Polícia

Jovem morre dias após acidente e família denuncia negligência

A mãe do paciente entrou na UTI, onde ele estava internado, e flagrou o filho coberto por moscas

Na noite da última quarta-feira, 17, o militar do exército Antônio Wallyson Cuimar Barboza, de 21 anos, morreu no Hospital Geral de Roraima (HGR) após passar quatro dias internado na unidade de saúde. O jovem estava na companhia de um amigo na madruga do último domingo, 14, quando decidiram ir a uma festa num bar localizado às margens da RR-205, que dá acesso ao município de Alto Alegre, quando sofrerem um acidente. O piloto da moto morreu pouco tempo depois do acidente, ambos foram socorridos pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e levados ao Pronto Socorro Francisco Elesbão.

Familiares denunciaram à Folha que somente depois da décima parada cardíaca o jovem foi levado à Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Antes disso ficou em um leito do trauma. Para eles, a morte foi causada por uma série de fatores, incluindo negligência médica e falta de cuidados com o paciente, além de afirmarem que todos os medicamentos e utensílios, como cateter e gazes, foram comprados pelos familiares, alegando que o HGR não dispõe do material básico.

“O acidente aconteceu às 2h30 na entrada da Vila São Silvestre. Uma amiga que é técnica em enfermagem foi quem prestou os primeiros socorros e me ligou, porque até que a ambulância chegasse iria demorar. Quem morreu primeiro foi o Bruno, que teve uma parada cardíaca na hora, outra no caminho e quando chegou no hospital teve mais uma e não resistiu”, declarou a esposa da vítima.

A mãe da vítima disse que o responsável pela festa não pediu apoio policial, nem mesmo de uma equipe do Samu para ficar de prontidão desde o início do evento caso acontecesse qualquer eventualidade. “Quem fez a festa não solicitou Polícia, Conselho Tutelar e Samu porque é obrigação”, acrescentou.

Desde que o jovem deu entrada no hospital, os familiares informaram que ele estava consciente e conversava normalmente, mas na segunda-feira, dia 15, pela manhã, o quadro se agravou porque o coágulo de sangue não foi removido por meio de uma cirurgia, segundo a esposa.

“O quadro piorou de segunda para terça-feira porque no domingo eu passei o dia todo com ele. Eu conversava, limpei a ferida, porque o hospital não tinha material para limpar. Um amigo também auxiliou e fez a limpeza nos ferimentos com soro e gaze. Me diga qual é o hospital em que a família tem que limpar o paciente? É um ambiente desumano o HGR. No dia que ele deu entrada, a gente já começou a comprar os remédios, fraldas. Tudo a gente, porque lá não tem nada”, destacou.

Conforme os relatos dos familiares, o militar foi levado para fazer um exame de tomografia e, a partir daí, teve que ser entubado. “Falaram que entubaram porque o coágulo não podia aumentar, e se ele ficasse se movimentando, ia piorar, aí preferiram deixar ele imóvel até o coágulo diminuir. Levaram ele para um leito no trauma e não deixaram mais a gente ver meu filho, ao menos de longe”, ressaltou.

Sem conseguir ver e ter notícias do filho, a dona de casa disse que tomou uma atitude e entrou no local onde o filho estava internado, e, para a sua surpresa, teve a pior visão de sua vida. “Quando eu cheguei lá, meu filho estava completamente coberto por moscas. Foi uma sensação horrível! Senti vontade de gritar, vomitar. Foi quando chamamos a imprensa e eles mandaram fazer uma dedetização. Pior de tudo é que dedetizaram com as pessoas dentro do quarto. Nem tiraram os pacientes entubados. Eu sei porque testemunhei”, explicou.

As reclamações também foram direcionadas aos médicos que atendem na unidade. “Porque o cirurgião que iria fazer o procedimento nele [vítima] disse que não faria a cirurgia do meu marido, mas eu fui com esse médico e perguntei por quê. Eu queria uma explicação e não me disseram nada. De outras pessoas acidentadas, com coágulo na cabeça, fizeram a cirurgia, menos do meu marido”, ressaltou a esposa.

Segundo a família, somente na quarta-feira, 17, quando o óbito foi atestado pelo médico, tomaram conhecimento de que o paciente já tinha sofrido dez paradas cardíacas e por isso foi levado às pressas para um leito na UTI. “Não falaram nada para a gente. Só descobrimos depois que ele morreu. O médico que contou para a gente e está no documento [laudo]”, relataram.

De acordo com o laudo médico, a morte foi confirmada às 20h40 da quarta-feira e teve como causa uma parada cardiorrespiratória em consequência do traumatismo craniano. O corpo foi removido à sede do Instituto de Medicina Legal (IML) na mesma noite, onde passou por exame cadavérico e foi liberado aos familiares na manhã de ontem, 18. (J.B)

Sesau justifica reclamações feitas pela família do paciente

Em nota, a Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) esclareceu que o paciente Antônio Wallyson Cuimar Barboza foi admitido na unidade em estado grave e submetido a todos os procedimentos necessários de acordo com o caso. A direção da unidade lamenta a perda e se coloca à disposição dos familiares para prestar os esclarecimentos necessários, mas garante que foi feito tudo que estava ao alcance da equipe, até serem esgotadas as chances de salvar a vida do paciente, que é o objetivo principal da unidade.

Segundo informações da direção do Hospital Geral de Roraima (HGR), o referido paciente foi submetido a exames e avaliado pela equipe de neurocirurgia, a qual verificou que não havia indicação para procedimento cirúrgico.

O paciente foi recebido no Trauma e inicialmente não foi transferido para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) porque teve parada cardiorrespiratória, momento em que foi assistido pela equipe e submetido às manobras de reanimação, com êxito. Após isso, a transferência foi realizada conforme o fluxo normal da unidade.

Quanto à afirmação de que o paciente não teve os ferimentos limpos pela equipe de enfermagem, a direção esclarece que casos como este, de lesões gravíssimas em um importante segmento da coluna, não permitem que ocorra o banho no leito (já que este exige grande manipulação), porém a higienização superficial, que não traria risco ao paciente, foi devidamente realizada.

A direção da unidade esclareceu ainda que os pacientes não são obrigados a comprarem quaisquer materiais. O serviço dá a opção aos familiares para que estes, caso queiram, levem os materiais de higiene pessoal de sua preferência para uso exclusivo no paciente.  

Sobre a presença de insetos na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), a direção da unidade esclarece que mantém um cronograma de desinsetização na unidade como parte de um protocolo para assegurar a biossegurança dos pacientes.

“Lembramos que a direção da unidade está à disposição para prestar os esclarecimentos necessários, mas qualquer paciente que se sentir insatisfeito quanto ao atendimento pode registrar a reclamação na Ouvidoria do SUS, que pode ser acessada por telefone (95-2121-0590 ou 136/nacional), por e-mail ([email protected]) e ainda pessoalmente ou por carta endereçada à rua Madri, 180, Aeroporto, Boa Vista-RR, CEP 69.310.043. O órgão é responsável por apurar as demandas e dar um retorno à população, sob monitoramento do Ministério da Saúde”, informou. (J.B)