Política

Lideranças devem cobrar melhor tratamento para RR, diz Quartiero

Para ele, não fosse à interferência de órgãos federativos, Estado teria condições suficientes de se autossustentar economicamente

O impacto de mais uma demarcação de Terras Indígenas em Roraima foi um dos temas debatidos no Agenda da Semana, da Rádio Folha AM 1020, de ontem, 23.  Ao programa, o governador em exercício, Paulo César Quartiero (DEM), disse que lideranças do Estado precisam cobrar da União um tratamento mais adequado para as necessidades enfrentadas pela população roraimense.

“É necessário que a bancada política de Roraima passe a cobrar esse tratamento melhor de Brasília e que faça isso agora. Infelizmente nós fizemos a opção de vivermos na base da economia de contracheque, de transferência de recursos para cá, e esse tipo de modelo já está esgotado. Eu tenho andado pelos estados do Sul e a realidade é totalmente oposta aos dos estados do Norte. São poucos os estados brasileiros com superávit capaz de sustentar os demais do País. Então as pessoas já estão se cansando desse modelo, ou seja, é de prever que uma hora vai começar a secar essa fonte de recurso que vem para cá”, afirmou.

Conforme Quartiero, ao contrário que se prega na Capital Federal, a União tem uma dívida de gratidão com Roraima, devido a sua boa posição geográfica com outros mercados e riquezas naturais. Não fossem as constantes interferências de órgãos federativos, como a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Estado teria condições suficientes para se sustentar sem necessidade de buscar recursos junto ao Governo.  

“Já fui deputado federal e, na visão de muitos políticos, Roraima é tido como o ‘Estado mendigo da Federação’. Se a gente somar o orçamento geral, incluindo o das prefeituras, nós temos torno de R$ 5 bilhões para manter esse simulacro de Estado, mas ao contrário do que eles pensam, a União é quem tem uma grande dívida de gratidão com Roraima. O Estado foi criado em 1988 com a visão estratégica de povoar o Norte do país e pela proximidade com Caribe e a América do Norte. Ou seja, uma visão extraordinária, mas a medida que o criaram, foram retirando os itens indispensáveis para o desenvolvimento local, como garimpo e indústria madeireira, e outros setores já sentem esses efeitos. Eu pedi para que a Seplan [Secretaria de Planejamento] fizesse um levantamento do que deixamos de arrecadar com isso e tenho certeza que o resultado vai ser monstruoso”, afirmou.

Ele lembrou que, em 2009, antes da saída dos produtores de arroz da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, o Estado detinha 25 mil hectares, o que gerava uma receita de 30% ao ano na economia local. “Se você pegar daquele ano para cá, sempre acrescentando esse percentual, nós deixamos de arrecadar muito. Se formos pegar a indústria madeireira, que é de conhecimento geral que éramos responsáveis por abastecer o mercado da Venezuela, começa a calcular o que foi fechado, pega a pecuária que foi impedida de expansão, pega a agricultura que foi torpedeada por ai, nós vamos ter um número extraordinário superior ao que o Governo Federal manda para nós. Então, temos ai a existência de uma dívida da União conosco e, dentro desse contexto, e aproveitando essa questão dos refugiados venezuelanos na mídia, nós tínhamos que cobrar do Governo Federal uma postura diferente e dar a oportunidade ao Estado de ter um projeto de desenvolvimento”, complementou.

Na visão do governador em exercício, uma das heranças deixadas pelas administrações passadas foi a da dependência de capital federal para suprir as necessidades do Estado, algo que para ele foi bastante prejudicial para classe política e para toda a população. “Eu acho que há a necessidade de nós, enquanto classe política, procurarmos alternativas para forçar a mudar este conceito. O que a gente observa é que a nossa classe política foi criada com a visão de que sempre vem dinheiro de Brasília para atender a nossa população, e em troca disso, nós entregamos nossos recursos naturais, nossa terra e nossa possibilidade de desenvolvimento”, disse.

Segundo Quartiero, a instabilidade, em diversas áreas, prejudica o Estado. “Hoje, por conta dessa questão da falta de energia, por exemplo, com as poucas terras que sobram, não tem como fazer um projeto de desenvolvimento econômico. A agricultura é uma ferramenta? Sim, mas acaba que, por conta dessas questões de terra, essa alternativa acaba ficando limitada, porque não tem área suficiente para produzir, e uma coisa puxa a outra. A indústria, seja qual for o segmento, fica impedida de se estabelecer aqui, justamente por essa instabilidade”, disse.

Para ele, caso haja de fato a consolidação da decisão dada pelo Governo Federal para a demarcação da Comunidade Indígena do Anzol, localizada na zona Rural de Boa Vista, o Estado ficará ainda mais impossibilitado de implantar qualquer tipo de iniciativa de desenvolvimento para a economia local.

“Eu concordo que o Estado avançou muito em várias questões, como a titulação de terras e o combate a febre aftosa, mas só a notícias da possibilidade de se demarcar não só esta, como outras áreas aqui no Estado, indo contra ao que foi definido pelo próprio Governo Federal, já espanta possíveis investidores interessados em vir para cá, e inibe também quem está alocado aqui”, afirmou.

Ele exemplificou: “Um banco, por exemplo, não vai sentir segurança em oferecer empréstimo nesta instabilidade, pois mesmo que o interessado tenha o título da terra, este pode perdê-la em uma eventual demarcação, e o banco não vai querer correr o risco de sair no prejuízo. Mesmo que isso não ocorra, essa possibilidade causa um desastre e eu não tenho nenhuma dúvida alguma de que a criação da TI Pirititi, que fica na divisa do Estado com o Amazonas, foi para impedir a vinda da energia, e a questão da Comunidade do Anzol é para impedir a possibilidade de desenvolver a nossa economia”, frisou.

Quartiero diz não se orgulhar de fazer parte de uma “gestão sem força”

Essa é a primeira vez que o democrata assume o posto de Chefe de Estado, passados mais de dois anos do mandato da titular, a governadora Suely Campos (PP), que pediu licença do cargo por uma semana. O prazo se extingue amanhã, 25. Questionado sobre sua relação com Suely, Quartieiro foi enfático em afirmar que, apesar do respeito que um nutre pelo outro, ambos possuem visões diferentes sobre as necessidades pontuais do Estado. Ele declarou ainda não se orgulhar muito de ser considerado membro da gestão da ‘pepista’.

“Nós temos um Estado que, além do potencial de desenvolvimento econômico, tem um forte poder político, só que infelizmente o nosso Governo não soube se articular para equilibrar isso e o resultado foi que viramos uma gestão para pequenas causas, e isso inclui toda essa questão indígena. Temos que administrar 100% do Estado, mas só temos 8% disso para utilizar nas nossas atividades econômicas, gerar os impostos que vão manter a estrutura governamental e ainda ter os recursos para investir no bem estar da população”, ressaltou.

Ele complementou: “Então eu não me sinto confortável quando alguém me pergunta se tenho orgulho de ser governador. Muito pelo contrário, ser titular de uma gestão sem força, sem poder de decidir nada, que está no poder simplesmente para honrar com pagamentos do funcionalismo e de fornecedores é algo preocupante, porque não é isso que queremos. Cadê a nossa posição no século 21? A projeção de Roraima no cenário nacional? Nada! Ficamos administrando as pequenas causas, ou seja, um Governo de pequenas causas. Então é lógico que se uma administração de pequenas causas ainda é dividida, não sobra muita coisa para administrar”, pontuou.

Para finalizar, o governador em exercício declarou que, antes de deixar o comando do Palácio Senador Hélio Campos, vai sugerir a titular algumas ideias para destravar pontos impactantes no Estado. Entre eles estão três audiências públicas em Brasília, sendo a primeira com o Ministro da Justiça e Cidadania (MJC), Osmar Serraglio; a segunda com o procurador-Geral da República, Rodrigo Janot; e a última com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia.

“Não sei se ela [Suely] vai acatar alguma das minhas sugestões, mas sentarei com ela para discutirmos essas ideias. É necessário que haja essas audiências, primeiro para falar da atuação da Funai, que está estagnando o Estado economicamente; segundo por conta da conduta dos procuradores federais que são enviados para o Estado, que simplesmente não olham os fatos com seriedade e só vem para cá com intuito de fazer carreira; e o terceiro para questionar a maneira de tratamento do STF no cumprimento do que a lei determina. Esse ultimo ponto é o mais grave. Será que a justiça só funciona para os outros estados brasileiros e Roraima é única exceção? Então há de se questionar tudo isso”, concluiu.  (M.L)