Passados seis anos após a retirada de agricultores da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, que foram assentados em outra região, parte destes agricultores ainda não teve sua definição jurídica da posse da terra resolvida. Dois desses desintrusados da área indígena procuraram a Folha para denunciar que, sem os documentos da terra, ficam impedidos de conseguir melhorias através de empréstimos bancários e outras ações.
O agricultor Ailton Cabral disse que criava gado, porco e galinha numa área de mais de três mil hectares quando foi obrigado a sair da terra com a questão da Raposa Serra do Sol, mediante a promessa de ser assentado em outro local pela Justiça Federal. Ele foi assentado numa área de 497 hectares e reclama que ainda não recebeu os documentos. “Até agora não temos nenhum documento que diga que a terra é nossa. Mas, quando fomos retirados, tivemos a garantia da Justiça Federal de que seríamos indenizados e assentados em outra terra para continuar nossas atividades”, disse.
Ele e mais 18 famílias foram assentados no Projeto de Assentamento (PA) Nova Amazônia, na região do Truaru – antigas fazendas Bamerindus e Alagadiço, zona rural de Boa Vista pela BR-174 norte -, mas aguardam a finalização do processo de transferência. “A questão é que não se sabe onde começam e nem onde terminam as terras de cada um. Queremos saber nossa demarcação e a entrega do documento legal que nos garantam ser donos da terra”, frisou.
Segundo Cabral, os produtores já procuraram o Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) por diversas vezes, mas nunca foi apresentada uma solução. “O Incra só apresenta desculpas que ‘vai amanhã’, que ‘resolve depois’, que ‘não tem recursos agora’. Chegou a fazer um acordo com o Ministério Púbico Federal para resolver essa situação até dia 30 de dezembro do ano passado. Depois prorrogou esse prazo três vezes e, passado o prazo, disse que não tem mais responsabilidade para resolver o caso, afirmando que o problema era do programa Terra Legal. Mas quem assinou todos os documentos, se comprometendo com o desembargador da 1ª Região da Justiça Federal, sobre a demarcação dessa área para assentar estas 19 famílias, foi o Incra”, frisou.
Ele ressaltou que falta fazer o georreferenciamento da área para delimitar as propriedades de cada agricultor e poder emitir o documento legal da posse. “Existe lote que tem dois proprietários ocupando a mesma área e temos que ter essa definição para poder ter acesso a créditos bancários e a outros benefícios, como adquirir produtos da Conab [Companhia Nacional de Abastecimento].
Sem o documento de posse definitiva, não conseguimos nem fazer o cadastro na Conab”, frisou.
OUTRO CASO – O produtor Raimundo Curica disse que passou 54 anos da sua vida numa propriedade na Raposa Serra do Sol e que, depois de ser retirado, sofre até hoje com a situação. Ele resumiu sua vida a um presidiário na propriedade. “Estamos presos naquele lugar, pois estamos lá e não somos donos, não temos documentos nenhum que prove nada e sequer podemos tirar licença ambiental para produzir. Sem o título definitivo, não podemos realizar a contratação de nenhum financiamento bancário para auxiliar no custeio das atividades agrícolas e pecuárias”, frisou.
Ele lembrou que, quando foram assentados, houve a promessa de que a documentação dos lotes seria feita através do programa Terra Legal, o que ainda não ocorreu. “Já se tem até especulação de que a demarcação será pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário”, disse.
TERRA LEGAL – A Folha conversou com o coordenador do Programa Terra Legal em Roraima, Ildo De Rocco. Ele informou que no final do mês passado a Superintendência, em Brasília, assinou contrato de ordem de serviço com uma empresa de Rondônia para fazer o georreferenciamento das áreas em questão.
“Estamos aguardando a chegada dos técnicos dessa empresa para iniciar os trabalhos de georreferenciamento destas terras. Temos um prazo até fevereiro para encerrar os trabalhos e logo depois começar a emitir os títulos definitivos”, frisou.
INCRA – A Folha tentou contato telefônico com o superintendente do Incra em Roraima, Kelton Lopes, mas as ligações não foram atendidas. (R.R)