JESSÉ SOUZA

Museu é resistência em Bacural, enquanto em Roraima nem História vale nada

Erguido na década de 1980, prédio que abrigava Museu de Roraima foi abandonado ao descaso até ser demolido em 2023 (Foto: Divulgação)
Erguido na década de 1980, prédio que abrigava Museu de Roraima foi abandonado ao descaso até ser demolido em 2023 (Foto: Divulgação)
Erguido na década de 1980, prédio que abrigava Museu de Roraima foi abandonado ao descaso até ser demolido em 2023 (Foto: Divulgação)

Quem assistiu ao filme Bacural, um clássico do cinema brasileiro, pôde perceber no enredo a importância de preservar as memórias para sobreviver ao presente e ter uma segurança no futuro. O museu da cidade, apesar de vazio por não receber visitantes, se mantém muito bem preservado. O local é apresentado aos visitantes e forasteiros como forma de dizer que ali tem uma história e uma resistência. Por fim, saiu das paredes do museu a defesa e proteção dos moradores.

Se Bacural parece ser a utopia do povo de uma pequena cidade isolada nos confins do país, que percebe que apenas unido e respeitando as diferenças é que poderá vencer os inimigos, os quais se consideram superiores por questões raciais e culturais, Roraima seria a distopia desta realidade, pois deve ser o único Estado brasileiro a não ter um museu, que é o espaço imprescindível para preservar a memória coletiva de um povo.

O Museu Integrado de Roraima (MIRR) foi fechado em 2011, após passar por outros períodos de desativação, quando todo o acervo foi guardado em depósito de outros órgãos públicos. Desde lá, várias peças do acervo e vários equipamentos foram furtados, sob seguidas promessas de que tudo seria catalogado para que o museu fosse reaberto. Era tudo mentira. Além de nunca ter sido reaberto, o prédio histórico foi demolido em um dia de feriado, 1º de maio do ano passado, talvez para que não houvesse tempo de qualquer reação por parte da sociedade. Foram 12 anos de abandono e descaso!

Não só o único museu ficou fechado até sua demolição total, após 38 anos de instalação. Até hoje, o histórico Teatro Carlos Gomes, localizado em um local nobre no Centro de Boa Vista, segue abandonado há mais de 15 anos. Da mesma forma que por décadas ficou abandonada a Casa da Cultura Madre Leotávia Zoller, prédio que já foi residência oficial dos governadores do Território Federal do Rio Branco, tombado como patrimônio histórico de Roraima, localizado também no Centro. O prédio da Escola de Música de Roraima (Emur) também foi demolido no ano passado.

Enquanto na utopia de Bacural o museu é peça-chave para a resistência do povo,  no distópico Estado de Roraima a Assembleia Legislativa de Roraima alocou R$ 855.963,00 para reformar o prédio do Centro de Tradições Gaúchas (CTG) Nova Querência, que promove eventos pagos e cujos frequentadores fazem parte de uma elite política e econômica da sociedade local. E tudo em detrimento da história e cultura roraimense, cujos prédios históricos viraram escombros, sob a omissão dos deputados desde longas datas.

O caso do MIRR tem um enredo que ultrapassa essa distopia, pois o prédio histórico que foi demolido estava localizado no Parque Anauá, que nestes últimos anos vem recebendo recursos milionários para obras de manutenção, reforma e ampliação que nunca são concluídas. Um escândalo sem precedentes que passa ao largo dos órgãos fiscalizadores e dos próprios deputados, que têm como obrigação constitucional fiscalizar.

Tudo sob a omissão de quem deveria agir para impedir que a cultura, a arte, a história e as memórias do povo roraimense não fossem destruídas. Mas tudo indica que isso não é por acaso. Deve haver um grande plano arquitetado para apagar tudo, para que Roraima se torne uma terra sem memória e sem resistência ao principal plano dos políticos, que é se apossar de tudo. Quem quiser ter uma ideia do que isso representa é só assistir Bacural. No filme, o povo resistiu. Aqui…

*Colunista

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