Após utilizar o Direito ao Silêncio, norma constitucional que permite ao réu não participar na acusação estatal contra si mesmo, o ex-policial militar Felipe Quadros, que não foi ao seu julgamento, afirmou em depoimento feito em vídeo de dentro da cela, que se arrependeu dos crimes que cometeu.
Ele falou que só não se matou por conta da intervenção divina e relatou sua versão dos acontecimentos de 9 de novembro de 2015, dia em que assassinou três pessoas a queima roupa nos bairros Pricumã e Caimbé. “Tive vontade de morrer. Eu deixaria que me matassem, mas Deus falou pra mim que era para me entregar”, relatou em depoimento.
Segundo ele, a motivação do crime está relacionada ao fato da família de Jannyele, que era amiga de sua ex-mulher, se envolver em seu relacionamento, e disse ainda que não planejou nada, mas confessou que comprou com seu próprio dinheiro 50 munições utilizadas nos homicídios.
“Estava bebendo por quatro dias seguidos. Começou porque eles ligaram para minha mulher e teve confusão na minha casa. O seu Eliézio morreu no segundo tiro e a Jannyele no primeiro. Fui conversar com o filho dele, mas o seu Ernane me ameaçou e dei outros tiros nele. Estou arrependido do que fiz”, disse.
Felipe explicou que tinha total consciência no momento dos homicídios e que foi para a casa de um amigo para pensar no ocorrido. Ele confessou ainda, que colocou o que restou da munição em uma sacola e jogou no rio junto com a arma utilizada nos homicídios. “Não queria me livrar de nada. Ter jogado a arma fora foi um impulso. Eu não planejei esses crimes. Não tinha vontade de matar a Ana Carolina (ex-mulher). Já vinha aguentando as coisas dela na minha cabeça. Tentei conversar, mas não adiantou”, lembrou.
Em outro momento, o autor dos homicídios afirmou que a sua então namorada, Suriname Bastos, não foi forçada a acompanhar ele na empreitada. “Em nenhum momento eu a ameacei. [Depois dos homicídios], eu pedi pra ela descer, mas ela não quis, mesmo sabendo que eu tinha matado três pessoas”, complementou.
Felipe também ressaltou que nunca fez nenhum exame psicólogo ou psiquiátrico durante o processo de ingresso na Polícia Militar. “Só fiquei quatro meses fazendo trabalho de rua e depois fui pra penitenciária. Tive elogios na minha ficha, nunca tinha sofrido penalidades”, concluiu. (L.G.C)
Ex-namorada relatou frieza de Quadros após os assassinatos
A ex-namorada de Felipe Quadros, S. B., que estava com o ex-policial militar no momento em que ele cometeu o triplo homicídio e a tentativa de homicídio, que também não compareceu ao julgamento no Fórum Criminal, mas gravou um depoimento em juízo em que relatou tudo o que ocorreu no dia dos crimes.
Ela contou que, dias antes dos assassinatos, ela e Quadros tinham viajado para o Município de Amajari, onde a ex-mulher dele trabalhava e a fez procurar por ela. “Ele me fez descer em um posto de saúde e perguntar por uma menina. Mas informaram que ela estava viajando e voltamos para Boa Vista”, disse.
Segundo ela, o ex-policial estava ingerindo bebidas alcoólicas há vários dias e que, na noite anterior aos assassinatos, tinham ido a bares e um posto de gasolina, onde foi agredida por Quadros. “Ele fez confusão e puxou meu cabelo porque conversei com uma pessoa no local. Comprou um champagne estourou na frente de todo mundo”, relatou.
Depois, segundo a testemunha, o ex-policial colocou um colete à prova de balas e, sorrindo, foi para o bairro Pricumã, onde matou a amiga da ex-mulher, Janniely Filgueira, e pai Eliézio Oliveira. “Ele estava tranquilo, disse que eles ferraram com a vida dele”, lembrou.
Após matar pai e filha, o ex-policial ainda assassinou o empresário Ernane Rodrigues, no bairro Caimbé. “De lá fomos para a minha casa, onde ele tomou um banho e se trocou. Depois foi cortar o cabelo e tentou alugar um carro. Ele disse que se a polícia fosse atrás dele me faria refém”, afirmou. (L.G.C)
“Ele disse que eu não valia uma bala”, lembra sobrevivente
O aposentado L. A. F., sobrevivente do dia de terror provocado pelo ex-policial militar Felipe Quadros, também prestou depoimento ontem, 19, durante o Júri Popular. Ele morava ao lado de Ernane Rodrigues, um empresário dono de uma locadora de carros que foi assassinado a queima roupa pelo policial, quando saía de casa no bairro Caimbé, e tentou ajudar a vítima.
L. A. F contou que levou um tiro apenas por estar no local errado na hora errada e ter presenciado o ocorrido. O policial usava pistola e colete à prova de balas pertencentes à Polícia Militar. “Eu não conhecia esse PM. Minha intenção era salvar o Ernane, por isso tentei ajudar. Na hora em que atirou, ele disse que nem era pra ter atirado em mim porque a bala era cara pra caramba e disse isso em tom de deboche. Levei dois meses para me recuperar dos disparos e ainda sinto dor”, contou a testemunha.
MOTIVO – Segundo o Ministério Público, o réu teria cometido o crime impulsionado por vingança. “A vítima havia ameaçado processar Felipe Quadros devido a recusa do policial militar em pagar pelos danos causados por ele a um carro que pertencia a locadora de automóveis do empresário. A desavença gerou o sentimento de ódio contra a vítima”, ressaltou o MP. (L.G.C)