Moradores de diversos bairros de Boa Vista estão preocupados com as seguidas mortes de cães e gatos, que vêm ocorrendo após os casos de raiva humana, que vitimou um adolescente de 14 anos, e de toxoplasmose, que foi diagnosticado em uma criança de 8 anos. A suspeita é que os animais estão sendo mortos por envenenamento.
A Folha recebeu, na manhã de ontem, a denúncia de que vários gatos foram encontrados mortos no bairro Aparecida, zona Norte da Capital. Os casos também estariam ocorrendo nos bairros Asa Branca e Jardim Floresta, na zona Oeste. Conforme a denunciante, ao invés de vacinarem os bichos, moradores estariam dando veneno aos animais por medo de serem infectados por doenças.
Conforme a denunciante, que não quis se identificar, além de envenenarem, pessoas estariam atropelando os animais de forma proposital. “Uma moto passou por cima do meu gato propositalmente. Ele perdeu uma das presas, quebrou a mandíbula em duas partes e ficou com problemas respiratórios. Foi horrível”, disse.
Ela relatou que, no bairro onde reside, encontrou três gatos mortos somente esta semana. “Na minha vizinhança morreram três gatos. As pessoas que têm os animais vacinam, mas os de rua acham que são doentes e fazem isso. Essa semana vi uma mulher pegar um gato vivo e colocar dentro de uma sacola para que ele morresse”, denunciou.
Ela relatou que, no bairro Asa Branca, o gato de uma amiga também morreu envenenado. “Depois que o menino morreu de raiva humana, ela falou que começaram a aparecer vários gatos e cachorros envenenados no bairro. Essa semana, ela chegou e viu o gato dela passando mal e morrer na frente dela. O que me entristece é que as pessoas têm preguiça de ir ao Centro de Zoonoses para vacinar e preferem matar”, lamentou.
Conforme a denunciante, os casos estariam ocorrendo por falta de conhecimento da população acerca das doenças. “As pessoas só olham o título da notícia e a foto dos animais e já acham que eles transmitem a doença”, frisou.
Se vacinados, risco de animais transmitirem doenças é mínimo, afirma médico veterinário
A Folha ouviu o médico veterinário Maurício Costa, que afirmou ter atendido casos de animais intoxicados. “Nós pegamos casos de animais intoxicados, mas de uma infinidade grande, nada constatado com relação a envenenamento. Há comentários de clientes e colegas sobre o aumento dessa situação, mas normalmente, quando isso acontece, o óbito é iminente”, disse.
Conforme ele, o aumento do índice de animais intoxicados tem gerado questionamentos entre os profissionais. “Entre colegas de profissão, conversamos com relação a isso e foi notado. Uma das pautas que tivemos quando conversamos é que, após a raiva humana, isso aumentaria”, comentou.
Para o especialista, a população acabou se assustando após a confirmação do primeiro caso de raiva humana em Roraima. “Tem gente que acaba sendo ignorante no sentido literal e, por falta de conhecimento, acaba achando que para resolver o problema tem que matar os animais. É uma questão de conscientização, a gente espera que o poder público tome as devidas providências”, declarou.
De acordo com o médico veterinário, se vacinados, o risco de animais transmitirem doenças é mínimo. “Risco tem, mas é muito reduzido. Acredito que a vacina dê de 98% a 99% de precisão contra a raiva. E o ideal é que se vacine o animal, porque uma vez contraído, não se tem cura, tem que trabalhar com prevenção e não com tratamento”.
Ele destacou o trabalho feito pelas Organizações Não Governamentais (ONGs) que fazem o trabalho de recolhimento desses animais das ruas. “Sou de Manaus e, quando cheguei a Boa Vista, achei muito bonito as pessoas que criam a consciência de pegar esses animais e os levam para clínicas para serem cuidados e doados. Tem o lado negativo, como os casos de animais que são maltratados, mas acho que tudo parte da conscientização”, ressaltou.
O médico reforçou a importância da vacinação dos animais para a prevenção de doenças. “Independente se for numa clínica veterinária ou no Centro de Zoonoses, vacine. Sabemos que, depois do caso de raiva humana, que foi uma fatalidade, a procura no Centro de Zoonoses aumentou. A unidade sempre esteve lá e não custa nada levar o animal para vacinar”, frisou.
Para tratamento, tentativas de recuperação e alívio dos sintomas, pode ser necessária a realização de alguns procedimentos pelo médico veterinário, como: lavagens gástricas, uso de carvão ativado, que auxilia na eliminação do veneno no trato digestivo, aplicação de antídotos e demais procedimentos relacionados. Cães e gatos que sobrevivem às intoxicações correm o risco de ficar com sequelas, dependendo da substância ingerida: tiques nervosos e convulsões esporádicas podem ser consequências da ingestão de raticidas.
Animais não devem ser sacrificados sem comprovação de doença, alerta Prefeitura
Em nota, a Prefeitura de Boa Vista informou que já está planejando uma nova ação de vacinação nos bairros com menor índice de adesão à campanha antirrábica ou que não foram contemplados, para reforçar a vacinação de cães e gatos.
“Os animais não devem ser sacrificados sem uma comprovação de que estão realmente doentes e que apresentam perigo à saúde da população. Os casos de maus tratos devem ser denunciados aos órgãos de defesa”, frisou.
A Prefeitura lembrou que, diferente da raiva, a toxoplasmose é uma doença transmitida através de oocistos encontrados na areia, em latas de lixo contaminado com fezes de gatos infectados; ingestão de carne crua e mal cozida infectada com oocistos e infecção congênita, ocorrendo em 40% dos fetos de mães que adquiriam a infecção durante a gravidez. (L.G.C)