O tráfico de animais domésticos na fronteira do Brasil com a Venezuela, ao Norte de Roraima, tem se intensificado nos últimos meses. Na semana passada, policiais militares do destacamento de Pacaraima, município a 220 quilômetros da Capital pela BR-174, apreenderam 13 cães de raças variadas. Os traficantes compram os animais no país vizinho e revendem-nos em Boa Vista a donos de canis e criadores, cobrando até 10 vezes mais caro que o valor pago no país vizinho.
A Folha foi à Venezuela, no fim de semana, e constatou o fato. É comum ver venezuelanos vendendo os animais à beira da estrada de Santa Elena de Uairén, primeira cidade venezuelana, que faz fronteira com Pacaraima. Os animais mais traficados são cães e gatos, mas há também quem compre passarinhos.
Na tarde do sábado passado, dia 30, uma venezuelana oferecia dois cães da raça Poodle, cada um a R$ 40,00. Este mesmo cão, em Boa Vista, segundo a traficante, é revendido até por R$ 200,00. O Pit Bull é outra raça bem requisitada. Em Santa Elena, ele custa de R$ 80,00 a R$ 100,00, mas na capital roraimense há quem pague até R$ 600,00 pelo filhote.
Na última apreensão na fronteira, na noite de domingo, policiais militares detiveram um homem com nove cães de raças variadas, entre elas o Pit Bull. Os filhotes estavam sendo traficados da Venezuela dentro de um carro particular. O suspeito de tráfico de animais domésticos foi encaminhado à Polícia Federal.
Os cães passaram por avaliação de um veterinário da Agência de Defesa Agropecuária de Roraima (Aderr) e, no dia seguinte, foram encaminhados ao posto de fiscalização do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), na sede de Pacaraima. Mas, como não havia local adequado no posto do Mapa, os filhotes foram devolvidos à PM e hoje estão sob os cuidados de policiais militares com especialização em Canil.
Um servidor federal do Mapa, que preferiu não se identificar, adiantou à equipe de reportagem da Folha, na fronteira, que, após a quarentena, os cães serão doados à PM, que possui canil e policiais capacitados para cuidar dos filhotes.
O homem detido pelos policiais militares pode pegar de dois a seis anos de prisão, como prevê a lei, que considera traficante aquele que importar, exportar, vender, expor à venda e manter em depósito, trazer ou guardar animais sem autorização legal. Caso o objetivo seja a obtenção de lucro, como ocorre na fronteira Norte de Roraima, a pena será ampliada de um sexto a um terço do tempo de prisão. (AJ)
Animais não podem entrar sem certificado sanitário
Comprar animais de outros países sem os devidos cuidados representa um grande risco à saúde pública. O Decreto 24.548/34, do Regulamento do Serviço de Defesa Sanitária Animal, em seu artigo 1º, fala em preservar o país de invasão de zoonoses exóticas e combater as moléstias infecto-contagiosas e parasitárias existentes no seu território.
O Artigo 4º do mesmo decreto impõe as condições essenciais para a entrada no país de animais procedentes do estrangeiro. É preciso apresentar certificado sanitário de origem, firmado por veterinário oficial, o que não ocorre no tráfico dos animais venezuelanos. (AJ)
Dono de canil detalha como funciona esquema na fronteira
A Folha entrevistou, ontem, o dono de um canil na Capital. O adestrador confirmou a denúncia e disse que o tráfico de cães da Venezuela vem aumentando em Roraima. Ele deu detalhes de como funciona o mercado negro de animais domésticos.
“Geralmente, os traficantes saem daqui já com a quantidade certa dos animais e raças que devem trazer. O mercado funciona mais por encomenda. Conheço alguns donos de canil que compram cães venezuelanos a preços baixos e depois vendem os filhotes desses animais cobrando caro”, disse.
O adestrador também confirmou que os animais que cruzam a fronteira não têm certificado sanitário de origem firmado por veterinário oficial. “Isso é um risco para nós, que trabalhamos no ramo como manda a lei.
Daqui a pouco, surgem zoonoses por aqui e as autoridades públicas ficam sem saber o que dizer. É preciso fiscalizar a entrada desses animais”, cobrou.
O tráfico de animais domésticos da Venezuela para o Brasil aumenta porque o lucro é certo. Donos de canis e outros criadores geralmente compram casais, que mais tarde vão cruzar e os filhotes serão postos à venda. “Um casal de Pit Bull, por exemplo, sai, aqui, a R$ 800,00, ou até R$ 1 mil. O cara compra um casal e a cadela vai parir de quatro a cinco filhotes. Cada um é vendido de R$ 400,00 a R$ 600,00. E uma cadela pode parir cinco ou seis vezes”, observou
Os cães mais traficados atualmente na fronteira do Brasil com a Venezuela são os da raça Poodle e Pit Bull. A primeira, oriunda da França, é considerada a segunda raça mais inteligente do mundo, perdendo apenas para o Border Collie, criado na Grã-Bretanha para ser de pastoreio.
Já o Pit Bull, raça canina de origem norte-americana, foi criado para o combate. É um cão com físico avantajado e nasceu fruto do cruzamento direto entre os antigos Bulldog e Terriers ingleses. É um animal de temperamento agressivo e sua mordida estraçalha ossos. (AJ)
Mapa alerta para risco de zoonoses
O fiscal federal agropecuário Anastácio Levimar, do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), recomendou aos roraimenses que não comprem esses animais venezuelanos sem o atestado sanitário. Isso, segundo ele, representa um risco à saúde pública. “Esses animais sem atestado não devem ser introduzidos no País porque podem trazer zoonoses que aqui não temos. Quem trafica animais põe a saúde em risco e ainda pode ser preso por tráfico e maus-tratos”, avisou.
Sobre os cães apreendidos em Pacaraima, Levimar confirmou que eles estão em quarentena no quartel da PM, que está como fiel depositária. Após os 40 dias, o veterinário deverá dar o atestado dos animais, já vacinados e vermifugados, ficando assim livres de qualquer doença. Caso contrário, o Mapa pode vir a sacrificar os filhotes. Os animais não podem ser doados a pessoas físicas, só para instituições, como a PM ou Ongs de proteção animal.
PMBV – Sobre a fiscalização da Vigilância Sanitária Municipal em canis de Boa Vista, a Folha mandou e-mail, no começo da tarde de ontem, à Secretaria de Comunicação Social da Prefeitura de Boa Vista (PMBV), mas não houve resposta até o encerramento desta matéria, às 17h30. (AJ)