O corte de água por falta de pagamento implica a cobrança de uma taxa de religação que, em Boa Vista, chega a R$ 75,00. A cobrança tem provocado reclamações por parte de consumidores, que consideram o valor abusivo e questionam a legalidade da taxa.
Ao terem o fornecimento de água suspenso por conta de débitos junto à Companhia de Águas e Esgotos de Roraima (Caer), o serviço só é reestabelecido após a quitação da dívida e o pagamento da taxa de religação. Para essa última dois valores são cobrados: o primeiro de R$ 35,00, em que a religação é feita em até 24 horas, e o segundo, de urgência, que custa R$ 75,00, em que a água é reativada na residência em até quatro horas após o pagamento.
O problema é que, em muitos casos, o valor cobrado pela taxa de religação chega a ser o dobro da tarifa cobrada pelo fornecimento de água nas residências da Capital. Alguns consumidores afirmam, inclusive, que sequer são comunicados do corte no fornecimento.
“Eu paguei duas faturas de água no período em que os bancos estavam em greve e, por conta disso, acabou não sendo computado no sistema. Na semana passada, ao chegar em casa, já me deparei com o corte de água, mas não fui avisado que iriam fazer isso e nem sabia da dívida”, disse o estudante Francisco Simões.
Segundo ele, o serviço só foi reestabelecido após o pagamento das faturas em atraso e da taxa de religação. “Fui na Caer e a atendente me informou os dois valores para taxa de religação. Achei um absurdo cobrar para religar um serviço essencial. Como não podia esperar 24 horas para ter água, acabei pagando a taxa mais cara”, afirmou.
Para o vendedor Charles Ferreira, o alto valor cobrado pela taxa de religação é abusivo. “Como consumidor acho essa cobrança terrível, porque precisamos de água e luz e é constrangedor termos esses serviços cortados. Nem sempre quando pagamos atrasado é por intenção. É abusivo cobrar um preço maior que o consumo, ainda mais para quem está sofrendo com dificuldades financeiras”, lamentou.
O aposentado Antônio Carmelo sugeriu que o valor da taxa deveria ser revisto pela empresa fornecedora do serviço. “Em períodos como o de greves dos bancos eles deveriam evitar essa suspensão ao consumidor, porque é difícil chegar em casa e a água estar cortada. Acho que o certo era cobrar essa taxa por bairro. Tem que checar para verificar se isso é um preço criado aleatoriamente ou algo que foi estipulado”, frisou.
ENERGIA – A cobrança da taxa de religação na Capital não se limita apenas à água. O valor também é cobrado para quem tem o fornecimento de energia elétrica suspensa por falta de pagamento. Nesse caso, a taxa extra, que chega a custar R$ 183,79, é cobrada diretamente na tarifa do mês subsequente ao corte.
“O que a gente paga já é muito alto e ainda cobram essas taxas de nós. Tem pessoas que hoje não têm condições nem de pagar a conta de energia e ainda pagar a religação, isso é um absurdo. Dizem que é urgente, mas passamos várias horas esperando até religarem. Hoje ou você come ou paga a luz da casa”, disse a funcionária pública Valdete Almeida.
A professora Josefa da Silva informou que já teria sido enganada pela empresa fornecedora de energia por conta da cobrança da taxa. “Certa vez mandaram a taxa para cobrar afirmando que não paguei, mas quando procurei a tarifa vi que estava paga. Eles informaram que abateriam na conta de luz, mas acho um erro grande. Deveriam devolver nosso dinheiro”, frisou. (L.G.C)
Projeto de Lei que impedia cobrança de taxa já foi vetado 12 anos atrás
Em alguns Estados, principalmente os da região Nordeste, como Bahia e Pernambuco, a cobrança sobre a taxa de religação de água e luz é considerada ilegal por lei. Em Roraima, um Projeto de Lei que discutia o fim da cobrança da taxa já foi posto em pauta na Assembleia Legislativa (ALE-RR), há cerca de 12 anos, mas foi vetado integralmente pela bancada do Governo à época por ser considerado de interesse social e causar prejuízo às empresas fornecedoras.
O projeto alegava que a taxa de religação representa punição excessiva ao consumidor que enfrenta dificuldade financeira e atrasa o pagamento mensal da conta de água e luz, indo de encontro ao que estabelece a constituição federal em seu artigo quinto: “o estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”.
A proposta chegou a ter aprovação unânime, recebendo apoio de deputados de diferentes correntes políticas, em todas as comissões em que tramitou, mas acabou sendo engavetado pela maioria. (L.G.C)
Cobrança constitui apropriação indébita, segundo o CDC
O corte do fornecimento de energia elétrica e água em relação aos consumidores inadimplentes não está autorizado pelo Código de Defesa do Consumidor. “A suspensão ou ameaça do fornecimento de energia elétrica e água acarreta constrangimentos morais ao consumidor, que se vê desprovido de condições dignas de sobrevivência, não tendo acesso ao lazer, informação, higiene e alimentação”.
O Código estabelece que a cobrança do débito deve recair apenas sobre o devedor, nunca sobre terceiros, seja parentes, crianças, idosos, doentes, clientes ou funcionários. O débito de consumo decorre de uma relação limitada às pessoas do fornecedor e do consumidor. Não podendo envolver outras pessoas, nem mesmo os familiares de quem está sendo considerado devedor.
As concessionárias devem se abster de efetuar a suspensão do fornecimento de água e de luz no tocante aos consumidores inadimplentes visando à cobrança de débitos, uma vez que se cuida de prática desleal, contrária à boa-fé, o que afronta ao disposto no artigo 42, da lei 8.078/90.
A relação existente entre o usuário de energia elétrica, água e esgoto está submetida às normas do Código do Consumidor, definido na lei 8.078/90. Existe jurisprudência de que cobrar do usuário o pagamento da taxa de religação constitui apropriação indébita e requer devolução da quantia recebida indevidamente. (L.G.C)
Empresas alegam que taxas são estipuladas e que informam pendências nas faturas
Em nota, a Eletrobras Distribuição Roraima informou que as taxas de serviços cobráveis são estipuladas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Quando da homologação das tarifas de energia elétrica, a Aneel também homologa os valores dos serviços cobráveis.
Segundo a empresa, a suspensão de fornecimento em decorrência de atraso no pagamento das faturas de energia elétrica ocorre após o vencimento do reaviso que é feito em campo específico na fatura de energia elétrica. O vencimento do reaviso ocorre 15 dias após a data da sua emissão.
A Eletrobras alegou que, quando a empresa informa que há faturas vencidas, já está comunicando que haverá a suspensão do fornecimento caso a fatura não seja paga. A suspensão do fornecimento pode ser feita com a casa fechada, pois é um serviço externo, não depende da presença do consumidor.
Ressaltou que a suspensão de fornecimento só é realizada após o vencimento do reaviso que é feito na fatura de energia elétrica, e que o consumidor deve ficar atento às informações que constam na fatura de energia, também poderá consultar a situação da fatura no site da empresa ou através do tele atendimento 0800 70 19 120. Para acesso via internet basta que o titular da fatura de energia realize o cadastro no endereço http://www.eletrobrasroraima.com/segundavia/
Também em nota, a Companhia de Águas e Esgotos de Roraima (Caer) informou que faz o comunicado de pendência de débito na própria fatura de água, onde avisa ao cliente que há contas em aberto, sujeito a corte. Também envia um aviso específico de corte à residência do usuário, dando prazo de 15 dias para pagamento do débito.
“O procedimento adotado pela Companhia é realizar o serviço de corte com 90 dias da fatura em atraso. O valor cobrado para religamento, de R$ 37,64, leva em consideração os custos para o restabelecimento dos serviços, mão de obra, material e deslocamento. A Caer informa ainda que a taxa é cobrada quando há corte devido (inadimplência) ou quando o cliente solicita o desligamento”, explicou.
A Companhia orientou os clientes para, em caso de dúvida ou reclamação, que entrem em contato com a empresa pelos canais de atendimento disponíveis, como a Central de Atendimento, 0800.280.9520, das 8h às 18h, o aplicativo Caer Mobile (disponível para Android) ou por meio do portal da Companhia, www.caer.com.br. (L.G.C)