Uma operação para abafar pobres enquanto a elite se diverte do outro lado
Jessé Souza*
Qualquer ação governamental para combater a violência e a criminalidade é louvável nesse momento crítico em que a população voltou a ficar sobressaltada. No entanto, a Operação Saturitas, colocada em prática no fim de semana, na Capital, que visa intensificar o policiamento ostensivo e abordagens em bairros apontados como estratégicos, soa como um filme que já vimos antes, em seguidos governos, quando as autoridades perderam o controle da situação.
No “vale a pena ver de novo”, está guardado na memória que logo todos irão abandonar a estratégia, pois tais ações servem mais para justificar que o poder público está fazendo algo, criando uma sensação de segurança, do que uma política efetiva de ocupação dos espaços dominados ou infestados pelos criminosos. Foi sempre assim ao longo dos anos, a ponto de a apatia das autoridades e o descaso com a segurança pública permitirem que o crime realmente se organizasse.
No final, tudo dá errado nesses tipos de operação porque as abordagens passam a ser feitas em cidadãos pobres se divertindo nos bairros mais pobres do que uma represália aos criminosos, ação esta que não ocorre nos bairros centrais, onde a elite se diverte e onde os filhos dos ricos não podem ser abordados. Já vimos vereador gritando com policiais durante abordagens em que sequer há uma prisão por desacato. Vá um pobre lascado fazer isso…
O combate à criminalidade vai muito além disso, a começar pela atuação de um serviço de inteligência integrado que possa mexer na estrutura do crime organizado, a partir das fronteiras com os países vizinhos até chegar naqueles que realmente financiam o tráfico de drogas e de armas nas cidades. Inclui também um trabalho de prevenção às drogas e programas de reabilitação de dependentes químicos, além de outras ações, o que não é o tema principal desse artigo.
Se não houver uma política multi-institucional, essas operações-abafa servirão como um remendo, que muito provavelmente não irão prosperar muito, pois os criminosos estão organizados e sabem muito bem como agir, deixando a população mais pobre mais segredada ainda, provavelmente sujeita a uns pescoções àqueles mais afoitos que ousam questionar os excessos policiais, os quais são contumazes em bairros mais afastados das áreas centrais.
Além disso, conforme foi comentado na Coluna de ontem, a política partidária segue o mesmo enredo de falta de esperança de que algo possa mudar, em que os poderosos lá em cima são os primeiros a derem mal exemplo, enquanto ficam bem protegidos por policiais cedidos como seguranças particulares, os quais deveriam estar sendo utilizados em uma política de segurança pública efetiva, em que as ações de policiamento ostensivo e de abafa aos criminosos fossem realizadas todos os dias, e não em data, hora e local marcados, como se os criminosos tivessem momento e local certos para agir.
Porque enquanto pobre é encostado na parede, levando chute nas pernas, pescoções e com a entrada e saída dos seus bairros bloqueadas, os criminosos que bancam a criminalidade estão do outro lado da cidade, bem longe dali, se divertindo com a mesma elite que jamais será incomodada pelas operações nos fins de semana. Nem os agentes de trânsito se dão ao trabalho de fiscalizar as principais avenidas onde eles executam alta velocidade em seus carrões e motos de alta cilindrada, tirando sarro da cara da sociedade.
*Colunista