Após um ano de atuação de arqueólogos no Estado, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Roraima (Iphan/RR) registrou 151 sítios arqueológicos no Estado que já estão em processo de homologação em Brasília. Os 151 sítios correspondem a um aumento de 69% em relação aos 89 sítios registrados nacionalmente até o ano passado. Com o quantitativo de 89 locais, Roraima é o Estado com menor número de sítios do país, apesar disso, o arqueólogo do Iphan/RR, Pedro Gaspar, acredita que o numero de sítios é cinco vezes maior que os registrados.
Quando os arqueólogos Pedro Gaspar e Jaime Oliveira começaram a trabalhar no Iphan, no Estado, e se depararam com a quantidade, produziram um planejamento de fiscalização nas áreas registradas, uma vez que a superintendência tinha o quantitativo, mas só conhecia ou tinha informações detalhadas de apenas cinco, de acordo com os dados que estavam presentes na instituição.
Desde então os arqueólogos estão realizando incursões aos locais arqueológicos para verificar o estado de preservação, as ameaças e as informações que as próprias comunidades próximas têm a respeito dos locais, de como se identificam e quais as relações da sociedade com os sítios. Apenas com pesquisa a partir de levantamento de bibliografia na instituição e viagens de fiscalização houve o aumento de 89 para 151 sítios.
“Em toda viagem encontramos locais que não estavam catalogados, ou que não eram do nosso conhecimento e até os que não eram de conhecimento da população”, disse Gaspar, ao explicar o trabalho do arqueólogo, o que pesquisam e o que é patrimônio arqueológico. Os próprios moradores das comunidades indicam quais os demais sítios existentes na localidade.
O arqueólogo informou que qualquer cidadão que tenha na sua propriedade uma área que apresenta um vestígio que não pertence à civilização atual pode dar entrada no Iphan por ofício. O instituto faz uma complementação com a ficha do Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos (CNSA) que tem dados que precisam ser anotados, como localização, para então ser submetido à Brasília.
Segundo o arqueólogo Jaime Oliveira, Roraima tem um dos mais ricos patrimônios dentre os demais estados da Amazônia, principalmente voltado para as artes rupestres, em razão das formações de abrigos rochosos que criam condições para painéis de pinturas e gravuras. “Ficamos na expectativa que ao término do trabalho sejam encontrados novos locais. Nesse papel de conhecimento do Estado a população é de extrema importância”, frisou.
LOCAIS – Conforme os dados levantados pelo Iphan, a maioria das ocorrências está em locais em áreas rurais, como fazendas, mas também ocorrem em áreas urbanas. Em Boa Vista há sítios arqueológicos, principalmente nos bairros Paraviana, zona Norte, Caçari, zona Leste, Calungá, zona Sul e Cauamé, na zona Norte, pela presença de recursos hídricos nas suas proximidades.
Gaspar acrescentou que também há sítios que são característicos do lavrado, um bioma específico de Roraima, como os que pertencem às tradições cerâmicas da Amazônia, que são cerâmicas bem decoradas, os associados à terra preta indígena, em razão de aldeamentos que ocorrem com a longa atividade de ocupação humana formando um solo com sedimentação específica.
“Temos ainda os associados às grandes culturas da Amazônia central, próximos aos rios Negro e afluentes, Solimões e Tapajós, além do Baixo Rio Branco e Rio Jauaperi, no Sul do Estado de Roraima. A própria diversidade do Estado de ecossistemas corresponde à adaptabilidade humana, a cada bioma o ser humano vem se adaptando de forma diferente ao longo do tempo, isso implica em uma diversidade de patrimônio arqueológico”, ressaltou Gaspar.
CAPITAL – Em Boa Vista, existem quatro sítios arqueológicos cadastrados dentro do plano urbanístico da cidade. Um desses sítios está localizado no Iate Clube Boa Vista, no bairro Caçari, zona Leste, e o prédio da Antiga Ordem Missionária Consolata, no bairro Calungá, zona Sul. Os outros dois sítios são Roraima Garden I e Roraima Garden II, próximos ao Rio Cauamé, zona Norte.
O Iate Clube, às margens do Rio Branco, foi pesquisado pela primeira vez em 1989. Durante as construções foram encontrados recipientes cerâmicos com restos de ossos e colar de vidro. Já no sítio do Calungá, há um contexto de ocupações que antecede à própria colonização da região e a estrutura do prédio da Ordem dos Beneditinos, local onde se tinha um aldeamento indígena.
HISTÓRIA – A Superintendência do Iphan em Roraima existe desde 2009 e, desde 2013, estava sem arqueólogos no efetivo. Segundo Pedro Gaspar, Roraima é um Estado relativamente novo, o que não significa ter um patrimônio arqueológico incipiente. “Existe uma demanda reprimida no Estado no fator de pesquisa arqueológica e no conhecimento e catalogação dos sítios. Sabemos que índios e não índios têm contato com esses locais desde a colonização do Estado”, disse.
Áreas foram mapeadas na década de 1980
Os 89 sítios registrados nacionalmente foram descobertos em razão da pesquisa feita na década de 80, pelo Governo do Estado, junto ao arqueólogo gaúcho Pedro Augusto Ribeiro, que veio fazer um salvamento arqueológico no Estado devido à destruição feita pelo avanço da sociedade. Havia vários artefatos expostos na superfície, como material cerâmico e peças de interesse para colecionadores que estavam se perdendo. Além disso, precisavam-se gerar dados da ocupação humana antiga.
Após escavações na Pedra Pintada e levantamento de artes rupestres, foram gerados 51 sítios arqueológicos nas bacias dos rios Parimé, Uraricoera e Branco, entre 1985 a 1989, em razão de pesquisa nas bacias dos rios referente a sítios, aldeamentos, arte rupestre e gravuras. Em 2000 foi realizada uma pesquisa na linha de transmissão energética Brasil/Venezuela, Norte do Estado, quando foram encontrados mais 33 sítios.
O quantitativo foi aumentado em mais três sítios com a linha de transmissão Boa Vista/Manaus, Sul do Estado, que ainda está em processo de licenciamento. Na cidade, durante o processo de licença ambiental da construção do Roraima Garden Shopping, foi feito um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), onde foram encontrados mais dois sítios, resultando no quantitativo de 89 sítios.
Empresários devem fazer licenciamento ambiental antes de iniciar construções
Por meio da portaria interministerial número 60, o Iphan é o órgão do Ministério da Cultura que tem a missão de fiscalizar, tanto em âmbito municipal, estadual ou federal, o patrimônio arqueológico para que não seja impactado. O arqueólogo Pedro Gaspar relatou que, no mês passado, a lei que garante a proteção em nível nacional de um patrimônio completou 55 anos, conhecida como Lei 3.924/61.
“Todo tipo de empreendimento que vai impactar o solo ou modificar a paisagem deve fazer o licenciamento ambiental, a lei já descreve isso”, frisou. O arqueólogo disse que conseguiram avançar na pesquisa de sítios por meio de fiscalização, seja nas portarias ou publicações do diário oficial do estado e município, pesquisa de campo e empreendimentos que estão sendo licenciados e são possíveis impactadores de patrimônio.
Com as pesquisas de licenciamento ambiental, além de minimizar os impactos já comprovados que ocorrem no desenvolvimento, mais sítios podem ser gerados para cadastro. “Toda pesquisa de licenciamento costuma gerar um novo dado, uma ocorrência de ocupações humanas antigas. Percebemos que a arte rupestre é um símbolo mais reconhecido pela sociedade, a própria pedra pintada é um exemplo”, relatou. (A.G.G)