O auxiliar de serviços gerais Renan Lima de Souza, 25 anos, pediu que a Justiça de Roraima reconsidere decisão que o colocou de volta à Penitenciária Agrícola de Monte Cristo (Pamc) devido a uma ocorrência supostamente manipulada por guardas civis municipais de Boa Vista (entenda mais abaixo).
Representante do suspeito, o advogado criminalista Adriel Galvão, solicitou que o cliente retorne ao regime aberto, pelo qual cumpria mais de seis anos de detenção por assalto. O profissional enviou à Justiça provas como o vídeo que registra quase toda a abordagem na Praça Germano Augusto Sampaio, no bairro Pintolândia, e as denúncias de abuso de autoridade feitas pela mãe do jovem, Raquel Amorim de Lima, 45, à corregedoria da Guarda Civil Municipal (GCM), à Polícia Civil de Roraima (PCRR) e ao Ministério Público do Estado (MPRR).
O pedido de reconsideração aguarda parecer do MPRR. Depois, a Justiça decidirá se acata ou não o parecer ministerial. Para o advogado, as provas “são suficientes para que a Justiça dê uma decisão favorável”. Galvão ressalta que a possível manipulação da ocorrência se trata de uma atitude isolada dos agentes e ponderou que, caso o crime abuso de autoridade seja finalmente comprovado, eles poderiam ser condenados de um a quatro anos de prisão e ainda cumprirem sanções administrativas e reparação do dano. Ademais, Renan Lima poderia pedir indenização do Município de Boa Vista.
“Vejo como um atentado não só ao Renan em específico, mas à sociedade em si”, avaliou. “Acredito que isso sirva de exemplo pra esses guardas municipais em si, que eles não sejam penalizados de uma forma que possa prejudicá-los – porque atrás de um guarda municipal, existe um cidadão que, de fato, paga conta e tem família pra criar e tudo. Então, que isso sirva de exemplo pra que não se faça mais. Mas também tem a família do Renan. E se acontecer o pior nesse período em que ele ficou trancado injustamente, sofrer alguma coisa, morrer? Já vi casos assim”, completou o advogado.
Relembre
Em novembro de 2023, três agentes da Romu (Ronda Ostensiva Municipal) teriam iniciado, por volta das 19h, uma abordagem a dezenas de jovens. Renan ficou entre os últimos a serem revistados e só foi inspecionado depois das 20h, horário limite em que ele poderia ficar fora de casa em meio ao cumprimento do regime aberto após ser condenado por assalto ocorrido em 2018.
Os guardas não acharam nada ilícito com o grupo, mas prenderam Renan e um outro albergado, de 29 anos, por descumprimento de horário. No relatório policial, os agentes registraram que a ocorrência iniciou às 20h30 e terminou às 21h22. “O que a ocorrência em si, do relatório, é diferente do vídeo, é. Isso é discrepante. Você vê o horário que é feito o vídeo e é dentro do horário permitido [para o Renan ficar fora de casa]”, diz o advogado Adriel Galvão.
O vídeo usado como prova a favor de Renan mostra a preocupação do jovem em ser enquadrado como descumpridor das regras do regime aberto e mostra um dos guardas mencionando horário anterior ao registrado na ocorrência.
O auxiliar de serviços gerais foi encaminhado à Pamc após a Justiça estadual reconhecer que ele teria praticado “falta grave” e determinar sua regressão ao regime semiaberto, a apenas oito meses de concluir o cumprimento da pena por assalto. “Ele poderia, nesses meses de cumprimento de pena, estar trabalhando, sustentando seus familiares. Mas não, está na Pamc em regime mais rigoroso que ele está”, pontuou o advogado do jovem.
Na audiência de justificação, a Defensoria Pública alegou, em favor de Renan Lima, que a abordagem foi excessiva e pediu que testemunhas do caso, como a mãe do auxiliar de serviços gerais e o amigo Márcio Pereira Lopes, 28, fossem ouvidos. A Justiça, no entanto, não conseguiu contatar Márcio e proferiu a decisão desfavorável ao suspeito.
O possível abuso de autoridade é investigado na corregedoria da GCM, no MPRR e na PCRR. Na época em que o caso veio à tona, a Secretaria Municipal de Segurança Urbana e Trânsito (SMST) concluiu que o vídeo mostrava que a abordagem ocorreu conforme protocolo de conduta operacional de revista pessoal. Mas a SMST não comentou a suposta manipulação do relatório policial.