A Prefeitura de Iracema publicou, no início da semana, no Diário Oficial dos Municípios, um decreto anulando todos os trâmites do Edital 001/2016 do concurso público daquele município, localizado na região centro-oeste do Estado.
Entre os motivos alegados pela administração municipal está a de que a forma como o certame foi realizado afronta os princípios constitucionais da legalidade, desrespeitando a Lei Complementar nº 101/2000, Lei de responsabilidade Fiscal (LRF) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) Municipal, nos dispositivos que exigem a apresentação de estudo de impacto financeiro.
Outro ponto levado em consideração pelo decreto está a Súmula 437, do Supremo Tribunal Federal (STF), que permite que a administração do Município tenha o poder de anular seus próprios atos, quando evidenciado vícios que os tornam ilegais. A decisão pegou de surpresa os mais de 200 candidatos aprovados no certame.
“Foi realmente uma surpresa para a gente e eu trato isso como uma aberração jurídica. Nunca vi um concurso lícito, sem nenhuma irregularidade, que teve todo um acompanhamento legal pelo Ministério Público e que foi homologado da forma correta, ser anulado dessa forma. Sem nenhum tipo de respeito com quem foi aprovado”, disse o candidato Alexandre Barros.
Voltada para o preenchimento de vagas e cadastro de reserva para os níveis fundamental e médio/técnico, as provas foram realizadas no fim do ano passado. Segundo Barros, havia uma grande expectativa dos aprovados pela convocação e nomeação para os cargos, no entanto, devido à troca de prefeitos, o processo acabou ficando comprometido.
“Em janeiro, houve uma primeira convocação pelo até então prefeito, Delegado Francisco Araújo (PEN), no entanto, em abril deste ano o Superior Tribunal Federal (STF) validou os votos do outro candidato, Jairo Ribeiro (PMDB), que por ter sido o primeiro colocado nas eleições, acabou assumindo o cargo. Nessa troca, ele ingressou com uma determinação judicial anulando todos os decretos feitos pelo gestor anterior, incluindo a convocação de outros candidatos deste certame”, destacou.
Além dos danos psicológicos, já que muitos candidatos estavam esperançosos pela nomeação, Barros ressaltou ainda os prejuízos financeiros que muitos deles acabaram acumulando durante esses pouco mais de cinco meses de expectativa.
“Quem faz concurso público sabe que para cada edital há uma preparação que envolve sempre muitos gastos, iniciando pelo valor de inscrição, que em alguns casos e não é tão barato assim. Além disso, o candidato acaba tendo despesas elevadas com exames médicos, que em alguns casos podem chegar a R$ 300. Tem ainda despesas com cartório, onde uma autenticação de documento não sai por menos de R$ 3. Então, é muito complicado lidar com uma situação dessas, principalmente quando se é desempregado ou quando se abriu mão de um emprego na esperança de ingressar no serviço público”, ressaltou.
RECOMENDAÇÃO – No mesmo mês em que Jairo Ribeiro tomou posse como prefeito, o Ministério Público, por meio da Promotoria de Justiça de Mucajaí, recomendou que o município mantivesse a convocação e nomeação dos aprovados. Segundo Alexandre Barros, uma audiência com a promotora de justiça substituta, Soraia Cattaneo, que é a responsável pela comarca, deverá ser realizada na manhã desta sexta-feira, 21.
“O que mais me choca nessa situação é que quando ele [Jairo] entrou na Prefeitura, exonerou todo mundo e preferiu contratar 400 comissionados, ao invés de dar posse aos aprovados no concurso. Numa prefeitura que só tem 79 funcionários efetivos, isso é inadmissível. Além disso, uma decisão judicial que saia favorável para o cancelamento de concurso é um retrocesso para o Brasil, porque abre brecha para que outros municípios façam o mesmo, porque cria jurisprudência para isso. Nunca aconteceu de haver o cancelamento de um concurso público nesse País e isso é muito perigoso”, protestou.
PREFEITURA – À Folha, a Prefeitura de Iracema informou que os elementos utilizados na formalização do decreto que anulou o concurso público respeitaram todos os princípios de responsabilidade e da legalidade, respeitando principalmente a Lei Orçamentária Anual (LOA) do município.
Destacou ainda, que os valores gastos pelos candidatos do certame serão restituídos e que a Prefeitura já está realizando um levantamento para verificar a situação do quadro funcional do Município. A ideia é que assim que o levantamento for concluído, um novo certame venha a ser realizado.
MPRR – Por meio de Nota, o Ministério Público de Roraima (MPRR) destacou que desde abril desse ano, por intermédio da Promotoria de Justiça de Mucajaí, recomendou ao prefeito de Iracema, Jairo Ribeiro, que se abstivesse de realizar contratações para a administração municipal em detrimento da nomeação dos aprovados em concursos públicos. Porém a notificação não foi acatada.
“Diante do descumprimento, o MPRR instaurou inquérito civil para apurar o caso e requisitou informações quanto ao quadro funcional do Município, inclusive, no que diz respeito a situação dos aprovados em concurso público”, frisou o órgão, acrescentando que, em caso de descumprimento, o órgão analisará quais medidas serão adotadas contra o Município. (M.L)