Polícia

Adolescentes são torturados no CSE, dizem familiares

Governo negou agressão, mas informou que vai investigar a conduta dos policiais e agentes socioeducativos

Na manhã de ontem, dia 1º, o tio de um adolescente internado no Centro Socioeducativo (CSE), localizado na região do Bom Intento, zona rural de Boa Vista, procurou a Folha para denunciar que o sobrinho havia sido torturado por policiais militares que entraram na unidade de detenção no último dia 25 de outubro sob a autorização do diretor do Centro. O governo negou que o fato tenha ocorrido, mas informou que vai apurar se houve irregularidades na conduta de algum agente de segurança ou da direção do CSE.

“Meu sobrinho está apreendido no CSE há uns quatro meses e, semana passada, ele foi brutalmente espancado. Outros adolescentes foram colocados na mesma cela que ele e parece que começaram a cavar um buraco e ele foi acusado junto, só que não bateram só nele, bateram nos seis. Foi espancamento mesmo. Eu caracterizo como tortura, inclusive eu já tinha ouvido que havia tortura lá no CSE”, destacou o tio.

O denunciante disse que o rosto do menor ficou desfigurado. “Até hoje ele está com um hematoma no olho esquerdo e eles apanharam muito e eu quero denunciar. A denúncia já foi feita no Ministério Público pela minha irmã [mãe do adolescente]. Quero que tomem providências, que seja apurado o que aconteceu porque ele já está cumprindo a pena do erro que cometeu, mas é errado disciplinar dessa maneira. Ele apanhou muito, quase teve o rosto esmagado. Os demais apanharam, mas não cheguei a ver o rosto, mas acredito que tenha sido na mesma proporção”, reforçou o tio.

De acordo com a denúncia, o adolescente contou à família que ele e os companheiros de cela foram algemados, levados para o ginásio da Unidade e apanharam com toalhas, foram molhados, e as lesões marcaram quase todo o corpo e o rosto.

Quando questionado se o sobrinho contou quem foram os autores do espancamento, o tio declarou que os agressores entraram na Unidade a mando do diretor. “Eu acho que foi o Bope. O diretor deve ter chamado. Acredito que não é a maneira adequada de conter. Foi um verdadeiro espancamento”, acrescentou Márcio.

O horário em que o fato ocorreu não foi esclarecido pela família. A reportagem perguntou se o menor passou por exame de corpo de delito e a família disse que ele não foi submetido ao procedimento no dia seguinte aos maus-tratos, mas que ainda conversariam com um advogado para ver a possibilidade.

O adolescente foi apreendido pelo ato infracional de furto de aparelho celular. “Se for necessário, queremos que o Governo tome providências e afaste ele. Se fosse só uma correção eu não diria nada, mas não admito de maneira alguma que bata no rosto. Pedimos rigor na apuração. Eu vou procurar a OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] para relatar os fatos”, concluiu o denunciante.

GOVERNO – Em nota, a Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes) informou que, no período noturno do último dia 25, seis adolescentes do bloco 1 do Centro Socioeducativo Homero de Souza Cruz Filho (CSE) tentaram arrombar a janela do alojamento, que a Polícia Militar foi acionada e a situação foi contida de imediato. Os adolescentes foram levados para a quadra da unidade para que fossem retirados do quarto os entulhos e ferros da janela, utilizados pelos adolescentes na ação. Informou ainda que foi adotado procedimento padrão para conter a situação. (J.B)

Agentes do CSE planejam paralisar atividades por falta de segurança

Agentes socioeducativos denunciaram na manhã de ontem, dia 1º, as condições de segurança do Centro Socioeducativo Homero de Souza Cruz Filho (CSE) e que o ambiente não propicia que as funções sejam executadas de acordo com as necessidades que o cargo exige. Eles pedem que a intervenção da Polícia Militar não seja interrompida pelo Poder Judiciário, caso contrário, a unidade entrará em colapso diante do caos que se instauraria, tendo em vista, que sem segurança adequada uma chacina está anunciada.

Conforme os agentes, grupos de facções criminosas rivais dividem o prédio e, somente esta semana, os infratores promoveram duas rebeliões, a última ocorreu na madrugada de ontem. “Os internos que estão cumprindo medida socioeducativa promoveram pela segunda vez só esta semana rebelião no CSE e tudo isso vem ocorrendo por rivalidade entre grupos de facções que atuam dentro e fora dos presídios”, relatou.

Segundo a denúncia, alguns internos tentaram invadir as celas onde ficam os rivais no intuito de matá-los, sendo um dos agravantes o fato de todos os adolescentes estarem misturados no mesmo bloco, quando deveriam estar separados para evitar transtornos à segurança e o risco de um confronto.

Os agentes contaram ainda que as rebeliões foram controladas por eles mesmos, com o apoio dos policiais militares. “A PM faz um brilhante trabalho junto com os agentes socioeducativos, sempre cumprindo as normas do regulamento interno e o plano de segurança, que foram aprovados pelo Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente de Roraima [Cedcar]”, reforçou.

“Diante de todos os fatos, os agentes estão executando as atividades, mas planejam fazer uma paralisação. Os órgãos de justiça fecharam os olhos para o que está acontecendo e passaram apenas a solicitar apuração de fatos infundados, por isso todos os chefes de plantão pretendem abandonar os cargos, pois nessas circunstâncias o CSE se tornaria um ambiente impossível de se exercer as funções”, ressaltou.

Por fim, os agentes destacaram que se porventura a PM deixar de entrar na unidade de detenção para menores, uma chacina aconteceria na primeira semana. “Os adolescentes vão fazer uma chacina. A PM informou que não adentra mais no CSE quando tiver rebelião, pois o juizado estaria penalizando os militares e inclusive o Judiciário está solicitando a saída do diretor. Não podemos aceitar o afastamento do diretor que está fazendo o melhor trabalho socioeducativo dentre todos os diretores que tivemos. Em breve acontecerá uma chacina dentro do CSE. As celas estão lotadas, chegando a ter nove internos onde poderiam estar apenas dois. Na última semana tivemos quatro tentativas de fuga quando os internos quebraram os cadeados. Sem apoio da PM, a situação vai piorar”, concluíram os agentes.

SINDICATO – A Folha entrou em contato com o Sindicato dos Agentes Socioeducativos para que se manifestasse em relação às denúncias, mas até o começo da tarde de ontem, a reportagem não obteve qualquer resposta.

GOVERNO – Até o fim da tarde de ontem a Administração Estadual não deu respostas sobre os fatos narrados pelos agentes e nem mesmo que medidas seriam adotadas em relação à segurança do CSE. (J.B)