A cozinheira Márcia Lopes, de 47 anos, foi a última moradora a deixar a residência de uma das dezenas de ruas do bairro Calungá, na zona sul de Boa Vista, que ficaram completamente alagadas com o transbordamento do Igarapé Caxangá, que deságua no Rio Branco. Ela só deixou o local depois de ficar doente e acredita ter sido contaminada pela água do igarapé.
As inundações das residências situadas à beira do rio não são os únicos transtornos desencadeados pela cheia. A subida das águas evidência o acúmulo de lixo descartado sem qualquer cuidado. As toneladas de dejetos trazem consigo doenças que afetam principalmente as crianças e preocupam os moradores.
Enquanto aguardava a chegada de equipes da Defesa Civil Municipal, a cozinheira, mesmo quase sem voz e com vários sintomas de doenças infectocontagiosas, se expunha ainda mais para retirar os pertences que restaram salvar na residência. “Quando começou a alagar, já comecei a ficar ruim. Tomo banho e bebo essa água. Estou doente e mandei todos meus filhos embora para também não ficarem”, relatou.
Entre as principais doenças causadas pelas enchentes estão a leptospirose, a hepatite, a febre tifoide e a cólera. Todas são transmitidas pelo contato direto ou indireto com a água contaminada. Segundo a infectologista Cassandra Mangabeira, ao entrar em contato com a pele durante as inundações, por meio da água, a bactéria penetra no organismo. “Isso vai causar febre, náuseas, dores de cabeça e nos músculos. Quando não diagnosticada com antecedência, a leptospirose, por exemplo, pode ser fatal”, alertou.
Na Avenida Sebastião Diniz, no Centro, que está com um trecho interditado por conta do transbordamento do Igarapé Caxangá, a Folha flagrou crianças caminhando no meio da via alagada. Para a infectologista, o risco é iminente. “A principal recomendação é evitar o contato com água e lama contaminadas e não consumir água e alimentos que tenham contato com as enchentes”, disse.
Da porta do barraco de madeira às margens do Rio Branco, o estudante Cleiton da Silva e de seus dois irmãos, torcem para que a água recue e eles não tenham que sair do local. “A gente não sabe até quando vai ficar aqui. Esperamos que seque e que a água não avance mais para a nossa casa. Não dá para confiar na água, ainda mais no estado que está, sei que pode causar alguma doença”, disse.
Diversas famílias atingidas pelos alagamentos nos bairros Calungá, Cauamé, Paraviana (ambos na zona norte) e na área de interesse social Caetano Filho, popularmente conhecida como Beiral, no Centro de Boa Vista, relutam em deixar suas casas, mesmo sob o risco de contaminação por doenças. (L.G.C)
Como se proteger durante as inundações
– Evite ao máximo o contato com a água e a lama decorrente das chuvas e não deixe que crianças nadem ou brinquem nesses locais, que podem estar contaminados com a urina de roedores.
– Para evitar a presença de roedores, mantenha os alimentos guardados em recipientes bem fechados, resistentes e distantes do chão.
– Deixe a cozinha limpa e sem restos de alimentos, retire as sobras de alimento ou ração dos animais domésticos antes de anoitecer.
– Evite o acúmulo de entulhos e objetos sem uso no quintal e dentro da cozinha e armazene o lixo em sacos plásticos bem fechados e em locais altos até a coleta ocorrer. (L.G.C)
Prefeitura diz que equipes de saúde vão às áreas alagadas
Por meio de nota, a Prefeitura de Boa Vista informou que oferece serviços de saúde em 31 unidades básicas, quatro delas com atendimento estendido até meia-noite. O bairro São Pedro possui uma unidade que conta com uma equipe de Estratégia Saúde da Família. A área do Caetano Filho é atendida pelas unidades mais próximas, como São Vicente, São Pedro e 13 de Setembro.
Segundo o município, as equipes das unidades estão programando visitas às áreas alagadas. “Na manhã de ontem, 06, uma equipe de Estratégia Saúde da Família e Núcleo de Assistência à Saúde da Família [NASF] realizaram uma visita à área alagada do Paraviana”, afirmou. (L.G.C)