Cotidiano

Dependentes químicos são obrigados a buscar tratamento em outros estados

Número de viciados aumenta de forma assustadora e sem apoio do poder público e as três casas de recuperação não dão conta da demanda

Os números são imprecisos, mas estima-se que em Roraima já tenha mais de 10 mil usuários de droga ilícita. Nos últimos dados revelados pela Secretaria Estadual de Saúde (Sesau), no ano passado, os Centros de Atenção Psicossocial a Álcool e outras Drogas, os Caps, já atendiam a mais de seis mil pacientes somente na Capital. A maioria do público é formada por jovens de 16 a 22 anos. A cocaína e a maconha são as drogas mais consumidas.
Apesar do aumento no número de viciados, o Estado só tem três casas de recuperação que dão assistência aos dependentes químicos. Mas todas estão lotadas e os doentes roraimenses têm que buscar tratamento fora do Estado. Foi o caso do jovem A. M. S, de 22 anos, viciado em cocaína desde os 16. Filho de servidores públicos federais, o rapaz chegou ao “fundo do poço”, mas quando decidiu pedir ajuda, não encontrou em Roraima. Ele teve que mudar para Manaus (AM), onde passou seis meses internado em uma clínica particular.
“Meus pais tentaram me internar nas três casas aqui no Estado, mas não havia vaga. Tinha uma lista enorme de gente aguardando a vez. Então, minha família conseguiu me internar em uma clínica particular em Manaus, onde me recuperei, graças a Deus”, lembrou o ex-usuário.
PODER PÚBLICO – A Organização Mundial de Saúde (OMS) preconiza que os dependentes químicos devem ser tratados pelo poder público, mas pelo menos em Roraima autoridades dos Três Poderes estão fazendo de conta que o problema não existe, apesar de Boa Vista hoje ser uma imensa boca de fumo.
Em todos os bairros da Capital há consumo de drogas, principalmente em praças públicas, onde os jovens fumam maconha até de dia. A falta de vagas nas três casas de recuperação em Roraima ocorre porque não há investimento financeiro do poder público. A Agapão, Casa do Pai e a Fazenda Esperança arcam com grande parte das despesas.
A dependência química foi debatida no ano passado, durante audiência pública na Câmara de Vereadores de Boa Vista. Na ocasião, o então secretário municipal de Saúde, Marcelo Lopes, prometeu que a Prefeitura iria fazer convênio com as casas de recuperação, mas a promessa não saiu do papel.
No âmbito do Executivo estadual, o então governador Anchieta Júnior (PSDB) também prometeu, em meados de 2010, que Roraima trataria seus dependentes químicos. Foi assinado até um convênio entre Governo do Estado e a Arquidiocese do Amazonas para a implantação da Fazenda da Esperança em Roraima.
O convênio previa a transferência de R$200 mil para benfeitorias, recuperação e adequações das instalações hidráulicas e elétricas na área física da Vila São Raimundo, no Município de Iracema, a 90 quilômetros da Capital pela BR-174. Centro Sul do Estrado, onde a Fazenda Esperança foi implantada. Os padres da Igreja Católica cumpriram o acordo, mas o governador não.
Em junho de 2012, o Governo do Estado assinou um pacto de enfrentamento às drogas. O então governador Anchieta chegou a dizer que a luta do dependente tinha que começar em casa, junto com a família. No papel, o pacto estava selado, mas a maioria das ações não foi realizada.
Ainda em 2012, a então primeira-dama do Estado, Shéridan de Anchieta, hoje eleita deputada federal, também prometeu ajudar os dependentes químicos da Fazenda da Esperança. A Secretaria de Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes) firmaria convênio e repassaria R$200 mil e uma Kombi. Mas as promessas também caíram no esquecimento. O dinheiro e veículo nunca chegaram à fazenda.
Atualmente, o Estado oferece tratamento a dependentes químicos apenas nos Centros de Atenção Psicossocial a Álcool e outras Drogas, onde são atendidos pacientes em processo de reabilitação e familiar. Os Caps dispõem de serviços de psiquiatria, psicologia, assistência social e uma farmácia. As pessoas são orientadas pelos profissionais de saúde sobre os perigos do vício. Familiares dos dependentes também recebem atendimento psicológico.
*Conheçã o endereço dos Caps:
Caps Jardim Floresta – Rua: Sócrates, nº 138, Jardim Floresta Telefone: 3625-3342
– Alcoólicos Anônimos (AA) – Espaço Nós Existimos Rua Floriano Peixoto, Centro (ao lado da Escola São José) Telefone: 3623-5030
– Alcoólicos Anônimos – AA – Grupo Só por Hoje Igreja Católica São Bento Rua Ataíde de Teive nº 2386 – bairro Liberdade
-Grupo Amor Exigente Escolinha atrás da Igreja de São Francisco Telefone: 8114-1245
– Unidade Integrada de Saúde Mental de Roraima Anexo Hospital Coronel Mota Telefone: 3224-9567
-Narcóticos Anônimos – NA Escola Princesa Isabel, Centro Telefone: 8117-5513
– Conselho Estadual de Políticas Anti Drogas – Conead Rua Alcemir de Souza Mota, nº 164, bairro 31 de Março. Telefone: 3224-2863
– Narcóticos Anônimos – NA Telefone: 9122-4016
– Núcleo de Apoio a Toxicômanos e Alcoolistas Rua Arnaldo Brandão nº 728 – Bairro São Francisco Telefone: 3086-2320 / 8114-6313
*Endereços das comunidades terapêuticas
– Fazenda da Esperança Nossa Senhora de Guadalupe Escritório Administrativo Rua: Espírito Santo, 327 – Bairro dos Estados Local internação: BR 174 – Km 432, antiga Vila São Raimundo – município de Iracema. Fone: (95) 99113-0546
– Associação Beneficente Agapão (ABA) “Comunidade Viva Vida” Escritório Administrativo Rua: Manoel Felipe, 215, Buritis Local internação: BR 174, Km 8, área Rural da Água Boa. Fone: (95) 9122 0864 / 9156 8562 / 9121 9650
– Casa do Pai Escritório Administrativo Rua: Mário Homem de Melo, 3461 – Liberdade Local internação: BR 174, Km 8, área Rural da Água Boa.
Internações de dependentes aumentam 128% no Brasil
O número de internações financiadas pelo SUS (Sistema Único de Saúde) de dependentes de drogas ilícitas cresceu 128% nos anos de 2006 a 2012, equiparando-se ao número de internações por dependência de álcool.
Em 2012, último dado disponível, os usuários de drogas ilícitas respondiam por 48% das internações por dependência química. Os alcoólatras eram os outros 52%. No total, o SUS registrou um total de 301.716 internações por dependência naquele ano.
A alta expressiva no atendimento aos viciados em substâncias ilícitas não se repete no auxílio aos alcoólatras, cujas internações tiveram queda de 10% no período e permanecem estáveis desde 2009.
Cada internação dura de 2 a 4 semanas e tem o objetivo de desintoxicar o paciente. Após esse período, ele deixa o hospital e passa a ser atendido nos Caps (Centro de Atenção Psicossocial), comunidades terapêuticas ou unidades de acolhimento.
Ao interpretar os dados, o secretário nacional de Políticas Sobre Drogas, Vitore Maximiano, diz que o aumento de internações de dependentes de substâncias ilícitas não reflete necessariamente um maior uso desses entorpecentes.
Segundo ele, a alta deve-se a uma maior procura por tratamento nos últimos anos e melhor estrutura de atendimento. “Houve ampliação da rede de cuidados ao dependente químico e do número de leitos disponíveis pelo SUS”, disse. No período, o número total de internações cresceu 27%, de 237.068 para 301.716. O uso de crack e cocaína domina as internações por dependência de drogas. (AJ)