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Sua história de amor na Folha

Conheça a história de amor e persistência que uniu o biólogo e escritor Ricardo Dantas e a indígena Yara Macuxi

O INÍCIO
Em dezembro de 2010, fui contratado pelo PREVFOGO/IBAMA para ser Gerente Estadual de uma brigada de combate a incêndios, composta por indígenas, na Aldeia Boca da Mata, Pacaraima. Seria minha primeira experiência em trabalhar com os povos indígenas, e muito pertinente na época, pois estava necessitando de uma inspiração do contexto indígena para finalizar o argumento do meu primeiro romance, “Meia Pata”.
O convívio foi harmonioso desde o início, e tive muito apoio das lideranças, inclusive da Tuxaua da comunidade, Dona Leoneide Torres, que gostou da proposta do meu romance, do gênero regionalismo indianismo, e passou a relatar os costumes, tradições, lendas e a história do povo Macuxi. Destes encontros frequentes, pude enfim compor a estrutura do argumento indígena no romance. Mas faltava a inspiração maior! Não conseguia criar a imagem e personalidade da personagem indígena do romance. Possuía todos os elementos, porém, sem a inspiração maior não alcançava o objetivo.

INSPIRAÇÃO
A filha da Tuxaua, que estava passeando na casa de uma irmã que morava em Boa Vista, retornou para a comunidade. Não imaginei que existisse tamanha beleza no mundo! Uma beleza exótica, natural. Uma beleza angelical! Imediatamente a inspiração para a personagem do romance fora descoberta. As páginas fluíam com veemência, e cada vez mais, incorporava os escritos. No entanto, acabei me apaixonando pela bela indígena. Mas sabia ser apenas uma paixão platônica, afinal, ela possuía dezesseis anos, e meu contrato com o IBAMA era provisório e terminaria em poucos meses.
Porém, cada vez que eu a via, o amor nascia no meu coração. Os dias passaram a ser de tormenta. Não podia me deixar ser envolvido em um sentimento que não existia possibilidade alguma de se tornar realidade. Um dilema invadia meu ser: Que decisão tomar? Que futuro teria um relacionamento que estava fadado a não vingar? Considerando o fato de que, por não ser índio, após meu contrato finalizar, teria que deixar a aldeia. Seria mais fácil resistir ao sentimento, e após minha ida, tudo voltaria ao normal? E se decidisse me declarar? Como seria minha vida? Pois assumir um relacionamento com a indígena, nas configurações que se apresentavam, seria algo completamente diferente do que havia vivenciado.

COMPROMISSO
Enfim, tomei a decisão, declarei-me para a bela Macuxi, e fui correspondido. Agora teria que partir para a próxima etapa, pedir à Tuxaua a permissão para namorar sua filha. Uma reunião com toda a família fora marcada, e, após muito debate, foi permitido o namoro. Quando nos beijamos pela primeira vez, dei-me conta do que realmente estava acontecendo. Definitivamente ficara louco! De onde havia tirado que assumir tal compromisso era o certo a fazer? Mas não tinha como voltar atrás. As barreiras do futuro deveriam ser transpassadas.

ENTRAVES
Quando o namoro tornou-se público na comunidade, a reação fora intensa. As lideranças da aldeia passaram a monitorar meu comportamento a todo instante. Minha família considerou um ato de irresponsabilidade. Alguns amigos passaram a me tratar como um cafajeste. Surgiu a possibilidade inclusive de ser exonerado do meu contrato de trabalho. E um agente da FUNAI chegou a ameaçar me denunciar para a Polícia Federal.

NAMORO
Nada disso interferia em nosso relacionamento, e a cada dia, mais apaixonados ficávamos. Eu, que na época possuía trinta e um anos, passei a vivenciar um namoro completamente inimaginável. Havia voltado ao tempo de adolescente, indo visitar minha amada na cada dela, assistindo a televisão, e na despedida, um breve beijo na companhia dos irmãos mais novos e sobrinhos. Mas era tão mágico, tão lindo aqueles momentos, que nem vi o tempo passar. O contrato terminara e o novo Tuxaua avisou que deveria desocupar o quarto cedido pela comunidade durante o período de trabalho, e voltar para Boa Vista. Ao me despedir da família da minha amada, a grande surpresa! A Dona Leoneide não permitiu que eu fosse embora, e acabou me adotando como parte da família. Assim, ninguém poderia questionar a minha permanência na aldeia, e então passei a morar na casa da bela indígena. Moravam na casa dezenove membros da família, divididos em três núcleos familiares. Uma experiência única.

DESPEDIDA
Porém, não podia ficar desempregado, e após um mês vivendo com a família do meu amor, tive que ir para o Acre, assumir uma vaga de emprego.
No Acre, fui trabalhar no Seringal Chico Mendes, prestando consultoria ambiental no plano de Manejo Florestal dos seringueiros. Prometemos que iríamos continuar nosso relacionamento. Mas agora, a distância, o fato dela não ter idade suficiente para conquistar sua independência, o isolamento de contato, figuravam em um lento e torturante término de relacionamento. Jurávamos amor eterno, mas eu sabia que o sonho estava prestes a acabar. Passei a me concentrar em finalizar meu livro. A melancolia fazia parte do meu dia a dia. E quando conseguia contato com o meu amor, ela relatava que não estava sendo nada fácil a distância, as provocações de que ela havia sido enganada e abandonada, e principalmente a dor de não podermos estar juntos. Após três meses no Acre, havia finalizado o livro, realizado um ótimo trabalho e recebido uma proposta para trabalhar permanentemente no Estado.

REENCONTRO
Mais uma vez, de forma súbita, tomei a decisão mais improvável, que foi desistir de permanecer no Acre, e retornar para Roraima, para a Aldeia Boca da Mata, para perto do meu amor! E assim foi! Não sabia como seria dali para frente, sem emprego, sem perspectiva, apenas tinha certeza que tudo iria se arrumar, e que o importante seria viver para amar.
No início de 2012 passei no seletivo da educação e assinei um contrato para ser professor de biologia pelo Estado, e após muitas negociações, consegui transferir meu contrato para a Escola Estadual Indígena Tuxaua Antônio Horácio, na aldeia Boca da Mata. E assim casei-me com Yara Macuxi, vivendo dois anos e meio na aldeia.

FINAL FELIZ
Recentemente completamos cinco anos de relacionamento. Minha amada é acadêmica de Antropologia na UFRR, eu sou servidor público do IFRR e meu romance “Meia Pata” foi publicado e é referência do vestibular da UFRR 2017, sendo a personagem Iara Parente inspirada na minha esposa. E temos a plena convicção de que vale a pena sim lutar pelos objetivos, e que as barreiras e adversidades da vida não significam nada diante do maior sentimento do mundo, que é o amor!