Cotidiano

Manifestantes protestam contra aluguel solidário para venezuelanos

Munidos de cartazes e apitos, grupo pede maior transparência do poder municipal no auxílio aos imigrantes do país vizinho

‘Diga não ao Vale Luxo e Sim à Igualdade’. Foi com essa frase que manifestantes estiveram reunidas na manhã de ontem, 28, em frente ao Palácio 9 de Julho, sede administrativa da Prefeitura de Boa Vista, para protestar contra o anúncio do aluguel solidário, que beneficiará imigrantes venezuelanos em situação de rua.

Criado pela Prefeitura de Boa Vista, a medida tem gerado polêmica entre a população da capital. “Porque temos que arcar com essa situação e pagar em espécie por esses aluguéis? Eu acho que isso tem que ser feito de forma organizada, em lugares salubres. Não sou contra nacionalidade nenhuma, mas não temos emprego, educação, saúde e moradia dignas. A situação deles não está boa, mas a nossa está pior”, relatou a professora Perpétua Dias.

Organizado pelo Movimento Respeita Roraima, a ação teve como objetivo chamar a atenção da sociedade sobre a situação enfrentada no Estado devido ao êxodo de imigrantes venezuelanos. O temor é que a medida torne a estrutura dos municípios ainda mais insustentável. “Segundo a Polícia Federal, o Estado possui mais de 30 mil venezuelanos em situação de refúgio e essa informação de que há aluguel e alimentação já soa no território de lá como um convite, ou seja, algo atraente. Muitos deles, cerca de 1.500, já estão na fronteira para adentrar no país, já que isso infelizmente gerou um sonho na cabeça deles. Se não tratarmos essa situação de forma ordenada, a situação em Roraima só tende a piorar”, frisou um dos manifestantes, Ciro Ricardo.

O grupo também utilizou o ato para promover a coleta de assinaturas para um abaixo-assinado, para que a população possa cobrar do poder público a aplicação correta das medidas de apoio à população de imigrantes no Estado. “Vamos entregar o abaixo-assinado a todos os órgãos fiscalizadores, de maneira que eles possam promover essa ajuda de forma organizada, fazendo que essas medidas não se tornem um convite para a vinda de mais venezuelanos para o Estado. Nós somos solidários ao que eles estão passando, mas que isso seja feito da forma correta”, avaliou.

PARTICIPAÇÃO – Segundo as lideranças do protesto, os preparativos para a manifestação começaram ainda na última sexta-feira, 25, por meio das redes sociais. Inicialmente, a ação contaria com mais de 200 pessoas, no entanto, até às 10 horas da manhã, o movimento tinha pouco menos de 120 pessoas. Além de membros do Movimento Respeita Roraima, o ato contou ainda com a participação de outras entidades, como a Associação de Moradores da Área de Interesse Social João de Barro.

“Da mesma forma que a Prefeitura está olhando para essa situação dos venezuelanos, nós também gostaríamos de ter esse mesmo tratamento. Desde 2011 que as mais de 300 famílias do João de Barro esperam por melhorias naquela área, porque até hoje não temos a situação da energia regularizada. Também somos seres humanos que precisam de atenção”, pontuou Maria Moraes, moradora do João de Barro. (M.L)

“Não podemos cruzar os braços”, diz Prefeitura de Boa Vista

Sobre a manifestação de ontem, a Prefeitura de Boa Vista ressaltou, em nota, que respeita toda e qualquer manifestação das pessoas, desde que a ação seja pacífica e baseada nos princípios democráticos. Destacou ainda que o tema está sendo tratado em comum acordo com o Governo Federal e que busca devolver as boas condições e qualidade de vida que os boa-vistenses tinham na cidade. “Não podemos cruzar os braços frente a essa crise migratória. A cidade vem sendo depredada, as praças públicas têm servido de dormitório para crianças, jovens e adultos. Nossas fontes servem para tomar banho e os abrigos de ônibus viraram casas”, frisou.

Ainda segundo a nota, os níveis de violência e prostituição na capital têm crescido de forma assustadora, forçando a Administração Municipal a adotar dois caminhos. “Ou tomamos alguma atitude ou deixamos como está e a cidade perderá o controle e a sua qualidade de vida que demorou tanto a ser construída. A prefeitura ressalta que a crise é humanitária, mas precisa ser tratada como algo maior. São pessoas que estão em Boa Vista, não por desejo próprio, mas sim pela falta de liberdade na Venezuela”, completou.

Sobre a origem dos recursos, a Prefeitura salientou novamente que tem dado todas as informações necessárias a respeito do plano de ação relacionado à questão dos venezuelanos no município. “O plano é uma parceria com o Governo Federal que trata da imigração de venezuelanos em Roraima. Entre as propostas do Governo Federal, está a implantação do Aluguel Solidário para as famílias que estejam em situação de vulnerabilidade social. Os recursos virão do Ministério do Desenvolvimento Social. Com essa ajuda, as famílias de migrantes poderão ter residência digna e recursos para alimentação. Os recursos serão pagos por um período de seis meses, tempo necessário para se documentar e encontrar uma atividade que lhe dê renda”, explicou.

JOÃO DE BARRO – Já sobre a reivindicação dos moradores da área João de Barro, a nota informa que a localidade ainda é considerada irregular, pois embora tenham adquirido terrenos de um particular, o empreendimento não foi aprovado pelo município, porque o projeto não atende às exigências da Lei de Parcelamento de Solo, por responsabilidade exclusiva do dono original do terreno.

“A Lei que disciplina o assunto determina que quem se propõe a lotear área deve, como condição prévia, implementar a obra de infraestrutura, além disso, é exigível que a área esteja livre e desembaraçada de ônus, o que não ocorre no caso do João de Barro, que tem penhora judicial registrada na matrícula do imóvel por conta de dívida tributária junto a União”, ressaltou.

Ainda segundo a Administração Municipal, a regularização do empreendimento depende de ações de competência do particular, ou seja, do responsável do empreendimento, não sendo possível o poder público atuar fora dos limites de sua atribuição. “Motivada pela situação em que os moradores hoje se encontram, a Prefeitura, atenta ao compromisso de cuidar das pessoas, tem buscado soluções alternativas através da implementação de serviços básicos, como coleta de lixo e transporte público, na busca de preservar o mínimo existencial àquelas famílias, sem, contudo, realizar intervenções urbanas que violariam os limites de sua competência”, concluiu. (M.L)