JESSÉ SOUZA

Um corpo retalhado e o flagrante despreparo para enfrentar a criminalidade

Falta estatística com transparência sobre a criminalidade no Estado de Roraima (Foto: Divulgação)

Os últimos acontecimentos que mostram a face da criminalidade avançando em todo o Estado, com seguidos assassinatos, acabam por comprovar que é necessário muito mais do que reunir cerca de 150 profissionais, entre policiais e agentes de trânsito, para sair em uma carreata fiscalizadora e repressiva nas noites de fim de semana na Capital.

Não que os botecos da periferia e os veículos transitando na madrugada nos bairros mais afastados do Centro não devam ser fiscalizados. Absolutamente não. Mas, se esta for a única estratégia das autoridades para conter a criminalidade, então estamos diante de um grande problema sem solução e sem perspectiva a curto prazo.

Não precisa ser um especialista para saber da necessidade de uma estratégia para a Segurança Pública que vá além de colocar mais viaturas e mais policiais nas ruas. É necessária uma política que quebre a mesmice das decisões midiáticas e do grupismo partidário, que inclua a sociedade organizada e construa a participação dos moradores, os quais estão completamente desorganizados.

O problema da insegurança já começa na hora de registrar Boletim de Ocorrência, onde se vê o desleixo e a desorganização para lidar com o mapeamento do crime e a construção de estatísticas que permitam a sociedade acompanhar os dados para que possa participar das soluções e para fazer cobranças. Mas os dados inexistem ou não têm a devida transparência.

A solução imediata do caso do venezuelano esquartejado, cujas partes do corpo foram desovadas em locais diferentes, mostra que, quando querem, as autoridades sabem agir com agilidade e competência. A polícia e o governo sabiam que um caso dessa dimensão exigia uma solução rápida, o que não ocorre com os demais crimes.

Significa que não há vontade política para adotar uma estratégia efetiva, com foco nas investigações e no suporte para um trabalho de inteligência. Porque isso requer um duro trabalho. Também parece muito cômodo para os gestores públicos deixarem o crime organizado agir com suas próprias leis, já que até então não havia uma cobrança da opinião pública. Até que o corpo retalhado causou comoção social.

Como o governo não apresentou um plano, a não ser uma operação que serve mais para aparecer aos olhos da população do que para enfrentar as raízes dos problemas, a criminalidade só aumenta. Mas bastou fazer o básico para mostrar que não há vontade política para enfrentar o crime organizado e a escalada da violência na Capital e no interior.

As polícias precisam mostrar respostas imediatas, não com essas ações midiáticas que mais parecem um desfile nos bairros periféricos. Mas respostas estratégicas da Segurança Pública como um todo, para investigar, prender e deixar nas mãos da Justiça para uma condenação rápida e exemplar, a fim de mostrar que em Roraima o crime não compensa e que os poderes constituídos estão agindo.

Em outros estados que já enfrentaram ondas crescentes de criminalidade, especialistas mostraram que a base de tudo começa na hora de registrar as ocorrências, bem elaboradas, construindo estatísticas com mapeamento da ação dos criminosos, para que a partir daí as polícias possam agir com metas de prevenção e repressão bem planejadas e constantemente avaliadas.

E isso só funciona quando todas as polícias estiveram atuando em conjunto, inclusive com a colaboração da Guarda Municipal, com um trabalho integrado até no patrulhamento diária nas ruas. Mas isso é impensável em um Estado onde parlamentares estão mais preocupados com seus grupos e seus benefícios do que com a segurança da população.

Nesse exato momento, a preocupação é com as escolas militarizadas, que funcionam mais para dar emprego a policiais em fim de carreira com salário maior do que o dos gestores e professores. Outros estão atarefados em administrar seus conflitos partidários. Ou correndo atrás de benefícios para suas categorias. Ou administrando conflitos entre cadeiradas, memes e ataques em redes sociais.  

O povo que espere, enquanto mais um corpo é desovado nas barbas das autoridades…

*Colunista

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