O arroubo do presidente venezuelano Nicolás Maduro ao divulgar que tem intenção de anexar dois terços do território da Guiana é, literalmente, uma ação apenas para inglês ver, conforme diz um ditado popular muito conhecido no Brasil. O fato, por sua vez, tem provocado muita fake news obviamente tentando inflamar a política brasileira ainda dividida entre bolsonarismo e lula/petismo.
Em Roraima, que faz fronteira com Venezuela e Guiana, as teorias conspiratórias e mentiras deslavadas surgem aos montes, especialmente porque o Estado sofre uma migração em massa de venezuelanos a partir da fronteira Norte, no Município de Pacaraima. Do outro lado, a Nordeste, há uma forte movimentação de brasileiros indo ao comércio guianense, na cidade de Lethen, na fronteira com Bonfim.
Mas o desenrolar dentro da geopolítica historicamente tem mostrado que, toda vez que um governo ditatorial está sob risco real de ser implodido, o governante de plantão sempre fabrica uma crise para desviar não apenas a atenção de sua população, criando uma atmosfera a fim de evitar uma forte adesão a uma revolta popular, como também para despistar a opinião pública dos países vizinhos.
Foi assim inclusive na Venezuela em 2019, quando eclodiu um movimento com manifestações convocadas pelo líder da oposição. Naquele momento, o então presidente da Assembleia Legislativa, Juan Guaidó, tentava derrubar Nicolás Maduro do poder. Então Maduro fechou a fronteira com o Brasil, colocando os militares em exercício na fronteira, criando rumores de que poderia haver uma guerra entre Brasil e Venezuela. Só mentira.
Neste exato momento, quando Nicolás Maduro anunciou que realizará um referendo consultivo em 3 de dezembro para decidir sobre a anexação de 2/3 do território da Guiana, a Venezuela está com a sua política em forte ebulição novamente. Uma parentese: vale destacar que essa questão territorial com a Guiana vem de uma longa disputa territorial entre os dois países, que remonta ao século XIX.
Enquanto Maduro fala grosso insinuando uma improvável guerra que ele jamais conseguiria bancar, a ex-deputada María Corina Machado, candidata da oposição da Venezuela nas eleições presidenciais de 2024, vem aumentando o coro contra as ações de Nicolás Maduro para sabotar o pleito do ano que vem, mesmo ele tendo assinado um acordo em Barbados se comprometendo a realização de um processo eleitoral livre, inclusive com observação internacional.
Apesar dos rompantes de um ditador em crise, que tenta se manter no poder a qualquer custo, é importante lembrar que a Venezuela declarar guerra neste momento não reúne o interesse necessário dos senhores da guerra. Afinal, qualquer conflito nesta região mexe com as grandes potências, como Estados Unidos, Rússia e China, as quais obviamente têm interesses conflitantes por aqui, mas estão preocupadas com outras grandes guerras em curso.
*Colunista