“A leitura é uma fonte inesgotável de prazer”. A célebre frase do poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade, considerado o mais influente escritor brasileiro do século XX, não tem surtido mais tanto efeito entre os leitores dos dias atuais. O hábito da leitura tem se tornado cada vez mais seletivo.
Exemplo disso pode ser percebido na quantidade, cada vez mais escassa, de bancas de revistas e de livrarias em Boa Vista. Antes consideradas uns dos principais pontos de encontro entre pessoas de todas as idades, sedentas por conhecimento, os locais atualmente tentam resistir à migração de leitores para a internet.
A popularização do mundo virtual, onde aplicativos criados para computadores, tablets e smartphones permitem a leitura de uma infinidade de livros, fez com que os pontos fixos de bancas e livrarias na Capital se tornassem cada vez mais raros. Uma das poucas bancas, que está entre as mais tradicionais, localizada na esquina da Avenida Jaime Brasil, no Centro Histórico da Capital, é um dos retratos dessa nova realidade.
O proprietário da banca, professor Pierre Teixeira, disse que o local, que se mantém desde 1978, vem sendo passado de geração para geração. “É uma banca de família, que sempre passou de geração até chegar a mim. Trabalhava como professor, mas depois que adquiri a banca, decidi me dedicar mais a ela”, disse.
A escolha em manter as atividades do espaço, mesmo diante do atual cenário, foi movida pela paixão de ler. “Sou envolvido diretamente com a leitura. Se eu fosse depender exclusivamente da banca para manter a família, eu já teria fechado ou mudado para outra atividade”, afirmou.
O empresário, que reluta para não vender produtos que não tenham a ver com livros, jornais e revistas, comentou que os altos custos de manutenção dificultam o negócio. “Se formos envolver os custos para manter, hoje não vale à pena. Tem impostos para a prefeitura e tarifa de luz que é extremamente cara. Fora isso, os preços das revistas são tabelados, então não posso vender com valor acima do estipulado pelas editoras”, relatou.
Para ele, o preço dos livros tem sido o principal vilão e responsável pelo sumiço de clientes das bancas. “Tem aquela coisa no Brasil de que o povo não gosta de ler, mas o que acontece é que os livros e revistas são caros. Quem recebe um salário mínimo não tem condição de comprar. As pessoas gostam de ler, mas os preços são muitos altos para a leitura”, frisou.
Mesmo diante de todas as dificuldades, Pierre Teixeira observou que possui clientes fiéis e cada vez mais apaixonados pela leitura. “Tem gente que gosta de histórias em quadrinhos, que tem se tornado um mercado bem forte, além dos gibis, que são de faixa infantil”.
LIVRARIA – Dono de uma das livrarias mais tradicionais de Boa Vista, o empresário Jaime Ribas, que possui mais de 15 mil livros em seu acervo, destacou que a variedade pode atrair o leitor, que sempre tem opções de escolha. “Tem criança a partir de 7 anos que vem à minha livraria, assim como pessoas mais velhas. Vendo de tudo, de gibis à best sellers, e essa infinidade de opções deixa o leitor mais sedento”, frisou.
Estudante de 16 anos se diz viciado em livros sobre séries
Dados de uma pesquisa intitulada “Retrato da Leitura no Brasil”, divulgados recentemente pelo Instituto Pró-livro, revelam que houve redução da leitura medida entre crianças e adolescentes, que leem por dever escolar. Em 2014, crianças com idades entre 5 e 10 anos leram 5,4 livros, antes 6,9 registrados no levantamento de 2013. O mesmo ocorreu entre os pré-adolescentes de 11 a 13 anos (6,9 ante 8,5) e entre adolescente de 14 a 17 (5,9 ante 6,6 livros).
A obrigatoriedade da leitura na escola, entretanto, fez com que o estudante Adrian Rairo, de 16 anos, tomasse gosto pelos livros. “Aos 13 anos, tive que fazer um projeto na escola, quando a professora pediu para que lêssemos um livro. Depois disso, comecei a ler e me apaixonei”, lembrou.
Hoje, Adrian costuma ler todo tipo de livro, mas revelou ser viciado em histórias sobre séries. “Gosto principalmente de histórias bem heroicas, como Harry Potter, As Crônicas de Nárnia, entre outras”, disse.
Quando não tem condições de comprar um livro, o estudante baixa os volumes pela internet. “Fica bem mais fácil de ler hoje em dia, mas ainda assim prefiro o sentimento de folhear cada página. A possibilidade de entrar num mundo totalmente novo é o que me fez gostar de ler”, destacou.
INCENTIVO – Para o escritor roraimense Walber Aguiar, que também é conselheiro estadual de cultura e integrante da Academia Roraimense de Letras (ARL), o hábito da leitura deve ser incentivado desde criança pelos pais. “A leitura tem que ser, desde o começo, incentivada para que tenhamos uma sociedade mais articulada, com pessoas de maior conhecimento para saber conversar, escrever um texto ou uma redação. Eu aprendi a ler com 4 anos de idade e, desde então, nunca mais parei. Quem não lê, não escreve”, afirmou.
A vantagem em ser um leitor assíduo, segundo ele, garante o poder de influência sobre muitas coisas. “Você conversa com qualquer pessoa, do mais rico ao mais pobre, sabendo como se articular. A leitura tem o poder de influenciar. O ideal, para quem está começando, é ler pelo menos seis livros por ano”, disse. (L.G.C)