A Polícia Civil de Roraima, por meio da Delegacia de Repressão aos Crimes contra a Administração e Serviços Públicos (DRCASP), deflagrou, na manhã desta terça-feira, 25, uma operação que resultou na prisão de quatro pessoas acusadas de integrar uma quadrilha de estelionatários que fraudava documentos para extorquir dinheiro de interessados no sonho da casa própria. Formulários com logomarcas da “Caixa” e do programa “Rede Cidadania” eram preenchidos com os nomes das vítimas sob a promessa de terem moradia por meio do programa “Minha Casa, Minha Vida”, no entanto, depois que o bando recebia os pagamentos, desaparecia sem dar satisfação.
Em coletiva de imprensa, realizada na tarde de ontem na Delegacia-Geral, na Cidade da Polícia, a delegada responsável pelo caso, Magnólia Soares, disse que mais de 200 pessoas foram lesadas no esquema, que faturou, ilegalmente, cerca de R$ 1 milhão. Os valores cobrados para ter o formulário preenchido variavam de R$ 1 mil a R$ 10 mil. Desde o início de 2015 os estelionatários atuavam em Roraima.
O dinheiro era dividido entre o grupo, que contava com o pastor de igreja evangélica João Pinheiro, vulgo “Apóstolo”, para fazer captação de vítimas. Viagens internacionais e até mesmo para outros estados da Federação foram feitas com o dinheiro adquirido na ação criminosa. Seis mandados de prisão foram expedidos e quatro deles, cumpridos pela polícia. A líder do esquema foi presa no Estado do Amazonas. “A cabeça do esquema foi localizada em Manaus graças à parceria que a Delegacia-Geral de Roraima possui com a Delegacia-Geral do Amazonas”, ressaltou a delegada-geral, Edinéia Santos Chagas.
O ESQUEMA – As reuniões da quadrilha com os interessados em adquirir moradia aconteciam em escritório de restaurante, em igreja e até mesmo em residências em diversos bairros de Boa Vista, de acordo com a necessidade das vítimas.
“As pessoas começaram a ser chamadas para adquirir essas casas e, segundo os estelionatários, eram casas que os proprietários deixaram de pagar a mensalidade, e outras eram casas reservadas com o intuito de agraciar famílias de pequena renda que não tiveram a inscrição aceita anteriormente. Essas pagaram R$ 1 mil, outras pagaram R$ 2mil, alguns chegaram a pagar R$ 10 mil, dependendo de qual bairro essas supostas casas estivessem disponibilizadas. Eles pediam um prazo de 15 dias ou 30 dias para a casas serem entregues, e como não eram entregues, as pessoas começaram a ir em busca dos mediadores para cobrar”, explicou Magnólia Soares.
Uma rede de pessoas lesadas no esquema passou a formar-se na Capital e algumas das vítimas procuraram a polícia para denunciar a prática do bando. Há também quem não procurou a polícia porque essas pessoas sabiam que não preenchiam os requisitos básicos para adquirir uma residência de acordo com as regras do programa federal. “Existem servidores públicos inscritos nos formulários que obviamente não vão procurar a polícia. Nós fomos investigando através de outras pessoas que realmente juntaram um dinheiro acreditando que poderiam ter uma casa por R$ 1 mil”, destacou Soares.
FALSIDADE IDEOLÓGICA – Nas reuniões, a líder da quadrilha, Betânia Maria Martins da Silva, falava em nome da governadora Suely Campos (PP), afirmando ser funcionária da Secretaria Estadual do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes). Outra integrante, Everane Benício de Souza, apresentava-se como agente da Caixa Econômica Federal para dar lisura à fraude. Ela era candidata a vereadora e já estava presa por furto a residências, na Cadeia Feminina de Boa Vista, no complexo Penitenciário de Monte Cristo. Uma terceira mulher, Janice dos Passos também participava dos crimes. O mandado de Everane foi formalizado na manhã de ontem, na Cadeia.
“Cumprimos os mandados de busca e apreensão e não obtivemos muito material nas buscas porque as duas [Betânia e Everane] eram muito minuciosas, típico do estelionatário. Eles têm uma lábia capaz de fazer as pessoas acreditarem que iriam receber as casas. Como elas sabiam que não poderiam deixar provas nas mãos dessas pessoas, nenhum recibo era dado. Tivemos acesso à ficha de inscrição de algumas vítimas que denunciaram”, enfatizou a delegada da DRCASP.
FUGA – Conforme a polícia, as mulheres ostentavam um alto padrão de vida. “Começaram a receber ameaças das pessoas e, com isso, a Betânia desconfiava que a polícia poderia estar na cola dela e fugiu para o Estado do Amazonas. Quando prendemos os outros membros aqui, em Boa Vista, simultaneamente ela foi presa em Manaus e está sendo recambiada. Vamos mostrá-la à imprensa para que outras vítimas possam procurar a delegacia para serem ouvidas”, frisou Magnólia Soares.
O número de vítimas ainda está sendo levantado pela delegacia que investiga o caso, assim como outros suspeitos do delito. “Vamos continuar a investigação e intimar aqueles que têm o nome nas fichas. A gente chama a atenção das pessoas que, quando virem uma situação dessa, tão fácil, em adquirir uma casa por R$ 1 mil, sem prestações a pagar, que desconfiem, porque o estelionatário tem postura, tem um bom papo.
Procurem informação para não cair num golpe como esse! Dificilmente essas vítimas serão ressarcidas. Dinheiro que alguns demoraram tanto para ganhar e que outros usaram de uma oportunidade para tentar se dar bem, como aqueles que não têm perfil para o programa, o qual define renda de até R$ 1.600 para os beneficiários”, alertou a delegada.
PROMESSA – A quadrilha prometia residências e apartamentos nos Conjuntos Habitacionais Pérola, no bairro Airton Rocha; Cruviana, no bairro Senador Hélio Campos; e Conjunto Cidadão, também no Senador Hélio Campos, todos na zona Oeste da Capital.
Betânia exercia cargo comissionado na Setrabes em 2015, mas foi exonerada por prática de crimes semelhantes aos que a levou a ser presa. Há informações de que o grupo tenha agido também no interior do Estado, mas a polícia ainda não se certificou da procedência da denúncia nem mesmo do número de vítimas.
As prisões são temporárias e podem ser prorrogadas ou revestidas em preventivas. Os detidos estão à disposição da Justiça até que os procedimentos preliminares sobre o caso sejam instaurados.
NOME – A operação foi batizada como “Morpheu” em alusão ao deus dos sonhos, na mitologia grega. (J.B)