Política

Deputados criticam manobra para votar anistia a ‘caixa 2’

Após a tentativa de votação de uma proposta que na prática anistiava o “caixa 2” em campanha eleitoral, parlamentares da bancada roraimense criticaram a manobra e se comprometeram a não vão votar a favor desse projeto. Nos bastidores do Congresso, a informação é de que houve um acordo entre grandes partidos para que uma das dez medidas de combate à corrupção, propostas pelo Ministério Público Federal (MPF), fosse votada com uma emenda que alteraria o sentido da proposta.

O texto original sugere a criminalização do “caixa 2” de campanha. A ideia, porém, era aprovar uma emenda que eximisse de responsabilização criminal àqueles que cometeram a irregularidade até a data de sanção da lei. A proposta foi retirada da pauta pelo primeiro-secretário da Câmara, Beto Mansur (PRB-SP), após pressão dos deputados dos partidos menores que protestaram em plenário.

Os deputados ainda demonstram perplexidade, criticam a falta de transparência na inclusão do debate na pauta e cobram o texto do projeto que, segundo eles, continua sem paternidade assumida. Deputados lembraram que o acordo é que não teria mais sessões da Câmara em setembro, por causa das eleições, mas que foram surpreendidos com a convocação do Congresso e depois da Câmara, com a pauta.

Bombardeados nas redes sociais, deputados da bancada roraimense insistiam dizer não terem sido informados pelos seus líderes de que essa proposta estaria em debate ontem.

BANCADA – A Folha entrou em contato com os deputados integrantes da bancada de Roraima para falar sobre o assunto, mas os deputados Sheridan (PSDB), Maria Helena (PSB) e Hiran Gonçalves (PP) não responderam à demanda da equipe de reportagem.

Os outros parlamentares se posicionaram contra a situação. Confira o que os deputados falam sobre o projeto:

Jhonatan de Jesus – O representante do PRB disse que foi pego de surpresa quando soube da votação. “Não sabemos sequer qual é o texto até agora. Mas, se trouxer benefícios para quem está sendo investigado em crime, sou contra. Não participamos e não participaremos de qualquer acordo com objetivo de estabelecer anistia ou beneficiar pessoas envolvidas em algum tipo de irregularidade”, afirmou o deputado.

Abel Galinha – “O pai não assume porque é uma aberração. Não tem nem perigo de passar com meu voto”, resumiu o deputado Abel Galinha (DEM), que é candidato a prefeito de Boa Vista. “Sou totalmente contra qualquer prática que venha enganar o povo com desvio de dinheiro. Na hora que colocar para votar serei contra”.

Carlos Andrade – O deputado Carlos Andrade (PHS) explicou que os parlamentares foram enganados com a inclusão na pauta de votações uma matéria não prevista. Segundo ele, foi colocado substitutivo e não foi disponibilizado para os parlamentares que não tinham conhecimento do que seria votado. “Resumindo a questão. Nós todos refutamos e somos totalmente contra, pois se vira lei, automaticamente há uma anistia aos praticantes do ‘caixa 2’ anteriores à aprovação. Então, o que aconteceu é que a maioria dos parlamentares teve dificuldade para entender o que tinha acontecido. O que esclareço é que quando chegar novamente no plenário vamos refutar veementemente”.

Edio Lopes – Na mesma linha, o deputado Edio Lopes (PR) afirmou que a proposta incluída na pauta na noite anterior foi construída “debaixo dos panos”. “Por incrível que possa parecer, a grande maioria dos parlamentares não sabia que o texto seria apresentado. Quase todos foram pegos de surpresa e, mesmo sem ter visto o texto que iria ser apresentado, no mérito minha posição é contrária”, afirma. “Era uma questão inócua, mesmo porque a tipificação do crime de ‘caixa dois’ sempre foi entendido como corrupção e lavagem de dinheiro, cujas penas são muito mais severas. Prova disso é só ver o famoso mensalão, onde todos foram punidos por esses dois últimos delitos e nenhum pelo primeiro”.

Remídio Monai – O deputado Remídio Monai (PR) explicou que, ao menos oficialmente, o texto jamais fora materializado e não consta no sistema eletrônico da Casa, tampouco foi lido da tribuna ou entregue diretamente aos deputados. “Trata-se de matéria de inclusão recente na pauta de votações. Portanto, ainda não foi debatida, não havendo tendência apurada sobre o assunto. Sobretudo no que diz respeito ao posicionamento da bancada do Estado”,  disse,  acrescentando que não tem uma opinião sobre o assunto. “Não tenho opinião porque não foi debatido e o projeto saiu de pauta”.

Senador Telmário propõe criminalização de ‘caixa 2’

O adiamento da votação, pela Câmara dos Deputados, da proposta inspirada nas “10 Medidas contra a Corrupção”, sugeridas pelo Ministério Público Federal (MPF), motivou o senador Telmário Mota (PDT) a apresentar, na terça-feira, 20, projeto de lei com o mesmo teor (PLS 348/2016), criminalizando a prática de ‘caixa 2’ (doação de campanha não declarada à Justiça Eleitoral).

A matéria será avaliada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e, se não houver recurso para exame pelo Plenário, seguirá direto para a Câmara. Pela proposta, a manutenção, movimentação ou utilização de qualquer recurso que esteja à margem da contabilização eleitoral será punida com dois a cinco anos de reclusão.

O crime de caixa dois poderá alcançar candidatos, gestores e administradores dos comitês financeiros dos partidos políticos e das coligações. A pena será aumentada de um a dois terços se algum agente público ou político participar da prática.

A punição será mais dura – reclusão de quatro a dez anos, mais multa – no caso de ocultação ou dissimulação para fins eleitorais sobre a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes de infração penal, de fontes de recursos proibidas pela legislação eleitoral ou não contabilizadas legalmente.

Pelo texto, a própria utilização de bens, direitos e valores ilegais já será considerada crime de ocultação de caixa dois. Nesse caso, a pena será ampliada de um a dois terços se os crimes forem cometidos de forma reiterada. Segundo Telmário, as chamadas 10 Medidas contra a Corrupção tramitam de forma lenta na Câmara dos Deputados, “o que significa imenso desprezo pela vontade popular de moralização na política”. Ele pretende transformar cada uma das medidas em lei, a partir de projetos do Senado.

Ângela Portela critica manobra para anistiar ‘Caixa 2’ eleitoral
 
“Sou radicalmente contra a anistia aos investigados da Lava Jato que praticaram o crime de ‘caixa 2’. O que os partidos governistas tentaram, na Câmara dos Deputados foi uma manobra escandalosa, na calada da noite, com a inclusão do projeto que não estava na pauta”, disse a senadora Ângela Portela (PT).

“Já existem leis suficientes para punir casos de corrupção e de uso do Caixa 2 em eleições. Precisamos é que essas leis sejam aplicadas, com direito à plena defesa, mas com rigor e celeridade. É inaceitável a quantidade de processos parados na Justiça, envolvendo corruptos notórios, que conseguem dar sempre um jeito de adiar as decisões judiciais”, complementou.

Segundo ela, não há dúvida que isso foi feito com a concordância do Palácio do Planalto, “que não tem nenhum interesse em ver punidos seus aliados enrolados com a Lava Jato”. “Manobras desse tipo têm a digital de figuras do PMDB, conhecidos por sua proximidade com Temer e seu envolvimento direto em crimes apurados pela Operação Lava Jato”, complementou.