diretor do Departamento de Trânsito (Detran) do Distrito Federal, Luiz Miúra, falecido no ano de 2020. Em 1997, Miúra havia conseguido o feito de sensibilizar o poder público, em Brasília, e conquistar o apoio da mídia brasiliense em favor do respeito à faixa de pedestre, resultando numa grande mobilização de cidadania e da relação do motorista com o pedestre.
Chamado para implantar uma campanha similar em Boa Vista, conseguiu repetir o feito, sensibilizando a sociedade a ser não apenas partícipe da cidadania no trânsito, mas de tornar o pedestre como centro do respeito à legislação e à vida no trânsito. E tudo isso se perdeu ao longo dos anos e está sendo definitivamente enterrado na atual gestão, que sequer consegue instalar semáforos nos cruzamentos mais movimentados na área central, muito menos nos bairros populosos mais afastados do Centro.
É fato que os condutores têm culpa no que ocorre irresponsavelmente nas ruas e avenidas da Capital, conforme assinalou uma leitora. Mas é fato que as autoridades lavaram as mãos, a ponto de não se vê mais sequer uma campanha educativa de peso que possa sensibilizar a população. E o fim do respeito à faixa de pedestre é um desses exemplos, cujo desprezo começa pelas principais autoridades, dos vereadores, que nem ligam mais para a realidade do trânsito, ao prefeito, que finge que nada de problema é com ele.
Se as autoridades não se empenham e não dão o exemplo, é óbvio que a sociedade também agirá sem qualquer responsabilidade, não se sentindo culpada, já que quem deveria começar a agir nada faz. Pelo período que Miúra passou em Boa Vista, indo às redações de jornais, conversando com autoridades e dialogando com a sociedade organizada, ele provou ser capaz de humanizar o trânsito com iniciativas simples. Mas, atualmente, nossas autoridades acham que dialogar com as pessoas é fazer vídeo para as redes sociais.
*Colunista
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